II - A
INDUMENTÁRIA DO SACERDOTE
1. A túnica
de linho e o éfode (Êx 28.4-28).
A
Indumentária do Sacerdote
Duas coisas
chamam a atenção de início no texto bíblico que fala das
vestes dos sacerdotes. Em primeiro lugar, quem confeccionou
essas vestimentas não foram quaisquer alfaiates em Israel. O
texto bíblico afirma que foram homens “sábios de coração”, a
quem DEUS havia “enchido do ESPÍRITO de Sabedoria” (Ex
28.3). Como frisa o Comentário Bíblico Beacon, “DEUS, que
criou a beleza, dá ao homem a apreciação divina pela beleza
e a aptidão divina para criá-la. Certas produções que o
mundo chama arte não passam de imoralidade, mas a verdadeira
arte é de DEUS”.
Em segundo
lugar, o propósito da indumentária sacerdotal era
“santificar”, isto é, distinguir, destacar, honrar os sumos
sacerdotes, dar-lhes ornamentação, beleza e glória diante do
povo; enfim, enfatizar o significado e a importância do seu
ofício perante todos. Suas vestes foram pensadas para
refletir a dignidade do seu ofício.
Os materiais
para fazer as vestes sacerdotais eram os mesmos das cortinas
e do véu do Tabernáculo (Ex 26.1,31,32; 28.5,6). Ou seja, o
sacerdote não poderia ministrar “com roupas simples e sem
brilho” em um Tabernáculo que era “graciosamente colorido”.
DEUS, “o Autor de tudo o que é bom e bonito, deseja que seu
povo seja formoso e que haja beleza nos procedimentos de
adoração”.
Como observa
Matthew Henry,
Estas
gloriosas vestes foram indicadas:
(1) para que os próprios
sacerdotes pudessem ser lembrados da dignidade da sua função
e pudessem comportar-se com o devido decoro;
(2) para que o
povo pudesse ser imbuído de uma santa reverência com relação
ao DEUS cujos ministros se apresentavam com tal grandeza;
(3) para que os
sacerdotes pudessem ser um exemplo de CRISTO, que se
ofereceu imaculado a DEUS, e de todos os cristãos, que têm a
beleza da santidade conferida a si, na qual são consagrados
a DEUS.
Henry lembra
ainda que “o nosso adorno agora, sob o evangelho, tanto o
dos ministros quanto o de todos os cristãos, não deve ser de
ouro ou pérolas, nem custoso, mas deve ser composto das
vestes da salvação e do manto da justiça (Is 61.10; SI
132.9,16)”.
Assim como
as vestes sujas do sumo sacerdote Josué, na visão do profeta
Zacarias, representavam a sua iniquidade (Zc 3.3,4), as
vestes santas dos sumos sacerdotes representavam a pureza e
a perfeição de CRISTO como o nosso Sumo Sacerdote definitivo
e por excelência (Hb 7.26).
Havia quatro
vestes que eram comuns aos sacerdotes e ao sumo sacerdote:
Os calções
de linho, que serviam para cobrir as partes íntimas e as
coxas do sacerdote (Êx 28.42);
O manto ou
túnica de linho (Êx 28.39,40);
O cinturão
de linho, com bordados e usado para prender as roupas (Êx
28.39,40);
As tiras
para a cabeça, isto é, para o turbante (Êx 28.37,40).
