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Lição 1 - O Livro de Êxodo e o Cativeiro de Israel no Egito
LIÇÕES BÍBLICAS - 1º Trimestre de 2014 - CPAD - Para jovens e adultos
Tema: Uma Jornada de Fé - A Formação do povo de Israel e sua herança espiritual
Comentário: Pr. Antônio Gilberto
Complementos, ilustrações, questionários e vídeos: Ev. Luiz Henrique de Almeida Silva
Questionário
http://www.apazdosenhor.org.br/profhenrique/videosebdnatv.htm
 
 
Texto Áureo
"E José fez jurar os filhos de Israel, dizendo: Certamente, vos visitará DEUS, e fareis transportar os meus ossos daqui” (Gn 50.25).
 
 
Verdade Prática
Os propósitos de DEUS são imutáveis e se cumprirão no tempo determinado por Ele.
 
 
LEITURA DIÁRIA
Segunda - Gn 50.25 José não se esqueceu da promessa
Terça - Êx 1.7  O crescimento dos hebreus no Egito
Quarta - Êx 1.11 A aflição dos hebreus
Quinta - Êx 1.13,14 A opressão do Povo Escolhido
Sexta - Jr 33.3 DEUS atende ao clamor do seu povo
Sábado - Jó 42.2 Os propósitos do Senhor jamais serão
 
LEITURA BÍBLICA EM CLASSE - Êxodo 1.1-14
1 - Estes, pois, são os nomes dos filhos de Israel, que entraram no Egito com Jacó; cada um entrou com sua casa: 2 - Rúben, Simeão, Levi e Judá; 3 - Issacar, Zebulom e Benjamim; 4 - Dã, Naftali, Gade e Aser. 5 - Todas as almas, pois, que descenderam de Jacó foram setenta almas; José, porém, estava no Egito. 6 - Sendo, pois, José falecido, e todos os seus irmãos, e toda aquela geração, 7 - os filhos de Israel frutificaram, e aumentaram muito, e multiplicaram-se, e foram fortalecidos grandemente; de maneira que a terra se encheu deles. 8 - Depois, levantou-se um novo rei sobre o Egito, que não conhecera a José, 9-o qual disse ao seu povo: Eis que o povo dos filhos de Israel é muito e mais poderoso do que nós. 10 - Eia, usemos sabiamente para com ele, para que não se multiplique, e aconteça que, vindo guerra, ele também se ajunte com os nossos inimigos, e peleje contra nós, e suba da terra. 11 - E os egípcios puseram sobre eles maiorais de tributos, para os afligirem com suas cargas. E edificaram a Faraó cidades de tesouros, Pitom e Ramessés. 12 - Mas, quanto mais os afligiam, tanto mais se multiplicavam e tanto mais cresciam; de maneira que se enfadavam por causa dos filhos de Israel. 13 - E os egípcios faziam servir os filhos de Israel com dureza; 14 - assim, lhes fizeram amargar a vida com dura servidão, em barro e em tijolos, e com todo o trabalho no campo, com todo o seu serviço, em que os serviam com dureza.
 
A TEOLOGIA DE ÊXODO -
ÊXODO Introdução e Comentário - Por R. Alan Cole, Ph. D. Menzies College, da Universidade Macquarie - Sociedade Religiosa Vida Nova - Associação Religiosa Editora Mundo Cristão
 