O linho fino
utilizado na confecção dessas peças era um símbolo de
pureza. Mas, além dessas quatro peças básicas, havia outras
quatro que eram usadas apenas pelo sumo sacerdote:
1. O éfode
com um cinturão diferenciado (Êx 28.6-14). Ele consistia em
um colete com as partes da frente e de trás unidas por
tiras
sobre cada ombro e por um cinturão à altura da cintura. Esse
cinturão era colorido e habilmente tecido (“De obra
esmerada”, Êx 28.6) conforme a criatividade que DEUS dera
aos sábios que confeccionariam as vestes (Êx 28.3). Nas
tiras sobre os ombros, havia duas pedras sardônicas, uma de
cada lado, trazendo o nome das doze tribos de Israel — seis
nomes em uma pedra e os outros seis nomes na outra (Êx
28.9,10). O texto bíblico diz que a ordem dos nomes era
“segundo as suas gerações” (Êx 28.10), o que significa dizer
que a disposição dos nomes nas pedras obedecia à ordem de
nascimento dos doze filhos de Israel que davam nome às
tribos. Esses nomes deveriam ser engastados — isto é,
encravados — em ouro nas pedras e esses filigranas de ouro
deveriam ser colocados, mais precisamente, ao redor das
pedras, em seu entorno (Êx 28.11). Finalmente, havia ainda
os engastes de ouro (fechos ou prendedores) e as correntes
de ouro, que provavelmente serviam para firmar o peitoral ao
éfode (Êx 28.13,14,22-26). O fato de o sumo sacerdote levar
o nome das doze tribos nos ombros tinha um significado
claro: o sumo sacerdote, como intercessor entre o povo e
DEUS, levava em seus ombros o povo. Essa grande
responsabilidade, que era a essência do seu ofício, ele não
deveria nunca esquecer (Êx 28.12). O propósito divino era
que, cada vez que o sumo sacerdote vestisse o éfode, se
lembrasse disso.
2. O
peitoral do juízo (Êx 28.15-30), que era feito do mesmo
material do éfode. Também era “obra esmerada” (Êx 28.15). A
designação “do juízo” dada ao peitoral era uma referência,
sem dúvida, ao “Urim e Tumim”, uma peça muito importante
dessa indumentária. Essas palavras significam “luz e
perfeição” e, provavelmente, era o nome dado a dois objetos,
talvez duas pedras, que eram trazidas pelo sumo sacerdote no
peitoral de sua roupa cerimonial (Êx 28.30). Através da
consulta ao “Urim e Tumim”, o sumo sacerdote tomava
conhecimento da vontade divina em situações muito difíceis
(Êx 29.10; Nm 16.40; 27.21; Ed 2.63).
Havia ainda
no peitoral quatro fileiras de pedras preciosas contendo
três pedras cada uma (doze pedras ao todo). O nome das doze
tribos de Israel também era gravado nessas pedras, sendo uma
pedra para cada nome (Êx 28.21). O significado aqui também é
claro: o intercessor deveria ter em seu coração o povo por
quem intercedia (Ex 28.29). Isso fala de compaixão e amor do
intercessor pelos intercedidos. CRISTO, o nosso Sumo
Sacerdote e perfeito intercessor entre DEUS e os homens, nos
amou até o fim (1 Tm 2.5; Jo 13.1; 17.9,20-26).
O peitoral
era unido ao éfode por peças de ouro (engastes e anéis) na
parte de cima, conectadas às tiras dos ombros do éfode, e na
parte de baixo, conectadas ao cinturão do éfode (Ex
28.13,14,22-28).
3. O manto
do éfode, com suas campainhas e com romãs nas bordas (Ex
28.31-35). Esse manto, diferente do manto de linho, ia até
os joelhos e tinha nas bordas um material que se supõe ser
uma espécie de “cota de malha” para não se romper (Ex
28.32). Ele era uma peça única, sem emendas e com abertura
para a cabeça. Não tinha mangas, era de cor azul (Ex 28.31)
e usado debaixo do éfode e do peitoral. Nas bordas,
alternavam-se romãs bordadas e com cores diferentes cada uma
e campainhas de ouro — uma romã, depois uma campainha; outra
romã, depois outra campainha, e assim sucessivamente (Êx
28.33,34).
As romãs
significavam alimento, fertilidade e alegria, provavelmente
alegria no serviço a DEUS. Já os sinos eram para que se
ouvisse o sonido do sumo sacerdote quando andava. Elas
chamavam a atenção das pessoas para a atividade do sumo
sacerdote lá dentro, que deveria sempre estar movimentando
as campainhas. O texto bíblico afirma que se o sumo
sacerdote não movimentasse as campainhas enquanto estivesse
lá dentro, perante o Senhor, ele morreria (Êx 28.35). Ou
seja, quando o som parava, era porque o sumo sacerdote,
achado em falta diante do Senhor, havia morrido lá dentro. O
sonido constante dessas campainhas, chamando
a
atenção do povo para o que estava acontecendo, falam que a
verdadeira adoração não deveria se tornar uma mera
formalidade para o povo. Os israelitas deveriam estar
atentos e voltados para tudo que estava acontecendo ali, no
Santuário. Não poderiam estar, como dizemos hoje,
“desligados” do culto, mas “sintonizados” e envolvidos com
tudo o que está acontecendo. Ora, ainda hoje DEUS deseja o
nosso envolvimento total no culto de adoração a Ele (SI
29.9; 51.16,17; 103.1; Jo 4.24; Rm 12.1; Hb 10.19-23;
13.15).