Seria difícil encontrar um único tópico de importância do Velho Testamento, ou mesmo do Novo, que não esteja exemplificado no livro de Êxodo. Muitos dos temas, usados posteriormente na Bíblia, surgem realmente neste livro, na interpretação da experiência de Israel, através dos grandes acontecimentos que levaram à sua organização como povo e nação. Nesta Introdução Teológica consideraremos alguns pontos importantes relacionados com a natureza de DEUS. Nosso tratamento não visa esgotar o assunto; procura apenas ser uma parca introdução às riquezas teológicas do livro.
I. O DEUS que controla a história
DEUS é o controlador invisível de toda a história e de todas as circunstâncias.
Isto se vê em Êxodo 1, embora o nome de DEUS não seja sequer mencionado até o versículo 20. Esta omissão não significa que o hebreu fosse irreligioso mas que, em contraste conosco, ele percebia a mão de DEUS em cada circunstância da vida, não simplesmente nos momentos mais cruciais em que DEUS agia através do que chamamos "milagres” . Nada estâ além de Seu poder e controle — nem mesmo a obstinação de um Faraó (4:21). Foi esta mesma convicção que levou os iraelitas a considerarem o êxodo como o maior acontecimento da História e como o ato redentor de DEUS em relação a Israel. Que o êxodo acontecera, israelita algum podia duvidar, pois haviam sido realmente salvos do poder do Egito. A única explicação provável para tal impossibilidade era a de que se tratava de uma obra de DEUS, pois todas as coisas estavam sob o Seu controle. Esse invencível poder de DEUS sobre a História, todavia, não é exercido arbitraria ou despropositadamente. Ele controla e regula todos os acontecimentos para o bem final de Seus filhos, quaisquer que sejam os efeitos imediatos. Isso é demonstrado no capítulo inicial de Êxodo; as próprias medidas repressivas adotadas contra Israel só fizeram com que os israelitas se multiplicassem mais (1:12). A providência amorosa de DEUS é vista mais uma vez na preservação da vida de Moisés e em sua adoção pela filha de Faraó (2:10), bem como na sorte das parteiras israelitas (1:21). Pode-se alegar que as parteiras haviam merecido a graça divina por sua fidelidade a DEUS (1:17) e que o menino Moisés nada havia feito para desmerecer o cuidado divino. DEUS, no entanto, mostra o mesmo amor a Moisés quando, por causa de seu ato intempestivo, ele acaba como um fugitivo sem vintém na terra de Midiã (2:15-22). Ninguém poderia afirmar que o ingrato Israel mereceu o amoroso cuidado divino, ao estudar sua história subseqüente (16:3, por exemplo), e sem sombra de dúvida, Israel fora tão indigno no Egito quanto o foi mais tarde no deserto. Assim, o que começou como a doutrina da providência de DEUS acaba por se tornar a doutrina da graça de DEUS, Seu favor e amor desmerecidos, derramados sobre os objetos indignos de Sua escolha.
II. Eu sou YHWH
DEUS é YHWH. Êxodo 3:13-15 deixa claro que a revelação de DEUS sob este nome é fundamental para a teologia da era mosaica. Quanto à era pré-mosaica há vários pontos de vista. Alguns acham que o nome YHWH não era conhecido nem usado antes do tempo de Moisés (6:3) e que seu presente uso nos capítulos iniciais do Velho Testamento serve apenas para mostrar a completa identidade entre o DEUS dos patriarcas e o DEUS conhecido por Moisés e revelado a ele. (Ver, contudo, quanto a este assunto, Introdução ao Velho Testamento por R.K. Harrison, pgs. 578-582.) Outros, baseados em textos como Gênesis 4:26, sustentam que o nome em si já era conhecido de alguns dos ancestrais de Israel, muito tempo antes de Moisés, e que isso explica o livre uso do nome nos relatos mais antigos de Gênesis. Dizem ainda que 6:3 se refere a uma revelação do significado do nome, que então se descobria, tinha dimensões novas e mais profundas. A questão, entretanto, não é importante em relação à teologia de Êxodo. O fato importante é que DEUS tem um nome e é, por isso, plenamente pessoal.
Para o hebreu, "nome” simboliza "caráter” . Assim, conhecer o "nome” de DEUS é conhecê-lo tal como Ele é, e "invocar o Seu nome” é apelar a Ele com base em Sua natureza revelada e conhecida (Salmos 99:6). "Proclamar” o "nome” de YHWH é descrever Seu caráter (33:19). Desde que Israel era o povo de YHWH (19:5), o nome de YHWH estava envolvido em tudo que lhes acontecia; este fato se tornaria importante mais tarde quando da intercessão de Moisés em favor de Israel (32:11-13). A reputação de DEUS está intimamente ligada aos israelitas.
DEUS não os pode abandonar; muito pelo contrário, deve obter glória para o Seu nome através deles. Se DEUS agora possui um novo "nome” (e se esta é a interpretação correta de 6:3), isto significa para o israelita que uma nova revelação aconteceu, superior àquela associada ao antigo nome "El-Shaddai” (Gn 17:1-8) ou a qualquer outro nome patriarcal dado a DEUS. A partir daqui, para o Velho Testamento, o nome YHWH significará tudo que o nome "JESUS” significa para o Novo Testamento. É o nome que resume em si toda a revelação passada (pois YHWH ainda é o "DEUS de vossos pais”, mesmo que sob um novo nome) e jaz no centro de sua nova experiência de redenção e salvação. A simples menção do nome "JESUS”, para o crente, o faz lembrar a cruz; assim, o simples dizer YHWH, para um judeu, o faz lembrar o êxodo.
Quando DEUS descreve a Si mesmo como YHWH, é perfeitamente natural acrescentar a frase "que te tirou da terra do Egito” (20:2), assim como é perfeitamente natural para o crente descrever CRISTO como aquele que "nos remiu” (G1 3:13).
Quanto ao significado exato do nome YHWH tem havido uma controvérsia de proporções consideráveis. Veja o comentário de Êxodo 3 para as várias sugestões. Dois pontos, no entanto, devem ser considerados: primeiro, que 3:14 é o único lugar do Velho Testamento em que o significado do nome é explicado. Segundo, que o nome é representado claramente como algo que somente DEUS pode explicar. A implicação teológica desses dois pontos é que ninguém, exceto DEUS, pode explicar Quem e o que é DEUS; aprenderemos o significado de Seu "nome” a partir daquilo que Ele diz e faz. Seja qual for a exata força gramatical de 3:14, esse fato fica bem claro uma vez que o verbo hebraico (hayah) "ser,” tem o significado de "estar presente (e ativo)” : é dinâmico e não estático. Israel não foi deixado, como aconteceu a outras nações, especulando sobre os problemas quanto à existência e natureza dos deuses. Seu DEUS era um "DEUS que está presente” , ativo na história, e que Se revelou em palavra e ação.
O próprio êxodo define inicialmente a natureza de YHWH, conforme revelado na salvação de Israel do poder do Egito, por Ele operada.
A história subseqüente de Israel acrescentaria frase após frase à declaração inicial do seu credo (que te tirou da terra do Egito) à medida que sua experiência de salvação se desenvolvia. YHWH não seria confessado apenas como Aquele que tirara Israel da terra do Egito (20:2), mas também como Aquele que introduzira o povo na terra de Canaã (Dt 26:9) e como Aquele que levantou juizes (Jz 2:16), e assim por diante.
A promessa inerente na explicação inicial do nome divino (3:14) foi-se cumprindo na história, quer tenha sido "Eu Sou o que Sou” ou "Eu Serei o que Serei” . Uma vez que mais e mais a natureza de DEUS estava sendo revelada aos homens através de Suas palavras e Seus atos, Seu "nome” gradualmente adquiria um significado mais rico. A coroação e consumação viria nos dias do Novo Testamento, quando a Palavra maior de DEUS ao homem foi dita e Seu maior ato de salvação foi completado (Jo 1:14 e 19:30). A partir de então, Ele seria conhecido como o "DEUS e Pai de nosso Senhor JESUS CRISTO” (Rm 15:6) e o doador do ESPÍRITO (Jo 14:26). Um novo "nome” divino começaria então a ser usado, correspondente à plenitude de Sua revelação.
Assim veremos que, apesar de toda a teologia bíblica se basear num uso correto da lingüística, precisaremos, ao fim de nossos esforços, buscar uma compreensão teológica e não lingüística do nome de DEUS. De fato, os Dez Mandamentos são este tipo de explicação teológica do significado do nome de YHWH, pois começam com a definição do ato redentor de YHWH (20:2) e prosseguem com uma expressão de Sua natureza moral. Talvez a adição mais significativa tenha sido a que define YHWH como um "DEUS zeloso” , zeloso tanto em castigar quanto em cumprir Sua aliança (20:5,6). A esta podemos comparar a auto--proclamação posterior do nome divino a Moisés (34:5-7), onde o "nome” é entendido em termos de amor e julgamento, e onde a natureza "zelosa” de DEUS é novamente enfatizada (34:14).
III. O DEUS que é santo
DEUS é santo. O próprio lugar onde Ele Se revelou a Moisés é santo (ou melhor, se torna santo) em virtude dessa revelação (3:5). Essa é a primeira vez em que o adjetivo "santo” é usado no Pentateuco, embora o conceito já se encontre em Gênesis (cf Gn 28:17). Mais tarde, "santo ” seria um dos adjetivos mais usados para descrever a natureza e o próprio ser de DEUS, especialmente em Levítico (cf Lv 11:45). Sem entrar em argumentos filológicos, a idéia básica da raiz hebraica parece ter sido "posto à parte” e, portanto, "diferente” das coisas comuns.
Para o cananeu esse conceito poderia não ter a menor conotação moral.
Um dos títulos da deusa da fertilidade chamada Astarte, adorada no Egito, era "Qudshu” (a santa) e o nome dado às prostitutas cultuais, estritamente proibidas em Israel (Lv 19:29), significa literalmente "santas” . O "separatismo” ou a "diferença” de DEUS em relação ao homem, entretanto, não reside apenas numa distinção de níveis de existência.
O DEUS de Israel é diferente em Sua natureza moral: "santidade” em Israel, portanto, tem conteúdo moral. É por isso que Ele Se revelará nas "dez palavras” que são uma revelação moral e não intelectual, embora tenham conteúdo intelectual. O conhecimento contínuo de DEUS por parte de Israel depois de sua libertação do Egito, acabaria por ser uma experiência moral que se aprofundou gradativamente; ao invés do intelecto, a consciência de Israel é que foi desafiada continuamente. Assim é que, na nova aliança, DEUS "revela” Seus caminhos aos pequeninos e os "esconde” dos sábios (Mt 11:25), pois não há dificuldade alguma em compreender um imperativo moral, por mais difícil que seja obedecer. Basicamente, nossas pedras de tropeço não são intelectuais e sim morais; a raiz de nossa oposição a DEUS está localizada em nossa vontade.
Sendo DEUS tão "santo” , tão "diferente” , qualquer coisa a Ele associada, ou devotada a Seu serviço, participa dessa característica. No caso de um objeto inanimado (tal como o óleo da unção) essa santidade pode significar que ele é vedado ao uso comum (30:32). A santidade pode até comunicar a idéia de algum perigo misterioso no caso de contato físico (19:12,13). Sendo porém a santidade de DEUS uma característica moral, ser "povo santo” (como Israel foi chamado a ser, 19:6) significava submeter-se a exigências morais muito rigorosas. Fora do livro de Êxodo essas exigências são apresentadas ostensivamente: "Santos sereis porque Eu, YHWH vosso DEUS, sou santo” (Lv 19:2). Essa afirmação pode ser feita de maneira ainda mais sucinta; a motivação para cumprir um mandamento moral pode ser simplesmente "Eu sou YHWH vosso DEUS” (Lv 19:3). O fato de YHWH ser santo dispensa explicações adicionais; o novo relacionamento, introduzido pela graça, faz exigências morais inexoráveis.
Dentro do próprio livro de Êxodo, pode-se dizer que todo o "livro da aliança” (aproximadamente 21*23) é uma tentativa de definição do que significa ser "povo de DEUS” , uma "nação santa” . Santidade, portanto, no sentido mais profundo do termo, é uma definição da natureza de DEUS tal como Ele a espera ver refletida em Seus filhos. É este conceito da santidade divina que, por sua vez, é refletido e retratado na construção do Tabernáculo, com o "SANTO dos Santos” em sua parte mais interior e os metais e outros materiais utilizados em sua construção decrescendo em preciosidade à medida que iam ficando mais distantes do centro (o SANTO dos Santos). Se a lei era a expressão verbal da santidade de DEUS, o Tabernáculo era uma parábola visível dessa santidade.
Seria talvez acertado dizer que todo o conceito de oferta pelo pecado (29:14), essencial à prática religiosa de Israel, procede deste conceito da santidade de DEUS, entendida em termos não meramente rituais, mas morais. Este aspecto, porém, é considerado mais a fundo sob outra divisão do texto.
IV. O DEUS que se lembra
YHWH é também o DEUS que se lembra (2:24). Especificamente, Ele é o DEUS que se lembrou da Sua "aliança com Abraão” e os outros patriarcas. Isso não significa, é claro, que DEUS seja capaz de esquecer (exceto no que diz respeito a esquecer como uma metáfora, para descrever o Seu perdão de pecados; cf Is 64:9). Dizer que DEUS "se lembra” é um antropomorfismo (ou mais exatamente, um antropopatismo) para expressar a imutabilidade de DEUS. Nele não há nada de arbitrário; qualquer coisa que se aprenda a Seu respeito com base em Seus relacionamentos com o homem no passado será válida para relacionamentos atuais e futuros. Este é um contraste marcante com os deuses do paganismo, que partilhavam todos os caprichos e acessos de cólera comuns aos homens que os criavam. Esta constância divina, e ela somente, torna possível o contínuo processo de revelação. De acordo com esse princípio Israel medirá toda a sua história subseqüente, entendendo todos os acontecimentos futuros em termos do êxodo. Este princípio será a medida de sua esperança nos dias negros do futuro.
DEUS, por seu turno, ordenará a Israel que se lembre do que Ele fez pela nação através da aliança. Assim, Israel receberia a certeza de que Seu gracioso propósito para com a nação iria continuar. Além disso, essa lembrança constante será como que aguilhão e espora, forçando o povo a cumprir os Seus mandamentos (20:2). Já se disse, e bem, que apenas essa "lembrança” pode unir o evangelho e a lei; Israel observa a lei porque "se lembra” do evangelho da salvação.
Na estrutura de pensamento hebraica "lembrar-se” significa "agir” ; isso se aplica também a DEUS e a Israel. E, mais uma vez, isso não é novidade. As Escrituras nos dizem que "DEUS se lembrou de
Noé” (Gn 8:1), ou seja, DEUS agiu de maneira a demonstrar a Noé a perfeita compatibilidade de Seu caráter. No caso de Noé era mais uma vez a graça de DEUS que se mostrava compatível (Gn 6:8), tal como se apresentou compatível em relação a Israel na presente situação. Assim sendo, dizer que DEUS "se lembra” é afirmar que Ele repete Seus atos de graça salvadora para com Seu povo Israel, vez após vez, cumprindo, desta maneira, Suas promessas, e mostrando Sua auto--compatibilidade.
Há aqui, todavia, um pensamento ainda mais profundo: DEUS Se lembra da Sua "aliança.” Chegamos agora ao verdadeiro coração do livro de Êxodo e sua teologia, pois a aliança feita por DEUS com Israel no Sinai (24:3-8) domina não apenas o pensamento deste livro, mas todo o pensamento israelita subseqüente. Sempre que mencionamos o "Velho Testamento” , isto é, a Velha Aliança, concordamos inconscientemente com este fato. Na verdade, mais adiante na história de Israel, a aliança feita no Sinai eclipsou a tal ponto a aliança Abraâmico que esta quase não é mencionada senão ao tempo do exílio (Ez 33:23,24). No texto de Êxodo, todavia, todo o movimento redentor que culmina com a aliança feita no Sinai é apenas o cumprimento de promessas divinas baseadas na aliança abraâmica (3:15-17). Fora de dúvida, todo o relato bíblico da história da salvação surge em termos de promessa e cumprimento: é este fato que dá profundidade e raízes históricas à aliança sináitica, uma vez que, ao outorgá-la, DEUS está "Se lembrando” de Sua aliança com Abraão e, em certo sentido, reiterando-a. No entender de Paulo, a aliança feita com Abraão era realmente mais profunda e fundamental que a aliança feita com Israel no Sinai (G1 3:17). É a primeira aliança, e não a última, que Paulo usa como ilustração da justificação pela fé. Seja qual for o caso, a "Velha Aliança” forneceu a terminologia para a "Nova Aliança” , profetizada por Jeremias (Jr 31:31), cuja introdução, quando da morte do Messias, foi simbolizada por CRISTO na Última Ceia (1 Co 11:25).
Não é preciso enfatizar quão importante é o termo "aliança” , como uma categoria teológica usada em ambos os Testamentos. Expressões como "o sangue da aliança” , "os sacrifícios da aliança” são fundamentais para a compreensão do plano de DEUS e da obra de CRISTO, uma vez que a aliança era normalmente selada com o sangue de uma vítima. Sem sombra de dúvida a "aliança” era uma forma comum de expressar obrigação mútua na época do Êxodo. O termo abrangia desde relacionamentos entre indivíduos (Gn 21:32) a relacionamentos entre comunidades (Js 9:15), podendo ser usado até mesmo metaforicamente, para elementos não-humanos (Jó 31:1). Há um certo debate quanto ao fato de "aliança” ter sido' ou não, originalmente, um termo comercial; a palavra certamente incluía o sentido de nosso termo "contrato” e abrangia assuntos que podiam ser puramente seculares (Gn 21:32) ou religiosos. Algumas alianças de natureza secular eram feitas entre iguais; outras, como a de Israel, eram entre um superior e um inferior.
O paralelo (não-religioso) mais próximo da "aliança” entre Israel e DEUS é o "tratado de suserania” (unilateral) firmado entre um monarca e uma nação subjugada; que ele, graciosamente, coloca sob sua proteção soberana. Exemplos particularmente esclarecedores se encontram entre os tratados firmados pelos reis da Assíria e dos Hititas. O rei descreveria, em primeiro lugar, o que havia feito em favor do povo; em seguida, depois dessa demonstração de graça, apresentaria, por direito, as exigências e obrigações daí decorrentes. Podemos ver aqui o começo de uma compreensão do relacionamento entre graça (a origem) e lei (o resultado). Esses antigos "tratados de suserania” normalmente continham, ao seu final, uma lista de bênçãos e maldições sobre aqueles que seguiam ou quebravam a aliança, respectivamente. As semelhanças entre esta estrutura e o formato da aliança feita com Israel no Sinai ou mesmo da aliança abraâmica (Gn 15:7-21) são óbvias, mas não devem receber uma ênfase exagerada. Por exemplo, YHWH não é apresentado na lei de Moisés como "rei” de Israel, embora este conceito esteja provavelmente envolvido em 20:5,6, e tenha sido definitivamente expresso
mais tarde (Jz 8:23). Assim, não é provável que tenhamos aqui uma aliança "emprestada” , e sim um novo relacionamento com DEUS, expresso numa terminologia já conhecida dos israelitas, como parte de sua herança cultural.
Há ainda um outro assunto a considerar sob este título. DEUS é "o DEUS de vossos pais” , declarando-se "o DEUS de Abraão, de Isaque e de Jacó” (3:6). Temos aqui, por um lado, uma afirmação da compatibilidade e da continuidade da revelação divina: por outro lado, é a afirmação da eterna duração do relacionamento que DEUS estabelece com o homem. A primeira verdade é bem evidente em Gênesis, quando o servo de Abraão ora ao DEUS de Abraão, não apenas como um nome para DEUS, mas descrevendo o caráter divino de fidelidade e misericórdia demonstradas a Abraão e reivindicando sobre si mesmo o exercício desses atributos (Gn 24:12). O segundo aspecto é ainda mais significativo para a teologia bíblica mais recente. No Novo Testamento, nos lábios de CRISTO, esta verdade se torna um argumento em favor do que poderíamos chamar "imortalidade pessoal” dos patriarcas (Mt 22:31,32).
Ao estabelecer com eles um relacionamento, DEUS garantiu a esse relacionamento um caráter permanente que por si mesmo garante a existência contínua dos participantes humanos. Em termos neotestamentários, vida eterna é conhecer a DEUS (Jo 17:3), não simplesmente porque a natureza de nossa vida presente é completamente alterada ao entrarmos num novo relacionamento com DEUS, mas porque esse relacionamento, devido à natureza daquele com quem nos relacionamos, jamais acabará.
Para simplificar ao máximo, se DEUS ainda "se lembra” dos patriarcas, eles devem ainda existir. Aqui, pois, embora primitiva e auto-despercebida, está o começo da revelação da vida após a morte. Em última análise, é este relacionamento que o salmista buscava com esperança (SI 17:15) e Jó em desespero (Jó 19:25-27).
Em nível mais amplo, a ênfase no relacionamento divino com os patriarcas é ênfase na natureza essencialmente histórica da fé israelita.
Abraão, Isaque e Jacó eram vistos como homens reais que haviam tido uma experiência real com DEUS. Foi esta mesma insistência obstinada na historicidade que fez Israel olhar para trás, para os acontecimentos do Êxodo, vez após vez, mais tarde em sua história. Israel sabia que a graça e o poder de DEUS, demonstrados no Êxodo, eram fatos reais; sua própria existência como nação o demonstrava. Assim também, na Nova Aliança, Lucas insiste obstinadamente na historicidade dos fatos da fé cristã (Lc 1:1-4). Nisso jazia a grande força do credo israelita; ele não era uma filosofia, tampouco uma forma de misticismo, ou iniciação, nem mesmo uma religião baseada em sensações. Era uma religião baseada em fatos. Era, essencialmente, uma interpretação coesa de experiências
históricas e, embora o homem pudesse negar a interpretação, não poderia negar a história. Por isso Israel podia ver DEUS como um "deus que age” e esperar, com fé confiante, que Ele agisse novamente, conforme a palavra da Sua promessa.
V. O DEUS que age para salvação
Ao contrário dos deuses de Canaã (1 Rs 18:27), DEUS é um DEUS vivo (Dt 5:26), um DEUS que age. Acima de tudo, Ele é um DEUS que age para salvação: "desci a fim de livrá-lo da mão dos egípcios” foi a mensagem de DEUS aos israelitas através de Moisés (3:8). Esta passagem introduz o conceito bíblico de salvação, uma área em que passagens bíblicas posteriores devem muito ao livro de Êxodo em termos de linguagem e ilustrações. É claro que a idéia de salvação já está presente muito antes do Êxodo, nas histórias de Noé (Gn 8) e Ló (Gn 19), por exemplo. Em ambos os casos, a palavra usada em relação a DEUS não é "salvar” mas "lembrar” , embora, como já foi mencionado, "lembrar” tenha um significado essencialmente ativo. "Fazer subir” (3:8) e "tirar” (3:10) são também virtualmente sinônimos de "salvar” , dadas as circunstâncias históricas em que Israel se encontrava, escravos em terra estranha. "Redimir” é outro sinônimo que tem uma rica história em ambos os Testamentos, mas o verbo principal (gã’al), em comparação, é usado bem raramente em Êxodo. (Para um exame mais completo, ver o Comentário Tyndale do livro de Rute, de autoria de Leon Morris.) O verbo é usado, freqüentemente, em transações de propriedades e adquiriu assim o sentido de "pagar o resgate” (embora este sentido pertença mais propriamente a um verbo mais raro, pãdâh). Êxodo 6:6 e 15:13, todavia, usam este verbo (gã’al) para descrever a atividade redentora de DEUS para com Israel. A palavra literalmente significa "assumir o papel de resgatador” , tal como é exemplificado no livro de Rute e definido em Levítico 25:25. O verbo é usado com muita freqüência na segunda parte de Isaías para descrever a futura redenção que DEUS daria a seu povo do cativeiro em Babilônia, vista como um segundo Êxodo (Isaías 43:1). Tal como da primeira vez, Israel, Seu povo, era escravo em terra estranha, incapaz de se libertar, e foi o propósito de DEUS libertá-lo dessa escravidão.
A salvação, qualquer que seja a palavra empregada, é vista, portanto, como uma atividade característica de DEUS; é de Sua própria natureza socorrer os oprimidos e desamparados. Em termos neotestamentários, esta atividade é vista como parte da justiça "forense” de DEUS (Is 11:4). Em toda a Lei, Seu cuidado ativo em favor das viúvas, órfãos, cativos e estrangeiros recebe atenção especial (22:21-24). Além disso, já que DEUS cuida dos desamparados, Israel deve cuidar deles também (22:21,22). A lembrança da salvação divina, que Israel experimentara, e a lembrança de seu próprio desamparo antes dessa salvação deveriam, por seu turno, fazer de Israel um "salvador” de outros. Agir assim é conhecer de fato a DEUS, conhecer Quem e como Ele é, e demonstrar esse conhecimento de forma prática.
A DEUS, não bastava libertar Seu povo do cativeiro no Egito: numa sucessão de atos salvadores Ele os guiou, protegeu e alimentou através do deserto. E mesmo isto não era suficiente: DEUS, por fim, é o DEUS que age para dar a Seus redimidos uma rica herança. Isso fora prometido a Abraão (Gn 12:7) e novamente prometido a Moisés em 3:8, a primeira de inúmeras passagens que descrevem a abundante riqueza da terra de Canaã. Daí surge a crescente conscientização da abençoada herança que DEUS havia preparado para Seus escolhidos, o grande tema de Deuteronômio. No Velho Testamento tais bênçãos, em sua maioria, permanecem relacionadas a este mundo, embora gradativamente sejam relacionadas a um futuro ideal (Is 11:6-9). No Novo Testamento a herança
prometida passa a ser uma questão de tesouros espirituais (1 Pe 1:4), mas isso não significa que a herança tenha se tornado uma parte menos real da salvação, ou manifestação menor do poder que DEUS tem de agir em favor de Seu povo. No entanto, a despeito da natureza variada dos atos redentores de DEUS, era sempre às experiências do Êxodo que Israel se reportava como o supremo exemplo. Se tivermos que isolar um momento, a travessia do Mar Vermelho (14:30,31) foi o momento decisivo, porque somente então Israel tomou consciência de que havia passado da morte para uma nova vida.
Há alguns que vêem no grande hino triunfal de Êxodo 15 ecos de uma antiga batalha mitológica da criação, em que DEUS triunfa sobre Seu inimigo, Yãm, o monstro marinho. O poema contido no capítulo
15 pode ter utilizado metáforas já pálidas, extraídas de tal narrativa mitológica, como a poesia o tem feito através dos séculos, mas aqui o mar não é o inimigo, como no mito. É apenas um agente de DEUS, cumprindo Sua vontade: não é nem mesmo personificado. O verdadeiro inimigo é o obstinado Faraó (15:4), o homem que tentou se opor a DEUS (5:2), e é sobre ele que DEUS triunfa gloriosamente.
Faraó representa o zênite do poder humano, voltado contra DEUS e Seu povo: assim sua queda é um símbolo apropriado e constante da impossibilidade de se lutar contra DEUS ou de subverter os planos divinos.
É por isso também que a travessia do Mar Vermelho se tornou um símbolo tão apropriado do ato redentor de DEUS em favor de Israel. A travessia era para Israel o que a ressurreição de CRISTO é para a Igreja; o sinal de que os poderes das trevas foram decisivamente derrotados e de que a salvação estava agora assegurada e certa (14:30). Assim como as súplicas a DEUS no Novo Testamento são feitas com base em Seu ato máximo de redenção em CRISTO (Rm 8:32), assim também no Velho Testamento as súplicas feitas a DEUS são baseadas naquilo que Ele realizou no Êxodo (Jz 6:13), seu maior ato redentor em favor de Israel. Isso é também o que torna a travessia do "Mar dos Juncos” um símbolo tão apropriado do batismo aos olhos de Paulo (1 Co 10:1,2): as águas de julgamento são passadas e já adentramos os portais da salvação.
No entanto, se estendermos a analogia do Novo Testamento um pouco mais, veremos que a ressurreição foi apenas a proclamação do triunfo de DEUS; o verdadeiro ato de salvação ocorreu na cruz (Cl
2:14,15). Assim também, nos dias do Velho Testamento, foi a noite da Páscoa que marcou a verdadeira redenção de Israel do Egito (12:29-32) e por isso a Páscoa deve ser reconhecida como um dos "poderosos feitos” divinos. Embora, em outras partes do Velho Testamento, haja alusões freqüentes à libertação de Israel do Egito, o pequeno número de referências diretas à Páscoa é surpreendente. Ela oferece, contudo, rico simbolismo para a Nova Aliança, principalmente através do conceito da morte do cordeiro pascal, que Paulo entendia ter-se cumprido em CRISTO. É provável que a mesma idéia, parcialmente ao menos, esteja presente no título "Cordeiro de DEUS” dado a JESUS por João Batista (Jo 1:29). Qualquer que tenha sido o dia exato no calendário, a morte de CRISTO na cruz certamente se enquadra no contexto geral da Páscoa, evidenciando perfeitamente o cumprimento (Lc 22:8). Na verdade, a Última Ceia, símbolo de Sua morte (Lc 22:1), caso não tenha sido uma verdadeira refeição pascal, tinha com toda certeza íntima conexão com a cerimônia.
Embora a Páscoa não fosse um sacrifício no pleno sentido legal do termo, e muito menos uma oferta pelo pecado (estes aspectos da obra de CRISTO cumprem o sistema sacrificial de Israel, não a Páscoa), estava associada a um ritual cruento, tal como os sacrifícios (12:7). Além do mais, não tinha apenas um aspecto "apotropaico” (com o propósito de evitar o mal), mas também um elemento substitutivo, desde que uma vítima precisava morrer, se o primogênito da família quisesse permanecer vivo (12:13). Pode-se dizer também que a Páscoa era uma cerimônia propiciatória já que ela afastou a ira de DEUS (expressa em termos do anjo da morte) dos lares israelitas. Todos esses detalhes capacitam a Páscoa de maneira especial a ser uma categoria bíblica que facilita a
compreensão da cruz (1 Co 5:7), o mais grandioso ato redentor de DEUS em favor do homem, por intermédio do sangue de CRISTO.
VI. O DEUS que age em julgamento - DEUS é um DEUS que age, mas Sua atividade não se limita à salvação.
Ele é também um DEUS capaz de Se irar, mesmo com os Seus próprios servos (4:14). Este é um aspecto importante de toda a teologia, tanto do Novo (João 3:36) quanto do Velho Testamento. Certamente que se trata de um antropomorfismo, mas um antropomorfismo que corresponde a uma realidade, uma realidade tão grandiosa quanto a da graça de DEUS: esse antropomorfismo representa a imutável atitude divina de julgar o pecado (e portanto o pecador, caso não se arrependa).
Caracteristicamente, o Velho Testamento não se refere a atitudes, mas a atos. A ira de DEUS é demonstrada nos julgamentos que Ele envia sobre os que O "odeiam” (20:5), assim como Ele demonstra Seu "amor leal” àqueles que O amam (20:6). Quando a ira divina se acendeu contra Seu próprio povo, Ele teria consumido até mesmo a Israel (32:10).
A execução dos israelitas rebeldes pelos levitas depois da confecção do bezerro de ouro (32:28), e a praga que se seguiu (32:35), foram manifestações visíveis da ira de DEUS contra Seu próprio povo. As pragas do Egito e a destruição do exército no Mar Vermelho foram sinais de Sua ira contra Seus inimigos.
Este fato é mais uma vez típico da fé israelita, visto como interpretação de acontecimentos históricos. A execução e a praga aconteceram e a apostasia contra DEUS já acontecera antes: isso era incontestável.
Para interpretar esses acontecimentos, Israel simplesmente aplicava à catástrofe o mesmo padrão que aplicava ao triunfo. Se um era a salvação divina, o outro era o castigo divino; o princípio deve ser válido tanto para um quanto para o outro. Ambos são aspectos do juízo de DEUS, a atividade divina que traz salvação aos oprimidos e castigo ao opressor (Lc 1:52). Assim, enquanto Israel atravessa o Mar Vermelho em segurança, as carruagens de guerra de Faraó são destruídas pelas águas (14:28,29). Assim como em toda sua história subseqüente, Israel interpretará cada vitória em termos da atividade redentora de DEUS, da mesma forma interpretará todas as suas calamidades em termos da ira de DEUS. Foi este sistema de interpretação a única razão por que Israel pôde aceitar sua história subseqüente sem perder a fé em DEUS. A calamidade não era algo sem sentido: ela possuía seu lugar no propósito divino para Israel, mesmo que fosse o propósito de disciplinar o povo escolhido.
A ira de DEUS, no entanto, nunca é arbitrária, como a ira de Baal podia ser: pode-se afirmar com certeza o que O deixará irado, bem como podemos determinar o que O agradará, e à medida que a história da revelação avançava, essas áreas se tornavam mais e mais claras. Normalmente é a oposição obstinada a Ele que provoca Sua ira, no caso de Seus inimigos (14:4), ao passo que é infidelidade a Ele o que provoca Sua ira no caso de Seus próprios servos (32:7-10). Esses dois princípios são expressos sucintamente nas "dez palavras” (20:5,6). É por causa deste aspecto do caráter de DEUS que Ele pode Se auto--descrever como um DEUS "ciumento” (20:4 e 34:14), ou um "DEUS zeloso” , para usar uma palavra menos suscetível a mal-entendidos. Ele salva porque ama, e castiga Seu povo porque o vínculo único desse amor foi violado. Nas páginas finais do Velho Testamento, as implicações da aliança entre YHWH e Israel são descritas em termos do vínculo matrimonial por
Oséias, Jeremias e Ezequiel. Embora a metáfora do casamento propriamente dita não seja usada em Êxodo para descrever o relacionamento entre DEUS e o Seu povo, o embrião dessa idéia já está presente. Por isso, pecado contra DEUS pode ser descrito como adultério (Oséias 2:2), infidelidade ao vínculo matrimonial. Uma vez que o casamento é uma forma de aliança, na mentalidade hebraica (Ml 2:14), esta metáfora é extremamente apropriada. O que provoca a ira de DEUS é um rompimento de relações pessoais, e já que DEUS Se revelou primariamente em termos morais, esse rompimento é, costumeiramente, negligência em ou incapacidade de cumprir os Seus preceitos morais, cuja obediência constitui o maior teste de amor (20:6). De fato, toda a lei moral pode ser resumida, tanto no Velho quanto no Novo Testamento, em termos de amor a DEUS (Dt 6:5) e amor ao próximo (Lv 19:18).
Em nenhum outro lugar no Velho Testamento a ira de DEUS é mais enfatizada que no contexto da revelação divina no Sinai (19:16-19), no exato momento em que a graça de DEUS se encontrava mais viva na mente de Seu povo. Portanto, grande parte do simbolismo corrente utilizado mais tarde para descrever a ira divina encontra sua origem nos acontecimentos relacionados ao Sinai: fogo, trevas, o monte tremendo (Salmos 18:7-15) — todos são usados. Mesmo ao tempo do Novo Testamento isso ainda acontecia como se pode ver em Hebreus 12:18,19.
Por outro lado, em certo sentido, mesmo este aspecto da ira de DEUS era parte de Sua glória (24:17): DEUS é glorificado por Seus atos, sejam eles de salvação ou de julgamento.
Em face da ira de DEUS, não é de estranhar que Israel tenha se aterrorizado (20:19). Esse temor era ao mesmo tempo o reconhecimento da verdadeira natureza de DEUS e da própria pecaminosidade de Israel. Quando a santidade de DEUS e o pecado do homem foram postos lado a lado, uma reação violenta tornou-se inevitável. Assim sendo, o seu medo se tornou, em sua expressão mais pura, o piedoso e reverente "temor do Senhor” , o medo da desobediência e suas conseqüências. Esse tipo de temor piedoso é recomendado em 20:20. A partir daí, o "temor do Senhor” se torna o sinônimo de uma vida de plena obediência a Ele no Velho Testamento (SI 111:10). Por este ângulo, não há qualquer contradição entre a virtude que o Velho Testamento chama de "temor do Senhor” e o princípio neotestamentário de que "o perfeito amor lança fora o medo” (1 Jo 4:18). Isso se toma ainda mais patente pelo fato de que o mesmo DEUS que é capaz de Se irar ofereceu a Israel os meios pelos quais Sua ira pode ser evitada; Ele não tem prazer em castigar e sim em salvar.
VII. O DEUS cuja ira pode ser evitada
YHWH é também o DEUS cuja ira pode ser desviada (32:30-34). O arrependimento, muitas vezes bem superficial, como o de Faraó, pode evitá-la, bem como o pode a oração intercessória (8:8). A oferta pelo pecado também pode desviá-la (29:10-14), embora Levitico seja mais rico em exemplos deste último caso. O supremo exemplo da ira de DEUS sendo evitada é aquele da nobre oração intercessória de Moisés depois do episódio do bezerro de ouro (32:32), em que ele se identifica com seu povo, mostrando-se disposto a participar até do castigo que eles mereciam (compare Paulo em Romanos 9:3). Em outras religiões, indivíduos também criam que a ira dos deuses podia ser aplacada através de orações e ofertas: para eles, no entanto, tais orações possuíam eficácia mágica ou quantitativa. Se examinarmos o conteúdo da oração de Moisés (32:11-14) veremos a peculiaridade da fé israelita. Moisés faz seu apelo a DEUS com base em Sua natureza, revelada no ato redentor recém-acontecido e na promessa de bênção a Israel. Muitos anos antes disso, em sua oração em favor de Sodoma, Abraão já fizera o mesmo (Gn 18:22-33). Não se trata de um perdão extorquido a alguém que não está disposto a concedê-lo: é a reivindicação do amoroso propósito que DEUS já havia revelado. Quando lemos, mais adiante, sobre a revelação que YHWH faz de Sua própria natureza, vemos que Ele não é um DEUS que Se alegra com a ira e o castigo: Seu prazer está em demonstrar misericórdia (34:6), como fica bem patente em outras partes do Velho Testamento (Ez 18:23). O oferecer uma oração intercessória (às vezes simbolizada pelo incenso, Nm 16:46) em favor da nação pecaminosa é considerado um ato de "propiciação” (32:30). Até mesmo uma oferta em dinheiro ao tesouro sagrado pode ser considerada expiação (30:16), uma oferta propiciatória, aceita como resgate pela vida. Isso nos leva diretamente ao próximo aspecto.