4. A lâmina
de ouro à sua testa (Êx 28.36-38) era usada na frente da
mitra sacerdotal, isto é, do turbante (Êx 28.37). Nessa
lâmina, estava gravado: “Santidade ao Senhor” (Êx 28.36). O
significado da
lâmina com esses dizeres é explicitado no texto bíblico:
DEUS queria que o povo se lembrasse dos seus pecados e da
necessidade de serem santos, o que era evidenciado todas as
vezes que o sacerdote adentrava o Santuário para levar “a
iniquidade das coisas santas”, isto é, executar a expiação
pela culpa do povo (Êx 28.38).
Quando
entrarmos na presença de DEUS, devemos nos lembrar que somos
pecadores e Ele é SANTO; que é pelo sacrifício de CRISTO, o
nosso Sumo Sacerdote, que podemos entrar com confiança na
presença do Senhor; e que devemos viver uma vida santa. Sede
santos “em toda a vossa maneira de viver” (1 Pe 1.15; Lv
11.44).
COELHO,
Alexandre; DANIEL, Silas. Uma Jornada de Fé. Moisés, o
Êxodo e o Caminho a Terra Prometida. Editora CPAD. pag.
132-126.
O Éfode e as
Pedras Preciosas
As vestes representam as
diversas funções e atributos do cargo sacerdotal. O "éfode"
era o manto sacerdotal, e estando inseparavelmente ligado às
ombreiras e ao peitoral, ensina-nos, claramente, que a força
dos ombros do sacerdote e o afeto do seu coração estavam
inteiramente consagrados aos interesses daqueles que
representava, e a favor dos quais levava o éfode.
Quão
animador é para os filhos de DEUS, que são provados,
tentados, zurzidos e humilhados, pensar que DEUS os vê sobre
o coração de JESUS! Perante os Seus olhos, eles brilham
sempre em todo o fulgor de CRISTO, revestidos de toda a
graça divina. O mundo não pode vê-los assim; mas DEUS vê-os
desta maneira, em isto está toda a diferença. Os homens, ao
considerarem os filhos de DEUS, veem apenas as suas
imperfeições e defeitos, porque são incapazes de ver
qualquer coisa mais; de sorte que o seu juízo é sempre falso
e parcial. Não podem ver as joias brilhantes com os nomes
dos remidos gravados pela mão do amor imutável de DEUS.
Mas, graças
a DEUS, não temos que ser julgados pelos homens, mas por Ele
Próprio: e misericordiosamente mostra-nos o nosso sumo
sacerdote levando o nosso juízo sobre o seu coração diante
do Senhor continuamente (versículo 30). Nada tínhamos senão trevas,
tristeza, e deformidades; mas DEUS deu-nos brilho, pureza e
beleza. A Ele seja dado o louvor pelos séculos dos séculos!
Êx 28.6 A
estola sacerdotal. No hebraico, ephod, palavra que significa
“cobertura”. Há um artigo detalhado a esse respeito, no
Dicionário, intitulado Estola. Os sacerdotes
levíticos usavam estolas de linho, mas o sumo sacerdote
dispunha de estolas bordadas em ouro, azul, púrpura e
carmesim. Uma estola especial era usada quando dos
pronunciamentos do sumo sacerdote, em seus oráculos. Essa
estola ficava pendurada no interior do templo (I Sam. 21.9).
Alguns
estudiosos supõem que o ephod foi a mais antiga das vestes
sacerdotais. Naturalmente, havia um uso anterior ao
tabernáculo.
Os Nomes por
Ordem de Nascimento: Uma das duas pedras de ônix continha os
nomes: Rúben, Simeão, Levi, Judá, Dã e Naftali. E a outra
continha os nomes: Gade, Aser, Issacar, Zebulom, José e
Benjamim.
No hebraico,
a palavra para “peitoral” é hoshen, termo que significa
objeto belo. Portanto, tanto na construção do tabernáculo
quanto em tudo quanto dizia respeito ao mesmo, predominava o
senso estético. O peitoral atuava como bolsinha para o Urim
e o Tumim, sendo essa a sua principal finalidade. Por isso
mesmo, há estudiosos que pensam que o peitoral era uma
espécie de algibeira, embora também tivesse usos simbólicos,
conforme já mencionei.
A função das
pedras era a mesma: relembrar o sumo sacerdote do povo ao
qual servia, ao entrar no Santo dos Santos. Cf. isso com Apo. 21.19,20 onde há uma lista
similar de pedras preciosas, que faziam parte da amamentação
dos alicerces da Nova Jerusalém. Cf. também a lista de
pedras preciosas em Ezequiel 28.13.
Os
antigos não dispunham de ferra- mentas capazes de trabalhar
devidamente com as pedras preciosas de maior dureza, embora
soubessem lapidar e gravar bem pedras de menor dureza. No
entanto, a arqueologia tem achado jóias feitas até mesmo com
as pedras preciosas de maior dureza. A despeito disso,
permanece de pé o problema de identificação.
Êx 28.29
Arão levará os nomes dos filhos de Israel... sobre o seu
coração. Estava em pauta um serviço eminentemente
espiritual. Arão era o representante de Israel diante de
DEUS, e nunca deveria olvidar-se do fato, em sua mente e em
seu coração. As palavras “sobre o seu coração” aparecem por
três vezes, não meramente para fornecer-nos uma
localização, mas também um sentimento. Arão deveria fazer
seu trabalho de todo o coração. Os sacerdotes operavam como
intermediários, como intercessores e como mestres. Há informes de que Charles Spurgeon conhecia por nome cada
membro de sua vasta congregação, e que tinha tal
conhecimento porque sempre procurava manter contato com os
mesmos. Ele era um pastor de ovelhas.
CHAMPLIN,
Russell Norman, Antigo Testamento Interpretado versículo por
versículo. Editora Hagnos. pag. 429-432.
15. O
peitoral do juízo.
Peitoral é
pura especulação para o termo hebraico fyõSen. Se a tradução
for correta, Noth cita um paralelo impressionante em Biblos,
na Idade do Bronze. Trata-se de uma placa de ouro, engastada
com jóias, presa por uma corrente de ouro. Aparentemente
servia de adorno para o tórax de um rei local. Excetuando-se
o fato de que o peitoral israelita era feito de pano, não de
metal, e era duplo (formando uma espécie de bolsa para as
pedras com as quais se lançavam sortes), a semelhança é
notável. Basicamente, a ideia é bem simples: o sacerdote
levava os objetos preciosos (fossem eles o que fossem) numa
pequena bolsa amarrada a seu pescoço: esta bolsa, por sua
vez, é apropriadamente adornada com os símbolos das tribos
de Israel.
30. O Urim e
o Tumim. Isto explica porque esta peça do vestuário
sacerdotal era chamada de “peitoral do juízo”, uma vez que
continha as duas pedras oraculares, pelas quais o “juízo” de
DEUS podia ser conhecido.
Seus nomes
significam “luzes e perfeição”, que se tomados literalmente,
podem ser uma referência à natureza do DEUS cuja vontade
elas revelavam. Podem, entretanto, ter sido usadas no
sentido de “alfa e ômega” , princípio e fim(Ap 1:8), já que
os dois nomes começam respectivamente com a primeira e a
última letras do alfabeto hebraico. Estas “sortes” sagradas
eram usadas para discernir a orientação divina, normalmente
com respostas do tipo “sim” e “não” : o exemplo mais claro é
o caso da indagação de Saul (1 Sm 14:41). Sua natureza é bem incerta: a sugestão mais provável é a de duas pedras
preciosas, mas a maneira em que eram usadas não é clara. A
julgar de analogias mais recentes, uma das pedras era
retirada (ou lançada fora) do peitoral, e a resposta “sim”
ou “não” dependeria de qual pedra aparecesse. Não há
evidência bíblica para o uso deste método de se obter
orientação depois do tempo de Davi, mas presumivelmente os
sacerdotes continuaram a usar o peitoral do juízo, devido ao
conservadorismo inerente a todas as religiões. O sistema de
“lançar sortes” depois de orar, como meio de obter
orientação reaparece em Atos 1:26.