Embora, como dissemos acima, a ira de DEUS possa ser "propiciada” através da oração intercessória, o uso normal do conceito "propiciação” (normalmente uma forma intensiva do verbo hebraico kãpar, que significa cobrir) está relacionado ao sacrifício animal visto como oferta pelo pecado. Êxodo contém vários casos em que tal sacrifício, e especialmente o sangue derramado em tais sacrifícios, é apresentado como "propiciação” em favor de Arão e de seus filhos (29:35,36), ou mesmo em favor de objetos inanimados como o altar (29:37). Assim, o princípio que é claramente apresentado em Levitico (Lv 17:11) se encontra perfeitamente implícito em Êxodo. O sangue derramado, simbolizando a vida sacrificada, é o que faz "propiciação” sobre o altar e desvia a ira de DEUS. Em 29:36, a "propiciação” é diretamente relacionada à "oferta pelo pecado” , de modo que o significado do termo "propiciação” é bem claro; no entanto, "propiciação” ou "expiação” (como o termo é traduzido algumas vezes) também parece apresentar em Êxodo o conceito de "consagração” para um uso ou tarefa particular (29:37). À medida que o Velho Testamento progredia, o conceito de propiciação por meio de uma oferta pelo pecado continuou, acabando por tornar-se um sistema bastante complexo ao tempo do Templo em Jerusalém, estendendo-se a todas as áreas da vida. Resta muito pouca dúvida quanto ao fato de que o conceito de propiciação por sacrifício se origina no princípio da substituição, encontrado já desde o tempo de Abraão (Gn 22:13). Outras religiões também possuíam a idéia de aplacar a ira de seus deuses por meio de sacrifícios, mas este conceito era radicalmente diferente em Israel. Para os israelitas todo e qualquer sacrifício se originava em DEUS (Lv 17:11). Era Ele quem ordenava e aceitava a oferta pelo pecado que tornava possível a propiciação, tal como Ele mesmo havia fornecido o carneiro para Abraão (Gn 22:8). Essa oferta, tal como a oração de Moisés em favor de seu povo, não era a extorsão do perdão a um DEUS que não se dispunha a concedê-lo; era um meio de acesso a Ele por Ele mesmo graciosamente concedido. Além do mais, os sacrifícios não eram de efeito automático: uma boa ilustração é o fato de que o indivíduo não poderia cometer pecado "atrevidamente” (lit. "com a mão estendida” , Nm 15:27-31), ou seja, uma rebelião deliberada e aberta contra DEUS, pensando que mais tarde sempre poderia comprar o perdão através de sacrifícios. Para tal indivíduo o sacrifício de nada valia. E mesmo dentro do contexto do Velho Testamento os santos já percebiam que não era o sacrifício em si que aplacava a ira de DEUS, mas o coração contrito que o sacrifício devia representar (SI 51:16,17).
O uso mais interessante do verbo "propiciar” em Êxodo é o substantivo dele derivado, kappõret (traduzido como "propiciatório” ), usado como o nome da cobertura da arca (37:6). Dizer que alguns comentaristas traduzem a palavra simplesmente como "tampa” , baseados no sentido literal da raiz, "cobrir” , nada mais é que ser fiel aos fatos.
Se, porém, a palavra realmente significa "lugar de propiciação” ou "lugar onde o pecado é coberto” (como o termo grego hilastêrion parece sugerir), temos aqui outra expressão do interesse divino em desviar a Sua ira de sobre o homem. A arca era aquele lugar especial em que DEUS prometera vir ao encontro do homem (25:22) e onde Ele lhes prometera falar. Essa "cobertura” da arca era vista como o próprio trono de DEUS (SI 99:1), coberto pelas asas dos querubins (25:20), o lugar (se pudermos usar o termo reverentemente) da própria presença de DEUS. Sem qualquer dúvida, era esta a razão por que a arca era considerada o símbolo da presença de DEUS. O profundo valor da arca se vê pelo lugar que ocupava no "lugar santíssimo” dentro do Tabernáculo (40:21) e pela sua função em guiar a Israel, quer fosse durante sua marcha no deserto (Nm 10:33) ou na frente de batalha (Nm 10:35). Assim, no coração do conceito da presença de DEUS com Israel jazia a idéia da propiciação e do perdão, oferecidos e garantidos por DEUS em favor de Seu povo tão pecaminoso.
Para uma discussão breve do sentido real da palavra kappõret, veja o comentário (em 37:6); qualquer que seja a resposta em termos lingüísticos, ela não afeta o tema mais amplo da predisposição divina em perdoar. Na melhor das hipóteses, da seria apenas um apoio lingüístico e uma verdade teológica, perfeitamente discernível em todo o Velho Testamento.
VIII. O DEUS que fala
É um fato digno de nota que, na primeira ocasião em que a frase "o DEUS vivo” ocorre no Velho Testamento* ela está relacionada à comunicação verbal de DEUS (Dt 5:26). Esta é uma das maneiras pelas quais Ele demonstra que é um DEUS vivo e ativo. YHWH é um DEUS, que Se revela através da palavra. Êxodo 2:4-22 é um exemplo desta verdade, que precisa ser novamente afirmada em nossos dias, a fim de corrigir o desequilíbrio teológico atual. Nossos antepassados colocaram tanta ênfase no conceito do "DEUS que fala” que nossa geração provavelmente exagerou a ênfase, em reação bem compreensível, no conceito bíblico complementar do "DEUS que age”. O que estamos, ambos, afirmando é que DEUS Se revela ao homem em palavra e ação, isto é, por um ato interpretado: como se diz com freqüência em teologia bíblica "ato mais interpretação = revelação” . Na Bíblia, a palavra precede freqüentemente o ato: primeiramente vem a promessa e depois o seu cumprimento. Falando em termos abstratos, dizer que Ele é o DEUS que fala é a simples afirmação do principio de que a revelação de DEUS é sempre intelectualmente compreensível e comunicável: tanto pode ser entendida pelo que a recebe quanto comunicada a outros. Foi isto que tornou possível a futura seqüência de profetas em Israel, com sua interpretação da história da nação. De fato, a vocação e experiência de Moisés junto à sarça ardente determinam o padrão para todas as vocações proféticas posteriores (3:1-6). Quando qualquer dos profetas subseqüentes afirmava "Assim diz o Senhor” (Amós 1:3), estava afirmando a mesma verdade afirmada por Moisés, não em termos de algum princípio abstrato, mas de sua própria experiência, concreta e pessoal. Ele comunica a palavra de YHWH porque ouviu, antes, ele mesmo, a palavra de YHWH (16:23).
O conceito do "DEUS que fala” se apresenta de maneira profunda em todo o livro de Êxodo. É verdade que no Sinai todo o Israel ouviu a voz de DEUS, simbolizada pelo trovão (19:19), e tremeu diante dela (20:18). A característica suprema do relacionamento peculiar entre Moisés e DEUS é que Ele "falava” face a face com ele, abertamente (33:11), ao contrário da maneira indireta pela qual eventualmente Se comunicava com outros. Quando a grande aliança é celebrada no Sinai, seus alicerces são as "palavras” de DEUS (24:8). Na verdade, o que chamamos de "Dez Mandamentos” era para o israelita as "Dez Palavras” da revelação divina (20:1); apenas por serem as palavras da revelação divina é que se tornam mandatórias. Além do mais, por ser um DEUS que fala, Ele é um DEUS que tem prazer em declarar Sua própria natureza (33:12-23). O começo desse processo se encontra na revelação do nome YHWH a Moisés na sarça ardente (3:14,15). Em nenhum outro lugar, entretanto, ele fica mais claro que na grande auto-declaração do nome de DEUS (isto é, Sua natureza) em Horebe (34:6,7), em resposta à oração de Moisés para que DEUS lhe revelasse Seus caminhos, e Moisés pudesse conhecê-lO (33:13). A palavra de revelação que daí procede é profundamente verdadeira. Homem algum pode experimentar a DEUS tal como Ele é, em todo o Seu esplendor; contudo, DEUS pode ser conhecido através das marcas de Sua passagem, por aquilo que fez (“tu me verás pelas costas”, 33:23). Assim é o DEUS comprovado pela experiência de Israel que será proclamado, o mesmo DEUS que Israel ainda viria a encontrar no futuro.
Esta auto-revelação é, em certo sentido, uma reiteração, e noutro, uma ampliação da revelação anterior contida no nome YHWH. Por exemplo, a construção tipo "idem per idem” encontrada aqui, "Terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia e me compadecerei de quem eu me compadecer” (33:19), não é apenas uma explicação do nome YHWH mas possui também a mesma forma gramatical da explicação anterior "Eu sou o que sou” (3:14). A questão da natureza deliberadamente restritiva desta construção é discutida no comentário. Ela certamente enfatiza tanto a atividade de DEUS quanto a Sua completa soberania no exercício dessa atividade. É notável que a atividade divina venha primariamente definida em termos positivos, ou seja, literalmente "graça e misericórdia” (33:19). Isso Israel certamente já comprovara, em sua experiência histórica. As frases iniciais da declaração mais completa registrada no capítulo seguinte descrevem a DEUS da mesma maneira (34:6,7); a parte final do versículo 7, no entanto, apresenta o aspecto negativo da destruição (“ainda que não inocenta o culpado, e visita a iniqüidade...” ). Esse aspecto é necessário a uma representação completa de Quem é DEUS. A semelhança a Êxodo 25:5,6 é assinalada com muita freqüência em ambos os aspectos. Não é por acaso que, nos dois exemplos, este "auto-kerygma”, esta "auto-declaração” de DEUS, se encontra no contexto dos mandamentos dados a Seu povo. Em Êxodo 20 o contexto é o decálogo moral ao passo que no capítulo 34 o contexto é o chamado "decálogo ritual”, que trata principalmente das festas religiosas de Israel. Em ambos os casos, YHWH tem o direito de legislar por ser Quem é e por ser o que revelou ser na vida de Israel.
Esta auto-declaração divina continua, a níveis cada vez mais profundos, ao longo da revelação no Velho Testamento. Para o crente, todavia, é a vinda de JESUS CRISTO, a "palavra” de DEUS encarnada, que torna completa e final a definição da natureza de DEUS. Nela DEUS finalmente Se revelou de maneira mais perfeita através de Seu Filho.
IX. O DEUS que é transcendente
YHWH é um DEUS que não pode ser diretamente experimentado em Sua plenitude pelo homem mortal. A expressão clássica desta verdade se encontra em 33:20: "homem nenhum verá a minha face e
viverá” . (A contradição entre esta passagem e 24:11 é apenas aparente; veja o comentário). Esta mesma idéia é apresentada em 3:2, pelo uso da frase "o Anjo do Senhor”, melhor traduzida por "o mensageiro de YHWH. Não cabe aqui uma discussão de angelologia bíblica, ainda mais por estarmos tratando de um aspecto da realidade espiritual que transcende nossa experiência atual. Gênesis 16:7-13 pode servir como exemplo do mesmo uso da expressão em ocasião bem anterior, apresentando a mesma ambigüidade quanto à possibilidade de o autor estar usando o termo anjo para descrever um ser espiritual criado por DEUS e submisso a Ele ou como um substituto reverente da palavra "DEUS” . Teólogos do passado costumavam explicar tais visitações angelicais como "teofanias”, aparições do próprio DEUS na Terra. De fato, muitos deles, costumavam ver em tais manifestações as chamadas "cristofanias”, aparições do CRISTO pré-encarnado. Embora não possamos concordar completamente com seu ponto de vista, podemos bem ver aqui uma ilustração do mesmo princípio espiritual que foi cumprido quando "o Verbo se fez carne” (João 1:14). Isso explicaria a curiosa alternação pela qual o anjo parece às vezes agir independentemente (3:2), e às vezes parece falar e agir na pessoa do próprio DEUS (3:4). Quer, porém, consideremos a expressão "anjo do Senhor” em tais ocasiões como uma perífrase reverente para o nome de DEUS, ou como uma entidade espiritual distinta, em ambos os casos a terminologia serve para destacar o problema teológico de como reconciliar a transcendência divina com a participação ativa de DEUS na História — e na verdade, Seu controle da História com o objetivo de realizar Seus propósitos. Esta antítese, embora bem pronunciada em Êxodo, não lhe é peculiar; nós a encontramos já no começo da Bíblia. Por um lado DEUS era transcendente e todo-poderoso (Gn 1:1), espírito e não carne (Gn 6:3), Aquele cujos pensamentos estavam muito acima dos pensamentos humanos (Gn 6:5); por outro lado, Ele era dotado de plena personalidade e podia ser descrito audaciosamente em termos antropomórficos (Gn 3:8), e se preocupava com os menores detalhes do cotidiano.
A introdução de "anjos” foi uma das maneiras em que, na providência de DEUS, ambos os aspectos podiam ser afirmados simultaneamente. Embora DEUS não possa ser experimentado diretamente, podemos conhecer algo de Sua presença. Ele é um DEUS de "glória” ; uma expressão típica de Êxodo é "a glória do Senhor apareceu na nuvem” (16:10). A palavra hebraica kãhôd (cujo significado literal é "peso”, e por metáfora "dignidade” ) é uma das palavras usadas para denotar a presença de DEUS quando manifesta aos homens. Normalmente traz consigo, não apenas o conceito do esplendor de DEUS, mas também algo de Sua temível grandeza, como nesta ocasião. O homem mortal deve temer ao presenciar a glória de DEUS, tal como Israel temeu ao ver, simplesmente, a glória refletida a brilhar no rosto de Moisés, quando ele retornou de seu período de comunhão com DEUS no alto do Sinai (34:39-35). Até onde possamos determinar, um certo brilho estava associado a essa glória. Em 24:17, a glória divina sobre o Sinai é comparada a um "fogo consumidor” que aparecia em meio à nuvem negra. Certamente uma idéia semelhante era transmitida pelo termo "shekinah”, de origem mais recente (literalmente "habitação” ), usado para descrever o símbolo visível da presença de DEUS no Tabernáculo ou no Templo. O elo entre "glória” e "habitação” é o fato de que a "glória” de DEUS "habita” o Tabernáculo depois de este ser completado (40:34); este fora, na verdade, o único objetivo de sua construção. As vezes, portanto, DEUS revela Sua glória para demonstrar Seu favor, como neste caso; em outras ocasiões, contudo, ela demonstra Sua ira (J6:10). Esta é uma decorrência natural do que já dissemos acima (“ fogo” é um símbolo duplo) e pode ser comparada à dupla atividade divina em salvação e juízo. DEUS recebe glória em seu povo e através dele (Isaías 49:3), mas também recebe glória destruindo Faraó e seu exército (14:4). A palavra glória pode ser considerada, portanto, um sinônimo virtual para a presença de DEUS, tal como Ele é, em toda Sua divindade, presença esta revelada e reconhecida; o termo glória é, sem dúvida, uma perífrase para o próprio ser de DEUS. A palavra parece ser usada do mesmo modo no Novo Testamento; é por isso que vemos em CRISTO a própria glória de DEUS.
X. O DEUS que vive entre seu povo
YHWH viverá entre Seu povo (29:45). Este aspecto é chamado às vezes de "teologia da presença” e é uma tecla constantemente batida no livro de Êxodo. Já mencionamos o tema ao discutir a "glória” divina mas o tema é bem mais amplo. A promessa básica de DEUS a Israel era "Minha presença irá contigo” (33:14). Em contraste, a oração de Moisés é que, se a presença de DEUS não acompanhar Israel, Ele não os conduzirá a Canaã em hipótese alguma (33:15). Aos olhos de Moisés, o que distinguia a Israel era a presença de DEUS que os acompanhava.
Essa "teologia da presença” é tão importante, que um comentário de Êxodo tal como o de Henton Davies a considera o pensamento central do livro. A princípio, o chamado de Moisés é uma confrontação com a presença de DEUS (3:5). É a presença de DEUS que permite a Israel atravessar o Mar Vermelho e ao mesmo tempo destrói os egípcios, bem como é a presença de DEUS que guia e protege Israel no deserto (14:19,20). Quando YHWH passa diante de Moisés e "proclama o nome do Senhor” (34:5), o que ocorre é uma proclamação da natureza dessa presença. Todo o processo de celebração da aliança (24:1-11) e doação da lei (20) é uma garantia da realidade dessa presença. Por fim, o objetivo único da construção do Tabernáculo é que a presença de DEUS seja experimentada entre o próprio povo de Israel (25:8). A glória máxima do término da construção do Tabernáculo vem quando os israelitas têm uma prova visível de que a presença de DEUS com Seu povo realmente aconteceu (40:35). O livro termina com a confiante certeza de que esta mesma presença continuará sem dúvida a seguir com Israel, levará o povo a possuir Canaã e lhe dará o "descanso” (33:14) que será o cumprimento da promessa feita a Abraão (Gn 13:15).
Como já foi mencionado, essa Presença era enfatizada pelo próprio projeto do Tabernáculo e simbolizada particularmente pela arca, que ficava no lugar santíssimo, no centro exato do acampamento do povo de DEUS. Em dias futuros na história de Israel, o simbolismo "estático” da habitação de DEUS em Jerusalém (SI 9:11), especialmente no Templo de Salomão (SI 20:2), substituiu o simbolismo "dinâmico” daqueles primeiros dias em que uma tenda móvel e uma arca portátil "localizavam” em menor escala a presença divina. Houve os abusos possíveis em ambos os casos: Hofni e Finéias pensaram que a presença de DEUS era automaticamente garantida pela arca (1 Sm 4:3), tal como os judeus, séculos depois, a considerariam automaticamente garantida pelo Templo em Jerusalém (Jr. 7:4). A sorte do santuário em Siló deveria tê-los feito pensar de outro modo (Jr 7:12). No entanto, apesar de abusos e falsas compreensões, a promessa mais venerada do Velho Testamento foi sempre a promessa feita por DEUS e que Ele viveria entre Seu povo (Is 7:14), e na vinda de JESUS CRISTO a profecia do futuro "Emanuel” (DEUS conosco) finalmente se tornou realidade. Assim sendo, a presença de DEUS está diretamente, não mais indiretamente, entre os homens para sempre (Ap 21:3); o tipo e a ilustração já passaram porque a realidade já se fez em CRISTO.
 