Talvez valha
a pena observar que o oferecer sacrifícios não era, de
maneira alguma, a única função do sacerdote israelita. Como
observa Driver, a ele também cabia dar “torah” ou instrução
(Dt 33:10), decidir por meio de Urim e Tumim (como aqui), e
oferecer decisões judiciais “perante DEUS” no santuário
(22:8,9). Além do mais, Urim e Tumim não eram a única
maneira aceitável de se pedir a direção divina, mesmo no
começo da história de Israel (1 Sm 28:15). Podemos presumir
que, à medida que crescia a atividade profética em Israel, a
necessidade de se recorrer a tais meios “mecânicos” de
orientação diminuiu. Na Nova Aliança, não é por acaso que,
depois da vinda do ESPÍRITO (Atos 2), o uso de “sortes” não
mais acontece. DEUS guia Seu povo diretamente.
R. Alan
Cole, Ph. D. ÊXODO Introdução e Comentário. Editora Vida
Nova. pag. 193-195.
Êx 28.30 O
Urim e o Tumim. Há um artigo detalhado sobre essas pedras
(ou o que quer que elas tenham sido) no Dicionário. Há
muitas opiniões quanto à natureza desses objetos e quanto à
sua utilidade. Talvez a Oxford Annotated Bible (in Ioc.)
esteja com a razão ao dizer apenas que eram sortes por meio
das quais o sumo sacerdote (ao lançá-las) tomava decisões
oraculares. Portanto, serviriam de meios de oráculo, mediante os quais o sumo sacerdote obtinha decisões ou
informações, conforme vemos em Núm. 27.21; Deu. 33.8 e I
Sam. 28.6.
Tipos. Visto
que temos à nossa frente um modo de iluminação espiritual, o
Urim e o Tumim simbolizavam a luz que nos é conferida pelo
ESPÍRITO de DEUS, o Grande revelador.
CHAMPLIN,
Russell Norman, Antigo Testamento Interpretado versículo por
versículo. Editora Hagnos. pag. 432.
O Urim e o
Tumim, por cujo intermédio à vontade de DEUS era conhecida
em casos duvidosos, foram colocados neste peitoral, que é,
por isto, chamado de peitoral do juízo, v. 30.
Urim e Tumim
significam luz e perfeição. O
governo era uma teocracia; DEUS era o seu Rei, o sumo
sacerdote era, depois de DEUS, o seu governante, e o Urim e
o Tumim eram o seu ministério ou gabinete. Provavelmente
Moisés escreveu sobre o peitoral, ou teceu ali, as palavras
Urim e Tumim, para indicar que o sumo sacerdote, ao vestir
este peitoral, e ao pedir conselho a DEUS em qualquer
emergência relacionada ao público, fosse instruído a tomar
tais medidas e a dar o conselho que DEUS reconhecesse. Finéias,
Juízes 20.27,28. Abiatar quando buscou ao Senhor, por Davi
(1 Sm 23.6ss.). Josué o consultou (Nm 27.21). Eles
foram perdidos no cativeiro, e nunca foram recuperados,
embora, aparentemente, fossem esperados, Esdras 2.63. DEUS, nestes últimos
dias, nos dá a conhecer, a si mesmo, e à sua vontade,
Hebreus 1.2; João 1.18. A união do peitoral ao éfode indica que o
trabalho profético de CRISTO se baseava no seu sacerdócio. E
pelo mérito da sua morte Ele resgatou esta honra para si
mesmo, e este favor, para nós. O Cordeiro que tinha sido
morto é que era digno de tomar o livro e abrir os selos,
Apocalipse 5.9.
HENRY.
Matthew. Comentário Matthew Henry Antigo Testamento Gênesis
a Deuteronômio. Editora CPAD. pag. 318.
III -
MINISTROS DE CRISTO PARA A IGREJA
1. Chamados
por DEUS.
O chamado de
DEUS para o ministério vocacional é diferente do chamado à
salvação e do chamado que atinge todos os crentes: o
serviço. Trata-se de uma convocação de homens selecionados
para servir como líderes da igreja. Os destinatários desse
chamado precisam ter a certeza de que DEUS assim os escolhe
para liderar. A concretização desse fato repousa sobre
quatro critérios, o primeiro dos quais é uma confirmação
deste chamado por outras pessoas e por DEUS, pelas
circunstâncias através das quais Ele providencia um lugar
para o ministério. O segundo critério é a posse das
habilidades necessárias ao serviço em posições de liderança.
O terceiro consiste em um profundo desejo de servir no
ministério. A qualificação final é um estilo de vida
caracterizado por integridade moral. Um homem que preencha
esses quatro requisitos pode descansar na certeza de que
DEUS o chamou para a liderança cristã vocacionada.
O chamado de
DEUS para o ministério vocacional possui dimensões
diferentes.
Em primeiro
lugar, está o chamado à salvação. Esse precisa ser o ponto
de partida de qualquer chamado ao serviço ou ministério. A
pessoa que deseja identificar seu chamado ao ministério
vocacional deve primeiro certificar-se de que é chamada por
CRISTO (2 Co 13.5). Não se deve ter a ousadia de cogitar um
ministério do Evangelho da graça ao povo de DEUS, sem antes
experimentar esta graça por meio da fé salvadora em JESUS
CRISTO.
O chamado à
salvação também envolve um chamado ao serviço (Ef 2.10).
DEUS não nos chamou apenas à salvação, mas a uma vida
de serviço. Servir é privilégio e obrigação de todos os
cristãos. Esse chamado ao serviço implica que nós, como
cristãos, constituímos “o sacerdócio real” (1 Pe 2.9). Nosso
privilégio é anunciar as virtudes daquEle que nos chamou das
trevas para a sua maravilhosa luz (1 Pe 2.9). Kãsemann o vê
como uma referência ao fato de que aquele que provou
pessoalmente o poder gracioso de DEUS tem a responsabilidade
de reconhecer esta experiência publicamente. Assim, todos os
crentes devem se engajar no ministério do serviço como
sacerdotes do Senhor. Para cumprir esse ministério, devem
possuir o ESPÍRITO SANTO, o qual lhes concede habilidades
espirituais (1 Co 12.11). Esses dons espirituais expressam o
propósito de servir para o bem comum da igreja (1 Co 12.7).
O apóstolo Paulo escreveu aos efésios: “Mas a graça foi dada
a cada um de nós segundo a medida do dom de CRISTO” (Ef
4.7). Esses dons estão alistados em 1 Coríntios
12.8-10,28-30, e Romanos 12.6-8. Os cristãos são mordomos
desses dons e vão prestar contas de sua mordomia (1 Pe
4.10).
Além de
chamar os cristãos ao uso de seus dons espirituais, DEUS
estende esse chamado ao ministério vocacional de liderança.
Conscientes de que todo crente deve se envolver na obra do
Senhor, vamos usar o termo ministério no presente contexto
para nos referir a um tipo específico de serviço prestado à
igreja por um grupo particular de líderes.
O chamado
para a liderança implica homens dotados e concedidos à
igreja pelo Senhor da Igreja (Ef 4.12). Essa
responsabilidade é tanto geral – exercer liderança em
adoração, pregação, ensino, pastorado e evangelização – como
específica - disciplina e aconselhamento.
DEUS usou
Charles Haddon Spurgeon de modo grandioso no final do século
XIX. Ele pregou para milhares de pessoas semanalmente em
Londres, no Metropolitan Tabernacle. Além de sua forte
paixão pela pregação, ele possuía um grande desejo de
desenvolver jovens para o ministério. Esse anseio fez com
que instituísse a “Faculdade de Pastores”, como parte do
ministério da igreja.