INTERAÇÃO
Prezado professor, pela graça de DEUS iniciamos um novo ano e um novo trimestre. Estudaremos o segundo livro do Pentateuco, Êxodo. Teremos a oportunidade ímpar de conhecer mais a respeito da libertação de Israel do cativeiro egípcio e sua trajetória pelo deserto rumo à Terra Prometida. O comentarista das lições é o pastor Antonio Gilberto, Consultor Teológico e Doutrinário da CPAD, membro da Casa de Letras Emílio Conde, teólogo e escritor. Que o Todo-Poderoso utilize cada lição para a edificação de seus alunos. Que DEUS o abençoe.
 
OBJETIVOS - Após esta aula, o aluno deverá estar apto a:
Ressaltar os aspectos principais do livro de Êxodo.
Delinear os aspectos biográficos de Moisés.
Saber que o zelo precipitado de Moisés e sua fuga não impediram os propósitos divinos em sua vida.
 
ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA
Professor, para esta primeira aula sugerimos que seja feito um esboço geral do livro de Êxodo. Reproduza o esquema da página seguinte no quadro de giz ou tire cópias para os alunos. Explique à classe que o vocábulo êxodo significa saída. Moisés é o autor do livro e, segundo a Bíblia de Estudo Pentecostal, o propósito dele ao escrever a obra foi oferecer ao seu povo um registro permanente dos atos históricos e redentores de DEUS.
Comente com os alunos que alguns conceitos importantes são enfatizados por Moisés no decorrer de todo o livro, como por exemplo, a libertação da morte, da escravidão e da idolatria.
 
O LIVRO DE ÊXODO
Título
Êxodo.
Autor
Moisés.
Data e local
Aproximadamente 1450—1410 a.C. Foi escrito no deserto, durante a peregrinação de Israel, em algum lugar da península do Sinai.
Propósito
Registrar os acontecimentos da libertação de Israel do Egito e seu desenvolvimento como nação.
Estrutura
I. Israel no Egito (1.1— 13.20).
II. Israel no deserto (12.1—18.27).
III. Israel no Sinai (19.1— 40.38).
Lugares-chaves
Egito, Gósen, rio Nilo, Midiã, mar Vermelho, península do Sinai e monte Sinai.
Características
Relata mais milagres do que qualquer livro do Antigo Testamento.
Versículo-chave
Êxodo 3.7,10.
Pessoas-chave
Moisés, Faraó, Miriã, Jetro, Arão.
Lugares-chave
Egito, Gósen, rio Nilo, Midiã, mar Vermelho, península do Sinai e monte Sinai.
 
PALAVRA-CHAVE
Cativeiro: Escravidão, servidão dos hebreus pelos egípcios.
 
Resumo da Lição 1 - O Livro de Êxodo e o Cativeiro de Israel no Egito
I - O LIVRO DE ÊXODO
1. Seu propósito.
2. A escravidão.
3. Clamor por libertação.
II - O NASCIMENTO DE MOISÉS
1. Os israelitas no Egito.
a) Frutificaram, aumentaram muito, multiplicaram-se (At 9.31; Lc 14.22,23).
b) "Fortalecidos grandemente”.
c) "A terra se encheu deles".
2. Um bebê é salvo da morte.
3. A mãe de Moisés (Êx 6.20).
4. A Filha de Faraó (Êx 2.5,6).
III - O ZELO PRECIPITADO DE MOISÉS E SUA FUGA (Êx 2.1 1 22)
1. Moisés é levado ao palácio (Êx 2.10).
2. O preparo de Moisés (Êx 3.9,10).
3. A fuga de Moisés (Êx 2.1 1-22).
 
 