Seu livro
Lições aos Meus Alunos, uma compilação de preleções
realizadas nessa faculdade, fornece uma ideia precisa da
seriedade do chamado para o ministério vocacional. Nas
primeiras páginas de seu livro, ele pergunta:
Como pode o
jovem saber se é vocacionado ou não. É uma indagação
ponderável, logo desejo tratá-la aqui mui solenemente. Oh, a
divina orientação para fazê-lo! O fato de que centenas
perderam o rumo e tropeçaram em um púlpito está patenteado
tristemente nos ministérios infrutíferos e nas igrejas
decadentes que nos cercam. Errar na vocação é terrível
calamidade para o homem e para a igreja sobre a qual ele se
impõe, seu erro envolve aflição das mais dolorosas.
Spurgeon
continua salientando a importância de reconhecer o chamado
quando afirma: “É-lhe imperativo que não entre no ministério
enquanto não fizer profunda sondagem e prova de si próprio
quanto a esse ponto”.
William
Gordon Blaikie também ministrou em Londres quase na mesma
época que Spurgeon. Ele também viu a importância do chamado
para o ministério e apresentou seis critérios para
avaliá-lo: salvação desejo de servir, de viver uma vida que
contribua para o serviço, capacidade intelectual, aptidão
física e elementos sociais.
Calvino
dividiu o chamado em duas partes ao declarar: “Para que
alguém seja considerado verdadeiro ministro da igreja, é
necessário que considere o ‘objetivo ou o exterior’ dela e o
chamado secreto, interior, de que ‘só o próprio ministério
tem consciência’”.
Oden conclui
seu artigo “O Chamado para o Ministério com uma discussão
acerca da correspondência entre os aspectos internos e
externos do chamado: O chamado interno é uma consequência do
contínuo poder de direção ou de evocação do ESPÍRITO SANTO
que, a seu tempo, conduz o indivíduo para perto do chamado
externo da igreja, ou seja, para o ministério. O chamado
externo é um ato da comunidade cristã que, pelo devido
processo, confirma aquele chamado interno. Ninguém pode
cumprir o difícil papel de pastor adequadamente se não for
chamado e comissionado por CRISTO e pela Igreja. Esse é o
motivo pelo qual é tão crucial, tanto para o candidato como
para a igreja, que a correspondência entre o chamado interno
e o externo se estabeleça desde o início com clareza
razoável.
Por que é
tão necessário que experimentemos uma compulsão interna e
externa para o ministério? Em seu volume clássico sobre
ministério, Bridges expõe os motivos pelos quais um chamado
é tão importante:
A labuta no
escuro, sem uma comissão segura, tolda em muito a garantia
da fé nos compromissos divinos; e o ministro, incapaz de se
valer do apoio celestial, sente em seu trabalho “as mãos
caídas e os joelhos fracos”. Por outro lado, a confiança de
que está agindo em obediência ao chamado de DEUS e de que
Ele está em seu trabalho e em seu caminho, encoraja-o nas
dificuldades, conscientizando-o das obrigações pelas quais
deve responder com força onipotente.
Como Bridges
declarou eloquentemente, o problema está no homem e em sua
confiança em DEUS. O homem confia que DEUS o comissionou
para uma tarefa que apenas o poder de DEUS pode manter.
Criswell fala dessa confiança: ‘A primeira e a maior de
todas as fortalezas do pastor é a convicção profunda, como a
própria vida, de que DEUS o chamou para o ministério. Se
essa persuasão for inabalável, todos os outros elementos de
sua vida distribuir-se-ão em bela ordem e lugar”.
Respondendo
à pergunta: “Qual a importância da certeza de um chamado
especial?”, Sugden e Wiersbe afirmam: ‘A obra do ministério
é muito desgastante, sendo difícil para um homem entrar nela
sem uma consciência do chamado divino. Em geral, os homens
entram e depois saem do ministério, pois lhes falta uma
consciência da urgência divina. Apenas um chamado definido
por DEUS pode dar a alguém sucesso no ministério”.
Como os
profetas do Antigo Testamento, os ministros de hoje falam
das coisas de DEUS sob constantes ataques e pressões. Lutzer,
referindo-se às dificuldades do ministério, afirma:
Não vejo
como alguém possa sobreviver no ministério, caso sinta que
essa foi sua própria escolha. Alguns ministros não têm
sequer dois dias agradáveis.
Eles são
sustentados pelo conhecimento de que DEUS os colocou onde
estão. Os ministros sem essa convicção carecem muitas vezes
de coragem e carregam uma carta de demissão no bolso do
paletó. Ao menor sinal de dificuldade, vão-se embora.