 
Vamos a seguir ler um brilhante estudo elaborado pelo Pb. Alessandro Silva.
VENHO TRAZER A TONA A HISTORIA CONTADA PELO HISTORIADOR DO SEC I FLAVIO JOSEFO, ONDE OBTEMOS MAIS PROVAS E EVIDENCIAS DO QUE A BÍBLIA JÁ RELATA, NÃO ESTOU DE MANEIRA ALGUMA PASSANDO POR CIMA DA AUTORIDADE DA MESMA.
Um dos doutores da sua lei, ao qual eles dão o nome de escribas das coisas santas e que passam entre eles por grandes profetas, disse ao rei que naquele mesmo tempo deveria nascer um menino entre os hebreus, cuja virtude seria admirada por todo o mundo, pois aumentaria a glória de sua nação e humilharia o Egito, e cuja reputação seria imortal. O rei, assustado com a predição e seguindo o conselho daquele que lhe fazia essa advertência, publicou um edito pelo qual ordenava que se deveriam afogar todas as crianças hebréias do sexo masculino e ordenou às parteiras do Egito que observassem exatamente quando as mulheres fossem dar à luz, porque não confiava nas parteiras de sua nação. Esse edito ordenava também que aqueles que se atrevessem a salvar ou criar alguma dessas crianças seriam castigados com a pena de morte, juntamente com toda a família.
Um hebreu de nome Anrão, muito estimado entre os seus, vendo que a sua mulher estava grávida, ficou muito preocupado, por causa do edito que iria exterminar a sua nação. Recorreu então a DEUS, rogando-lhe que tivesse compaixão de um povo que sempre o havia adorado e fizesse cessar a perseguição que os ameaçava de ruína total. DEUS, tocado por aquela oração, apareceu-lhe em sonho e disse-lhe que esperasse: que Ele se lembrava da piedade do povo e da de seus antepassados; que os recompensaria agora, tal como havia recompensado aqueles; que era por essa consideração que os fizera multiplicar-se, desde Abraão, quando este partiu sozinho da Mesopotâmia para a terra de Canaã, a quem Ele cumulou de bens e tornou a mulher fecunda, e os sucessores dele, aos quais outorgou províncias inteiras: a Arábia a Ismael, Troglodita aos filhos de Quetura e o país de Canaã a Isaque; que eles não poderiam sem ingratidão e mesmo sem impiedade esquecer os felizes êxitos obtidos na guerra pela aliança com Ele; que o nome de Jacó se tornara célebre, tanto pela felicidade na qual viveu quanto pela que legou aos seus descendentes como um direito hereditário, e porque, havendo chegado ao Egito com setenta pessoas somente, a sua posteridade multiplicou-se, atingindo o número de seiscentos mil homens; que se tranqüilizassem, pois teria cuidado de todos em geral e dele em particular; que o filho de que a sua mulher estava grávida era o menino de quem os egípcios temiam tanto o nascimento e por causa de quem faziam morrer todos os meninos dos israelitas; que ele viria, contudo, felizmente ao mundo, sem ser descoberto pelos encarregados daquela cruel devassa; que ele, contra todas as esperanças, seria criado e educado e libertaria o seu povo da escravidão; que tão grande feito eternizaria a sua memória, não somente entre os hebreus, mas entre todas as nações da terra; que, por mérito dele, o seu irmão seria educado até tornar-se um grande sacerdote, sendo que todos os descendentes deste seriam honrados com a mesma dignidade.
Miriã, irmã do menino, por ordem de sua mãe, foi para o outro lado do Nilo ver o que aconteceria.
Como o berço flutuasse ao sabor das águas, Termutis, filha do rei, que passeava pela margem do rio, avistou-o e ordenou a alguns dos que a acompanhavam que a nado fossem buscá-lo.
A princesa logo ordenou que fossem procurar uma ama. Veio uma, porém a criança não quis mamar e recusou todas as outras que lhe trouxeram. Miriã, então, fingindo lá encontrar-se por acaso, disse à princesa:"É inútil, senhora, que mandeis chamar outras amas, pois elas não são da mesma nação que esta criança. Se tomardes uma ama hebréia, talvez ele não sinta aversão". Termutis aprovou a ideia e disse-lhe que fosse procurar uma. Ela foi imediatamente para casa e trouxe Joquebede, que ninguém conhecia, para ser a ama da criança, a qual deu-lhe de mamar.
Moisés, isto é,"salvo das águas", como sinal de um estranho acontecimento, pois mo, em língua egípcia, significa"água", e isés,"preservado".
Era o sétimo desde Abraão, porque Anrão, seu pai, era filho de Coate, Coate era filho de Levi, Levi era filho de Jacó, Jacó era filho de Isaque e Isaque era filho de Abraão.
Recebi-o em meus braços, resolvi adotá-lo e vo-lo ofereço como sucessor, pois não tendes filhos". Com essas palavras, ela o colocou entre os braços do rei, que o recebeu com prazer e, para obsequiar a filha, estreitou-o nos braços, colocando-lhe o diadema sobre a cabeça. Moisés, como uma criança, que se diverte, tirou-o e o jogou ao chão, pisando-lhe em cima.
Essa ação foi considerada de péssimo augúrio, e o doutor da lei que predissera o quanto seria funesto o nascimento daquele menino para o Egito ficou tão nervoso que desejou matá-lo imediatamente."Eis aí, majestade", disse ele, dirigindo-se ao rei,"este menino, do qual DEUS nos faz saber que a morte deve garantir a vossa paz.
Logo que o menino, criado e educado dessa maneira, chegou à idade de poder dar provas de sua coragem, praticou atos de bravura que não permitiram mais dúvidas quanto à veracidade do que se havia sido predito, isto é, que ele elevaria a glória de sua nação e humilharia os egípcios. Eis o motivo: A fronteira do Egito foi devastada pelos etíopes, que lhe estão próximos. Os egípcios marcharam com um exército contra eles, mas foram vencidos no combate e retiraram-se com desonra. Os etíopes, orgulhosos de tamanha vitória, julgaram que era covardia não aproveitar a boa sorte e começaram a se vangloriar de poderem conquistar todo o Egito. E lá entraram, por diversos lugares. A quantidade de despojos que arrebataram e o fato de não terem encontrado resistência alguma aumentaram-lhes a esperança de conseguir um feliz resultado na empresa. Assim, avançaram até Mênfis, chegando até o mar. Os egípcios, reconhecendo-se muito fracos para resistir a tão grande força, mandaram consultar um oráculo, e, por ordem secreta de DEUS, a resposta que receberam foi que somente um homem havia — um hebreu! — do qual podiam esperar auxílio.
O rei não teve dificuldade em julgar, por essas palavras, que Moisés era o hebreu em questão, ao qual o céu destinava salvar o Egito, e pediu à filha para fazê-lo general de todo o exército. Ela consentiu e disse-lhe que julgava assim prestar ao rei um grande serviço. Contudo obrigou-o ao mesmo tempo a prometer, com juramento, que não lhe fariam mal algum. A princesa, não se contentando em testemunhar assim a sua extrema afeição por Moisés, não pôde também deixar de — com azedume — perguntar aos sacerdotes egípcios se eles não se envergonhavam de o haverem tratado como inimigo e de desejarem tirar a vida a um homem a quem eram agora obrigados a pedir auxílio.
Pode-se imaginar com que prazer Moisés obedeceu às ordens do rei e da princesa, que lhe eram tão gloriosas. E os sacerdotes das duas nações tiveram com isso, por motivos diferentes, idêntica alegria. Os egípcios esperavam que, depois de vencerem os inimigos sob o comando de Moisés, encontrariam facilmente ocasião para matá-lo, à traição. E os hebreus ansiavam, por esse mesmo motivo, sair do Egito e livrar-se da escravidão.
Esse excelente general, posto à frente do exército, logo se fez admirar pela sua prudência. Em vez de marchar ao longo do Nilo, atravessou pelo meio das terras, a fim de surpreender os inimigos, que jamais pensariam que ele os fosse alcançar por um caminho tão perigoso, devido à quantidade de serpentes de várias espécies que ali vivem: muitas delas não existem em nenhum outro lugar e não somente são temíveis pelo seu veneno, mas são horríveis de se ver, porque, tendo asas, atacam os homens elevando-se no ar, para se atirar sobre eles. Moisés, para precaver-se contra elas, mandou colocar em gaiolas algumas aves chamadas íbis, que são domesticadas, amigas do homem, e inimigas mortais das serpentes, sendo que estas as temem não menos que aos cervos.
Nada mais direi sobre essas aves, porque não são desconhecidas aos gregos. Quando Moisés chegou com o seu exército a essa tão perigosa região, soltou os pássaros e passou assim sem perigo. Então surpreendeu os etíopes, deu-lhes combate e os dispersou, fazendo-os perder a esperança de se tornarem senhores do Egito. Mas tão grande vitória não reteve os seus intentos: entrou no país deles, tomou várias cidades, saqueou-as e fez grande mortandade. Tão gloriosos resultados reanimaram de tal modo a coragem dos egípcios que eles seriam capazes de tudo empreender sob o comando de tão excelente general. Os etíopes, ao contrário, só tinham diante dos olhos a imagem da escravidão e da morte.
O ilustre general impeliu-os até Sabá, capital da Etiópia, que Cambises, rei dos persas, chamou depois de Meroe, nome de sua irmã. Aí Moisés os sitiou, embora a cidade fosse tida como inexpugnável, porque, além de suas grandes fortificações, era rodeada por três rios: o Nilo, o Astape e o Astobora, cujo percurso é muito difícil. Ficava, assim, situada numa ilha e não era menos defendida pela água que a rodeava de todos os lados que pela força de suas muralhas e de suas defesas. Os diques que a preservavam das inundações dos rios serviam ainda de terceira defesa quando os inimigos passassem as outras.
Moisés ficou aborrecido ao constatar que tantas dificuldades juntas tornavam a conquista da cidade quase impossível, e o seu exército começava a enfadar-se, porque os etíopes não se atreviam mais a dar-lhes combate.
Tarlis, filha do rei da Etiópia, tendo-o visto do alto das muralhas praticar, num assalto, atos de valor e de coragem extraordinários, ficou tão cheia de admiração pela sua bravura, a qual reerguera o ânimo dos egípcios e fizera tremer a Etiópia, antes vitoriosa, que sentiu o coração ferido de amor por ele.
Com a paixão sempre aumentando, mandou oferecer-lhe a mão em casamento. Ele aceitou a honra, com a condição de que ela lhe entregasse a cidade. A promessa foi confirmada com um juramento e, depois que o tratado foi feito, em boa fé de parte a parte, ele deu graças a DEUS por tantos favores e reconduziu os egípcios vitoriosos de volta à sua pátria.
E assim, Faraó consentiu na morte de Moisés, e ela seria inevitável, se este não houvesse descoberto a intenção dos egípcios e se ausentado no momento oportuno. Moisés fugiu para o deserto e desse modo salvou-se, porque os inimigos não podiam imaginar que ele tomaria tal caminho. Como nada encontrasse para comer, viu-se atormentado por uma fome extrema, mas a suportou com paciência e, depois de haver andado muito, chegou, pelo meio dia, próximo da cidade de Midiã — nome que lhe deu um dos filhos de Abraão e Quetura —, à beira do mar Vermelho. Estando muito cansado, sentou-se à beira de um poço, para repousar, e esse fato deu-lhe ocasião de mostrar a sua coragem, abrindo o caminho para uma sorte melhor.
Flávio Josefo. HISTÓRIA dos HEBREUS De Abraão à queda de Jerusalém. Editora CPAD.
           O EGITO
 
O Egito representa uma das mais antigas civilizações humanas. Sua história é quase tão antiga como o próprio homem. Julgam alguns historiadores, por isso, ter sido o Vale do Nilo o berço da humanidade. Mas, por intermédio das Sagradas Escrituras, sabemos ser a Mesopotamia o primeiro lar de nossos mais remotos ancestrais.
Napoleão Bonaparte, em sua campanha pelo Oriente Médio, ficou extasiado com a antiguidade da civilização egípcia. Ao contemplar as colossais pirâmides, exclamou aos seus homens:"Soldados, do alto dessas pirâmides, quarenta séculos vos contemplam". A grandiosidade do Egito exerce um grande atrativo sobre o nosso espírito. Como não admirar as monumentais conquistas dos forjadores da civilização egípcia? A presença do Egito nas Escrituras Sagradas é muito forte. Por esse motivo, precisamos conhecer melhor a história e a geografia desse lendário e misterioso país. Tendo em vista o exíguo espaço de que dispomos, não poderemos tratar, com profundidade, da cultura egípcia. Cabe ao leitor, entretanto, aprofundar-se no assunto e buscar novas
informações em uma bibliografia adequada. Basta-nos. por enquanto, alguns dados gerais sobre o outrora portentoso império do Nilo.
I - HISTÓRIA DO EGITO
Não podemos datar, com precisão, quando chegaram os primeiros colonizadores aos territórios egípcios. Quanto mais recuamos no tempo, mais a cronologia torna-se imprecisa.
Sabemos, contudo, que os primeiros habitantes dessa região foram nômades. Após uma vida de árduas e incômodas peregrinações, eles começaram a organizar-se em pequenos Estados. Essas diminutas e inexpressivas unidades políticas conhecidas como nomos, foram agrupando-se com o passar dos séculos, até formarem dois grandes reinos: o Alto Egito, no Sul; e, o Baixo Egito, no Norte. Ambos estavam localizados, respectivamente, no Vale do Nilo e no Delta do mesmo rio. Entre ambas as regiões havia um forte contraste. Seus deuses eram diferentes, como diferentes eram, também, seus dialetos e costumes. Até mesmo a filosofia de vida desses povos eram marcadas por visíveis antagonismos. Declara o egiptólogo Wilson:"Em todo o curso da história, essas duas regiões se diferenciaram e tiveram consciência da sua diferenciação. Quer nos tempos antigos, como nos modernos, as duas regiões falam dialetos muito diferentes e vêem a vida com perspectivas também diferentes."
Sobre essa época, escreve Idel Becker:"Neste período pré-dinástico, o desenvolvimento da cultura egípcia foi, quase totalmente, autóctone e interno. Houve apenas, alguns elementos de evidente influência mesopotâmica: o selo cilíndrico, a arquitetura monumental, certos motivos artísticos e, talvez, a própria ideia da escrita. Há, nessa época, progressos básicos nas artes, ofícios e ciências. Trabalhou-se a pedra, o cobre e o ouro (instrumentos, armas, ornamentos, jóias). Havia olarias; vidragem; sistemas de irrigação. Foi-se formando o Direito, baseado nos usos e costumes tradicionais – leis consuetudinárias."
1 - A unificação do Egito
Em conseqüência de suas muitas diferenças, o Alto e o Baixo Egito travaram violentas e desgastantes guerras por um longo período. Essas constantes escaramuças enfraqueciam ambos os reinos, tornando-os vulneráveis a ataques externos. Consciente da inutilidade desses conflitos, Menés, rei do Alto Egito, conquista o Baixo Egito. Depois de algumas reformas administrativas, esse monarca (para alguns historiadores, uma figura lendária) unificou o país, estabeleceu a primeira dinastia e tornou Tínis, a capital de seu vasto império.
A unificação do Egito ocorreu, de acordo com cálculos aproximados, entre 3.000 a 2.780 a.C. Nesta mesma época, os egípcios começaram a fazer uso da escrita e de um calendário de 365 dias.
Unificados, o Alto e Baixo Egito transformaram-se no mais florescente e poderoso império da antiguidade. Os reis iniciaram a construção das grandes pirâmides, que lhes serviu de tumba. Por causa desses arroubos arquitetônicos, receberam o apelido de"casa grande "- faraó. Então, a cultura egípcia alcançou proporções consideráveis.
No final do Antigo Império, que abrange o período de 2.780 a 2.400 a.C, o poder dos faraós começou a declinar. O fim dessa era de glórias é marcado por revoltas e desordens, ocasionadas pelos governadores dos nomos.
Uma febre de independência alastra-se por todo o pais. Cresce, cada vez mais, o poder da nobreza; a influência da realeza decai continuamente. Aproveitando-se desse caos generalizado, diversas tribos negroides e asiáticas invadem o país.
Graças, entretanto, a intervenção dos faraós tebanos, o Egito consegue reorganizar-se, pelo menos até a agressão hicsa.
2 - A invasão dos hicsos
Não obstante a segurança trazida pelos príncipes de Tebas (11* dinastia) e pelas conquistas político-sociais do povo, o Egito começa a sofrer incursões de um bando aguerrido de pastores asiáticos. Nem mesmo o prestígio internacional dos faraós seria suficiente para tornar defensáveis as fronteiras egípcias.
Esses invasores, que dominariam o Egito por 200 anos, aproximadamente, são conhecidos como hicsos. Eles iniciam sua dominação em 1.785 e são expulsos por volta de 1580 a.C. Idel Becker, com muito critério, fala-nos acerca desse conturbado período:"Esta é a época mais confusa e discutida da história do antigo Egito: um período de invasões e de caos interno. Os hicsos - conglomerado de povos semitas e arianos, invadiram o Egito (através do istmo que o ligava à península do Sinai), venceram os exércitos de faraó e dominaram grande parte do país. Possuíam cavalos e carros de guerra (com rodas); e armas de bronze (ou talvez, mesmo, de ferro), mais bem acabadas e mais fáceis de manejar do que as dos egípcios. Tudo isso explica a sua superioridade bélica e os seus triunfos militares. Os hicsos talvez estivessem fugindo da pressão dos invasores indo-europeus (hititas, cassitas e mitanianos), sobre o Crescente Fértil."
Com os hicsos, acrescenta Becker, devem ter entrado no Egito os hebreus.
3 - Novo Império
Com a expulsão dos hicsos, renasce o Império Egípcio com grande pujança. Com Ames I, os faraós tornaram-se imperialistas e belicosos. Tutmés III, por exemplo, conquistou a Síria e obrigou os fenícios, cananitas e assírios a pagarem-lhe tributo.
A expansão egípcia, entretanto, esbarrou nos interesses dos poderosos hititas, senhores absolutos da Ásia Menor. Na ocasião, o célebre faraó, Ramsés II fez ingentes esforços para vencê-los. Como não conseguiu o seu intento, assinou com o reino hitita um tratado de paz, que vigorou por muitos anos.
Foi durante o Novo Império (1580-1200 a.C), que os israelitas começaram a ser escravizados pelos faraós. 4 – Decadência Após o Novo Império, o Egito começou a sofrer sucessivas intervenções: líbia, etíope, indo-européia, assíria, persa, grega e romana. Em linhas gerais, essa nação, cujo passado foi tão glorioso, pertenceu ao Império Romano, durante 400 anos; ao Império Bizantino, durante 300 anos. No Século VII d.C, fica sob a tutela dos muçulmanos. A partir de 1400, torna-se possessão turca. No Século XIX, fica sob a custódia franco-inglesa. No início deste Século, torna-se protetorado inglês.
Em 1922, todavia, conquista sua independência. Hoje, porém, não passa de um apagado reflexo de sua primeira glória.
II - GEOGRAFIA DO EGITO
Netta Kemp de Money descreve o antigo Egito:"O Egito da antiguidade se assemelhava em sua forma a uma flor de lótus (planta importante na literatura e na arte egípcia), no extremo de um talo sinuoso que tem à esquerda e um pouco abaixo da própria flor, um botão de flor. A flor é composta pelo Delta do Nilo, o talo sinuoso é a terra fértil que se estende ao longo do dito rio, e o botão é o lago de Faium que recebe o excedente das inundações anuais do Nilo".
O Egito atual tem o formato de um quadrado. Localizado no Nordeste da África, limita-se ao norte, com o mar Mediterrâneo; a leste, com Israel (e, também, com o mar Vermelho); ao sul, com o Sudão; a oeste, com a Líbia. De sua área, de quase um milhão de quilômetros quadrados, 96 por cento são compostos de terras áridas. Sua população, de 45 milhões de habitantes, é obrigada a viver com os 4 por cento de terras cultiváveis.
Localizava-se o Alto Egito no Sul do atual território egípcio. Essa região, chamada de Patros pelos hebreus (Jr 44.1,15), é constituída por um estreito vale ladeado por penedos de formação calcária. O Baixo Egito, por seu turno, localizava-se no Norte e sua área mais fértil encontra-se no Delta.
O Egito, no entanto, não existiria sem o Nilo. Esse rio é o mais extenso do mundo, com um percurso de 6.400 km com suas vazantes, fertiliza vastas extensões de terra, tornando possível fartas semeaduras. Heródoto, com muita razão, disse ser o Egito um presente do Nilo.
Em seu livro Geografia das Terras Bíblicas, afirma o pastor Enéas Tognini:"Sem o Nilo, o Egito seria um Saara - terrível e inabitado. O Nilo proporcionou riquezas aos faraós que puderam viver nababescamente, construindo templos suntuosos, monumentos grandiosos, palácios de alto luxo, pirâmides gigantescas e a manutenção de exércitos bem armados que, não somente protegiam o Egito, mas tomavam, nas guerras novas regiões. Os egípcios não tinham necessidade de observar se as nuvens trariam chuvas ou não. O Nilo lhes garantia a irrigação e as suas águas lhes davam colheitas fartas e certas. É fato que uma seca poderia trazer pobreza à terra, como aconteceu no tempo de José. Se a cheia fosse além dos limites, as águas poderiam arrasar cidades, deixando o povo desabrigado e prejudicariam as safras. Mas, tanto secas como enchentes eram raras. O Nilo era então, como é hoje, a vida do Egito e o principal fator de suas múltiplas organizações, simples algumas e sofisticadas e complexas outras".
III - A GRANDEZA DO EGITO
Os egípcios deixaram um marco de indelével grandeza na História. Desde as pirâmides às conquistas científicas e tecnológicas, foram magistrais. Haja vista, por exemplo, os arquitetos modernos que continuam a contemplar, com grande admiração, os monumentos piramidais construídos pelos faraós.
Desta forma Halley descreve a Grande Pirâmide de Queops:"O mais grandioso monumento dos séculos. Ocupava 526,5 acres, 253 metros quadrados (hoje 137), 159 m de altura (hoje. 148). Calcula-se que se empregaram nela 2.300.000 pedras de 1 metro de espessura média, e peso médio de 2,5 toneladas. Construída de camadas sucessivas de blocos de pedra calcária toscamente lavrada, a camada exterior alisada, de blocos de granito delicadamente esculpidos e ajustados. Estes blocos exteriores foram removidos e empregados no Cairo. No meio do lado norte há uma passagem, 1 m de largura por 130 de altura, que leva a uma câmara cavada em rocha sólida, 33 m abaixo do nível do solo, e exatamente 180m abaixo do vértice; há duas outras câmaras entre esta e o vértice, com pinturas e esculturas descritivas das proezas do rei". Os antigos egípcios destacaram-se, ainda, na matemática e na astronomia. Há mais de quatro mil anos, quando a Europa revolvia-se em sua primitividade, os sábios dos faraós já lidavam com fórmulas para calcular as áreas do triângulo e do círculo e, também, do volume das esferas e dos cilindros.
Souto Maior fala-nos, com mais detalhes, acerca do avanço científico dos antigos egípcios:"Apesar de não conhecerem o zero, já resolviam nessa época equações algébricas.
Os seus conhecimentos astronômicos permitiram-lhes a organização de um calendário baseado nos movimentos do Sol. A divisão do ano em doze meses de trinta dias é de origem egípcia; os romanos adotaram-na e ainda hoje é conservada com pequenas modificações. A medicina egípcia também era surpreendentemente adiantada. Chegaram a fazer pequenas operações e a tratar com habilidade as fraturas ósseas. Pressentiram a importância do coração e, na observação das propriedades terapêuticas de certas drogas, adquiriram alguns conhecimentos de farmacodinâmica".
IV - O EGITO E OS FILHOS DE ISRAEL
O relacionamento de Israel com o Egito remonta à Era Patriarcal. Premidos pela fome e outras agruras, Abraão e Isaque desceram à terra dos faraós, onde sofreram sérios constrangimentos. O primeiro e maior patriarca hebreu, por exemplo, esteve prestes a perder a esposa, cuja beleza embeveceu o rei daquela nação. Não fosse a intervenção divina. Sara não seria contada entre as ilustres mães do povo israelita.
Em sua velhice, Abraão recebe esta sombria revelação do Senhor:"Saibas, de certo, que peregrina será a tua semente em terra que não é sua, e servi-los-ão; e afligi-los-ão quatrocentos anos; mas também eu julgarei a gente, a qual servirão, e depois sairão com grande fazenda. E tu irás a teus pais em paz; em boa velhice serás sepultado. K a quarta geração tornará para cá; porque a medida da injustiça dos amorreus não está ainda cheia "(Gn 15.13-16).
1 - José, primeiro-ministro do Egito
Estêvão, sábio diácono da igreja primitiva, conta-nos como José chegou a primeiro ministro do Faraó:"E os patriarcas, movidos de inveja, venderam a José para o Egito. mas, DEUS era com ele. E livrou-o de todas as suas tributações, e lhe deu graça e sabedoria ante Faraó, rei do Egito. que o constituiu governador sobre o Egito e toda a sua casa. Sobreveio então a todo o país do Egito e de Canaã fome e grande tributação; e nossos pais não achavam alimentos. Mas, tendo ouvido Jacó que no Egito havia trigo, enviou ali nossos pais, a primeira vez. E, na segunda vez foi José conhecido por seus irmãos, e a sua linhagem foi manifesta a Faraó. E José mandou chamar a seu pai Jacó e a toda sua parentela, que era de setenta e cinco almas "(At 7.9-14).
Não obstante sua humilde condição de escravo, José tornou-se primeiro-ministro do Faraó. E, por seu intermédio, DEUS salvou toda a descendência de Israel. Não fosse o providencial ministério exercido por esse intrépido hebreu, a progênie abraâmica ver-se-ia em grandes dificuldades. Sua história é uma das obras-primas da humanidade.
José chegou ao Egito no Século XX a.C. Nesse tempo, segundo os historiadores, os hicsos dominavam o país. Sendo, também, semitas, os novos senhores da terra não tiveram dificuldades em demonstrar sua magnanimidade aos hebreus. Mostrando-se liberais e generosos, ofereceram aos israelitas a região de Gósen, onde a linhagem abraâmica desenvolveu-se sobremaneira.
2 – Moisés
Continua Estevão a contar a história dos israelitas no Egito:
Aproximando-se, porém, o tempo da promessa que DEUS tinha feito a Abraão, o povo cresceu e se multiplicou no Egito; até que se levantou outro rei, que não conhecia a José. Esse, usando de astúcia contra a nossa linhagem, maltratou nossos pais, a ponto de os fazer enjeitar as suas crianças, para que não se multiplicassem. Nesse tempo, nasceu Moisés, e era mui formoso, e foi criado três meses em casa de seu pai. E, sendo enjeitado, tomou-o a filha de Faraó, e o criou como seu filho. E Moisés foi instruído em toda a ciência dos egípcios; e era poderoso em suas palavras e obras.
"E, quando completou a idade de quarenta anos, veio-lhe ao coração ir visitar seus irmãos, os filhos de Israel. E, vendo maltratado um deles, o defendeu, e vingou o ofendido, matando o egípcio. E ele cuidava que seus irmãos entenderiam que DEUS lhes havia de dar a liberdade pela sua mão; mas eles não entenderam. E no dia seguinte, pelejando eles, foi por eles visto, e quis levá-los à paz, dizendo: Varões, sois irmãos; por que vos agravais um ao outro? E o que ofendia o seu próximo o repeliu, dizendo: Quem te constituiu príncipe e juiz sobre nós? Queres tu matar-me, como ontem mataste o egípcio?
"E a esta palavra fugiu Moisés, e esteve como estrangeiro na terra de Midiã, onde gerou dois filhos. E, completados quarenta anos, apareceu-lhe o anjo do Senhor, no deserto do monte Sinai, numa chama de fogo de um sarçal. Então Moisés, quando viu isto, maravilhou-se da visão; e, aproximando-se para observar, foi-lhe dirigida a voz do Senhor:
"Eu sou o DEUS de teus pais, o DEUS de Abraão, e o DEUS de Isaque, e o DEUS de Jacó. E Moisés, todo trêmulo, não ousava olhar. E disse-lhe o Senhor: Tira as alparcas dos teus pés, porque o lugar em que estás é terra santa: Tenho visto atentamente a aflição do meu povo que está no Egito, e ouvi os seus gemidos, e desci a livrá-los. Agora, pois, vem, e enviar-te-ei ao Egito.
"A este Moisés, ao qual haviam negado, dizendo: Quem te constituiu príncipe e juiz? a este enviou DEUS como príncipe e libertador, pela mão do anjo que lhe aparecera no sarçal.
Foi este que os conduziu para fora, fazendo prodígios e sinais na terra do Egito, e no mar Vermelho, e no deserto, por quarenta anos. Este é aquele Moisés que disse aos filhos de Israel: ü Senhor vosso DEUS vos levantará dentre vossos irmãos um profeta como eu; a ele ouvireis "(At 7.17-37). Israel deixou o Egito no Século XV a.C. Depois do Êxodo, israelitas e egípcios voltariam a se enfrentar no tempo dos reis e no chamado período inter-bíblico. Recentemente, com a independência do moderno Estado de Israel, as forças judaicas defrontaram-se com as egípcias diversas vezes. O antagonismo entre ambos os povos é milenar. Entretanto, o futuro dessas nações será de paz e glória:"Naquele dia haverá estrada do Egito até a Assíria, e os assírios virão ao Egito, e os egípcios irão à Assíria: e os egípcios adorarão com os assírios ao Senhor. Naquele dia Israel será o terceiro com os egípcios e os assírios, uma bênção no meio da terra. Porque o Senhor dos Exércitos os abençoará, dizendo: Bendito seja o Egito, meu povo, e a Assíria, obra de minhas mãos, e Israel, minha herança "(Is 19.23-25).
Claudionor de Andrade. Geografia Bíblica. Editora CPAD.        
A história do êxodo de Israel tem figurado por séculos na história dos hebreus e é acompanhada ao longo da história da Igreja como um referencial de interpretação da história da salvação. E isso não é sem motivo, pois não se pode imaginar um estudo sério da Palavra de DEUS sem que se examine o Pentateuco, e, mais precisamente, a forma como DEUS libertou o seu povo da escravidão e o levou à Terra Prometida.
Este capítulo trata da origem de Moisés, o homem que DEUS escolheu para trazer a liberdade para o povo de Israel. Levemos em conta que DEUS costuma se utilizar de instrumentos humanos para que a sua glória seja manifesta, e por isso podemos estudar os exemplos de homens e mulheres usados por DEUS para grandes feitos ao longo da Bíblia Sagrada.
COELHO, Alexandre; DANIEL, Silas. Uma Jornada de Fé. Moisés, o Êxodo e o Caminho a Terra Prometida. Editora CPAD. pag. 5.
Vi a aflição do meu povo. O povo de Israel chamava a atenção de DEUS, conforme já vimos em Êxo. 2.25. Era chegado o momento certo de agir. A Terra Prometida deveria passar para o poder de Israel, após o exílio no Egito, e depois que a culpa dos cananeus chegasse ao seu ponto culminante. Ver Gên. 15.13,16. DEUS cuida de Seu povo. Por certo essa é a mensagem central do evangelho. DEUS amou de tal maneira que deu (João 3.16), e uma provisão universal foi feita (I João 2.2). Ver no Dicionário 0 artigo Misericórdia (Misericordioso). DEUS sabia da situação aflitiva de Seu povo, e não podia tolerá-la. Ver Êxo. 3.7-9 e cf. Êxo. 2.24. E assim, foi planejada a libertação.
Exatores. Temos aqui uma palavra diferente da que é empregada em Êxo. 1.11, onde nossa versão portuguesa diz leitores”. Mas ambos os termos implicam um tratamento cruel. Os "exatores” não eram apenas capatazes. Tinham-se torna· do opressores; e era com eles que os escravos tinham de tratar todos os dias. DEUS sabia o quanto os israelitas sofriam fisicamente, 0 quanto a mente deles se sentia aflita e o quanto seu espírito se sentia desolado. Pareciam abandonados a uma sorte pior do que poderiam suportar. Mas a vontade soberana de DEUS estava prestes a reverter tudo isso.
CHAMPLIN, Russell Norman, Antigo Testamento Interpretado versículo por versículo. Editora Hagnos. pag. 314.
I - O LIVRO DE ÊXODO
1. Seu propósito.
O êxodo é o acontecimento crucial na história de Israel. Foi a poderosa libertação realizada pelo Senhor, para trazer todo o povo de Israel da escravidão no Egito e levá-lo à Terra Prometida. Esta saída do Egito e a conseqüente migração em direção a Canaã, sob a liderança de Moisés, foi marcada por muitos milagres, e resultou no estabelecimento dos israelitas como uma nação em aliança com DEUS, que era seu próprio governador teocrático.
Dentro do Pentateuco, o Êxodo faz uma ligação para que a história dos hebreus seja encadeada de forma que haja continuidade na narrativa mosaica. Um olhar panorâmico no Pentateuco nos mostra que em Gênesis DEUS cria o mundo, a humanidade, promete um Salvador e conduz Abraão, Isaque e Jacó a um relacionamento com Ele. O fim do livro de Gênesis fala sobre José, filho de Jacó, que vai para o Egito como escravo e se torna governador, com uma administração pautada no temor a DEUS e no bom senso. José traz seus irmãos e seu pai para o Egito, para que tenham um lugar mais tranqüilo para viver, e o livro é encerrado com o pedido de José para que os israelitas tirassem os seus ossos daquelas terras, pois DEUS os visitaria e os tiraria de lá. A seguir, o livro de Êxodo mostra a escravidão dos hebreus no Egito e a libertação divina por intermédio de Moisés, um personagem que vai figurar nos demais livros do Pentateuco. O livro de Levítico se encarrega de ensinar ao povo o valor da comunhão com DEUS, a lei sacrificial e o trabalho no Tabernáculo. O livro de Números aborda a peregrinação dos israelitas no deserto, e o livro de Deuteronômio mostra os discursos de Moisés ao povo antes de entrarem na Terra Prometida.
COELHO, Alexandre; DANIEL, Silas. Uma Jornada de Fé. Moisés, o Êxodo e o Caminho a Terra Prometida. Editora CPAD. pag. 6-7.
ESCOPO E PROPÓSITO
O livro de Êxodo é o livro da redenção. O nome grego"Êxodo "(lit."saída") descreve aqui como DEUS tirou os filhos de Israel da escravidão no Egito; mas por redenção compreendemos que o Redentor não apenas livra Seu povo da escravidão mas também coloca esse povo em relação especial Consigo mesmo, fazendo dele Sua própria possessão adquirida, sua"propriedade peculiar "(19.5).
O início do livro descreve, portanto, a grande libertação do povo de DEUS, Israel, o que culmina com a Páscoa e prefigura a redenção ainda maior operada no Calvário. Desse ponto o livro passa para o concerto estabelecido no monte Sinai, no qual DEUS declarou que Israel era Seu povo, dando-lhes os dez mandamentos, enquanto que por sua vez eles aceitaram Jeová como seu DEUS, comprometendo-se a obedecê-lo. Esse concerto foi o fundamento do sua existência nacional, do qual a nova aliança (1Co 11.25; Hb 8.6-13) forma o antítipo, com a chamada da Igreja. Finalmente, a história do estabelecimento do tabernáculo e de sua adoração provê a base sobre a qual a vida do povo redimido, em sua relação para com DEUS, precisava ser mantida. Na nova aliança a base da comunhão com DEUS é CRISTO. O tabernáculo e sua adoração, portanto, provêm muitos tipos e prefigura CRISTO (ver, por ex. Hb 8.5; 9.1-11; 10.1).
As referências no Novo Testamento justificam plenamente nossa posição que vê CRISTO como o"cumprimento "deste livro. Nos milagres registrados vemos"sinais "da operação divina (conf. Jo 2.11), no concerto do Sinai vemos um precursor da nova aliança, e na adoração do tabernáculo vemos uma"sombra dos bens vindouros "(Hb 10.1).
DAVIDSON. F. Novo Comentário da Bíblia. Êxodo. pag. 2.
O SIGNIFICADO DO ÊXODO
O êxodo é o evento teológico e histórico mais expressivo do A. T., porque mostra a magnificente ação de DEUS em favor de seu povo, uma ação que os conduziu da escravidão à liberdade, da fragmentação à unidade, de um povo com uma promessa - os hebreus - à uma nação estabelecida - Israel. No livro de Gênesis encontram-se a introdução e o propósito, seguindo-se então todas as revelações subseqüentes do .Antigo Testamento. Um registro que é ao mesmo tempo um comentário inspirado e uma exposição detalhada. Em última análise, o êxodo serve como um tipo do êxodo promovido por JESUS CRISTO, de forma que ele se torna um evento significativo tanto para a Igreja quanto para Israel.
MERRILL. Eugene H. Historia de Israel no Antigo Testamento. Editora CPAD. pag. 49-50.
2. A escravidão.
O livro de êxodo fala de escravidão. Essa expressão traz para nós a ideia de uma pessoa que está sob controle absoluto de outra por meio da força, e para essa pessoa trabalha sem qualquer direito. Tendo em vista os avanços na esfera social que o homem moderno obteve por meios democráticos, falar em trabalho escravo em nossos dias é uma coisa absurda, apesar de ele existir em muitos lugares no mundo. Não se pode pensar em um trabalho que não seja remunerado (exceto o voluntário), nem se pode imaginar pessoas trabalhando sem hora de descanso e ainda sendo tolhidas de direitos como o descanso e alimentação adequada. Mas no mundo antigo, a escravidão era uma prática bem difundida. Uma pessoa poderia cair nessa situação caso fosse vendida por familiares ou se fosse uma presa de guerra, ou mesmo se não pudesse pagar dívidas. O certo é que era uma situação constrangedora e humilhante para homens e mulheres que se viam envolvidos por ela.
O livro de Êxodo narra o princípio da escravidão do povo hebreu pelas mãos dos egípcios. Um rei se levantou no Egito, e esse monarca não tinha prazer em recordar a história daquela nação. Ele não conheceu a José, e essa expressão pode indicar que esse novo rei não soube que o Egito anteriormente passara por um período de extrema provação, quando os alimentos se tornaram escassos, e que se não fosse pela instrumentalidade de José, filho de Jacó, o Egito provavelmente não subsistiria.
DEUS fora misericordioso para com os egípcios, dando-lhes um administrador como José. E muito tempo depois, o Egito decide retribuir o livramento dado por José usando os hebreus como mão de obra escrava. Essa foi uma forma muito ruim de demonstrar gratidão, mas de forma geral essa é a tendência humana: esquecemo-nos das bondades de DEUS e nos tornamos senhores das bênçãos que Ele nos tem dado graciosamente.
A opressão dos egípcios contra os israelitas era tão grande que DEUS disse: "Por isso desci para libertá-los do poder dos egípcios” (Êx 3.8, NTLH). A expressão "poder” mostra o grau de opressão com que os egípcios tratavam os hebreus, considerando-os como se fossem nada, descartáveis.
"Qualquer egípcio ou egípcia poderia entrar nas casas dos israelitas, pará-los nas ruas ou em qualquer lugar onde estivessem, pegar a criança recém-nascida, conferir-lhe o sexo e, se fosse um menino, tomá-lo da sua mãe e ir direto ao Rio Nilo para jogar o bebê, a fim de que ele se afogasse ou fosse devorado por v crocodilos."
COELHO, Alexandre; DANIEL, Silas. Uma Jornada de Fé. Moisés, o Êxodo e o Caminho a Terra Prometida. Editora CPAD. pag. 7-8.
Êx 1.14 A ideia de tirania é reiterada (ver o versículo anterior). Havia trabalho forçado nos campos, nos projetos de construção. Havia dura servidão, e os direitos pessoais não eram respeitados — o que sempre acontece em todas as opressões. Normalmente, a história tem sido escrita por elementos das classes altas, girando em torno dos feitos de reis e príncipes; essas histórias estão cheias de atos de violência, ódio e opressão. Mas o livro de Êxodo relata a história de homens comuns que estavam sendo oprimidos; e, em lugar de elogiar aos opressores, diz a verdade sobre eles.
"Os egípcios criaram uma boa variedade de maneiras para oprimir os israelitas; pois forçavam-nos a cavar grande número de canais para 0 rio, ou a erigir muralhas para suas cidades ou a levantar moles para conter as águas do Nilo, impedindo que o rio extravasasse para além de suas margens. Também obrigaram os filhos de Israel a edificar pirâmides, com 0 que queriam desgastá-los”, disse Josefo em Antiq. (Ilv.ii. cap. ix. see. 1). Cf. Deu. 11.10.
Filo esclareceu que alguns israelitas trabalhavam com o barro, moldando-o em tijolos, ao passo que outros colhiam e transportavam palha e outro material para ser misturado à massa. Alguns filhos de Israel serviam em casas; outros, nos campos, outros cavando canais, e ainda outros transportando cargas” (De Vita Mosis, 1.1 par. 608).
CHAMPLIN, Russell Norman, Antigo Testamento Interpretado versículo por versículo. Editora Hagnos. pag. 306.
O LIBERTADOR INDISPENSÁVEL (Êx 1:1-22)
Os rabinos judeus chamam o Livro de Êxodo de"Livro dos Nomes "(ou"Estes São os Nomes"), pois ele começa com uma lista dos nomes dos filhos de Jacó (Israel) que levaram suas famílias para o Egito, a fim de fugir da fome que assolava Canaã (Gn 46).
DEUS usou a experiência de Israel no Egito com a intenção de prepará-los para a tarefa especial que deviam cumprir aqui na Terra: ser testemunho do verdadeiro DEUS vivo, escrever as Sagradas Escrituras e trazer ao mundo o Salvador.
Bênção (w. 1-7). Durante os anos em que José serviu como vice governante do Egito, sua família foi extremamente respeitada e, mesmo depois que José morreu, sua memória foi honrada pela forma como os egípcios trataram os hebreus. DEUS cumpriu as promessas da aliança que havia feito com Abraão ao abençoar seus descendentes e fazer com que se multiplicassem grandemente (Gn 12:1-3; 15:5; 17:2, 6; 22:17). No tempo do êxodo, o povo hebreu contava com mais de seiscentos mil homens de vinte anos ou mais (Êx 12:37; 38:26) e, se acrescentarmos a esse número as mulheres e crianças, temos um total de cerca de dois milhões de pessoas, sendo que todas elas eram descendentes da família de Jacó. Sem dúvida, DEUS havia cumprido sua promessa!
No entanto, um novo Faraó não se agradou da rápida multiplicação do povo hebreu e, assim, tomou medidas para controlá-la.
Primeira medida - A aflição dos adultos (w. 8-14). DEUS havia dito a Abraão que seus descendentes iriam para um país estrangeiro e lá seriam escravizados e maltratados, mas prometeu libertá-los por seu poder quando fosse a hora certa (Gn 15:12-14). DEUS comparou o Egito com uma fornalha de ferro (Dt 4:20) em que seu povo iria sofrer, mas sua experiência nessa fornalha transformaria os israelitas numa nação poderosa (Gn 46:3).
Ao longo dos séculos que os hebreus habitaram no Egito (Gn 15:13; Êx 12:40, 41), passaram pela mudança de várias dinastias egípcias. Mas que novo Faraó seria tão ignorante a ponto de não saber sobre José e sua família e de tentar destruir"o povo dos filhos de Israel"? A décima sétima dinastia dos hicsos4 também era de origem estrangeira, como os hebreus, de modo que provavelmente simpatizavam com Israel. No entanto, a décima oitava dinastia era egípcia, e seus governantes expulsaram os estrangeiros da terra do Egito. Pode ter sido nessa dinastia que começou a perseguição ao povo de Israel.
Por que os egípcios desejavam tornar a vida dos hebreus tão infeliz? Israel era uma fonte de bênçãos para a terra, como José havia sido antes deles (Gn 39:1-6), e não estava causando problemas. De acordo com a razão apresentada pelo Faraó, a presença de tantos hebreus era um risco para a segurança nacional, uma vez que eram estrangeiros e, se houvesse uma invasão, sem dúvida se tornariam aliados dos inimigos. No entanto, quer o Faraó percebesse quer não, a verdadeira causa do conflito anunciado em Gênesis 3:15 era a inimizade entre o povo de DEUS e os filhos de Satanás, conflito que persiste no mundo de hoje.
Não encontramos nos registros da história nenhum povo que tenha sofrido tanto quanto os judeus, mas toda a nação ou governante que perseguiu o povo de DEUS foi castigada por isso. Afinal, DEUS havia prometido a Abraão:"Abençoarei os que te abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem "(Gn 12:3). DEUS cumpriu essa promessa na forma como tratou com o Egito e a Babilônia na antiguidade e com Stalin e Hitler nos tempos modernos. DEUS é longânimo ao observar as nações que perseguem seu povo escolhido, mas chega a hora em que sua mão de julgamento pesa sobre os opressores.
Os capatazes egípcios,"com tirania, faziam servir os filhos de Israel "(Êx 1:13), obrigando os escravos hebreus a construir cidades e trabalhar nos campos. Mas a bênção de DEUS fez com que o povo de Israel continuasse a se multiplicar, o que assustou e irou ainda mais seus dominadores egípcios. Era preciso fazer alguma coisa para manter Israel sob controle.
WIERSBE. Warren W. Comentário Bíblico Expositivo. A.T. Vol. I. Editora Central Gospel. pag. 234-235.
Crueldade engendrada (1.11,13,14). A sabedoria mundana sabe inventar métodos cruéis. O rei queria debilitar o poder dos israelitas, quebrando-lhes a vontade como grupo e levando-os a se tornar como os egípcios. De acordo com avaliações posteriores (Js 24.14; Ez 20.7-9), alguns israelitas fizeram exatamente isso. Sob circunstâncias normais, tais métodos teriam cumprido o desígnio do rei.
Os maiorais de tributos (11) eram supervisores gerais cujos métodos tiranos eram famosos. Provavelmente alguns desses chefes de serviços fossem israelitas (5.14). "Há [...] lugar para pensar que eles os faziam trabalhar desumanamente e, ao mesmo tempo, os obrigava a lhes pagar exorbitante tributo.”5 Cidades de tesouros eram "cidades armazéns” onde eram armazenados provisões e armamentos.
As tarefas para os israelitas ficaram muito amargas com dura servidão (14). Pelo visto, o trabalho no campo refere-se a projetos de irrigação ou ao cuidado dos rebanhos do governo, ou possivelmente a levar tijolos para os lugares de construção. A escravidão era tão cruel quanto o homem podia torná-la sem infligir a morte.
Leo G. Cox. Comentário Bíblico Beacon. Editora CPAD. Vol. 1. pag. 142.
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