Crendo como
esses homens, na importância do chamado ministerial,
apresento quatro perguntas que podem ser utilizadas para
avaliar esta convocação.
Quatro
palavras resumem quatro passos específicos: confirmação,
habilidades, anseios e vida.
HÁ
Confirmação?
A
confirmação pode ser divina e de outros.
Confirmação
de Outros
Em Atos
16.1,2, compreende-se a importância do reconhecimento
público na confirmação do chamado para o ministério e
liderança. Timóteo foi, provavelmente, um convertido de
Paulo em sua primeira viagem missionária (veja At 14.6).
Paulo o chamou de “meu verdadeiro filho na fé” (1 Tm 1.2).
Ao iniciar a segunda viagem missionária, Paulo passou pelas
regiões que havia visitado em sua primeira viagem,
“confirmando as igrejas” (At 15.41). Ele chegou à cidade de
Timóteo e descobriu que este possuía bom testemunho dos
irmãos que estavam em Listra e em Icônio (At 16.2). A
conseqüência foi: “Paulo quis que Timóteo fosse com ele” (At
16.3). A confirmação pública de Timóteo transformou-o em uma
aquisição desejável para a equipe missionária de Paulo. Mais
tarde, quando Paulo escreveu a Timóteo, ele o lembrou de sua
confirmação pública, referindo-se à “imposição das mãos do
presbitério” (1 Tm 4.14). Tanto Paulo como os líderes da
comunidade local haviam visto como DEUS abençoou e usou
Timóteo no serviço local. Assim, ele foi reconhecido e
comissionado para servir a DEUS no ministério internacional.
Spurgeon
concorda que a confirmação pública é um passo necessário
depois do sentimento interior, estando relacionada ao
chamado para o ministério. Ele conclui: ‘A vontade do Senhor
referente aos pastores é conhecida mediante o piedoso
julgamento da igreja. É necessário, como prova de seu dom,
que sua pregação seja aceitável ao povo de DEUS. Muitos
homens que sentem a compulsão interior para entrar no
ministério hesitam em submeter este sentimento à confirmação
da igreja. Por alguma razão, não confiam na igreja quanto a
essa área importante de sua vida. Spurgeon disse aos seus
alunos:
Muitas
igrejas julgam segundo a carne, nem todas as igrejas são
sábias, nem todas julgam no poder do ESPÍRITO SANTO. Apesar
disso, estaria mais pronto para aceitar a opinião de um
grupo do povo do Senhor do que a minha própria opinião sobre
um assunto tão pessoal como os meus dons e graças. De
qualquer forma, quer valorizem o veredicto da igreja, quer
não, uma coisa é certa: nenhum de vocês pode ser pastor sem
o amoroso consentimento do rebanho. Portanto, este lhes
servirá de indicador prático, senão correto.
Bridges
também nos aconselha sabiamente quando comenta opiniões,
especialmente de amigos e ministros experientes: “[Eles]...
podem ser úteis para garantir se o desejo de trabalhar é ou
não um impulso do sentimento e não um princípio, ou mesmo se
a capacitação não é uma presunção enganosa”.
A Bíblia
fala muito de buscar orientação e conselhos sábios. Os
Provérbios são especialmente excelentes nesta área: “Não
havendo sábia direção, o povo cai, mas, na multidão de
conselheiros, há segurança” (11.14); “O caminho do tolo é
reto aos seus olhos, mas o que dá ouvidos ao conselho é
sábio” (12.15); “Da soberba só provém a contenda, mas com os
que se aconselham se acha a sabedoria” (13.10); “Onde não há
conselho os projetos saem vãos, mas, com a multidão de
conselheiros, se confirmarão” (15.22).
Além disso,
o conselho e a orientação dos outros constituem o
procedimento para a ordenação, que é o processo de
reconhecimento público da pessoa separada para o ministério
(veja o capítulo 8, “A Ordenação para o Ministério
Pastoral”). A Bíblia indica que a Igreja Primitiva tinha um
processo específico pelo qual um grupo de crentes escolhia e
separava os líderes para o serviço. A instrução de Paulo
para que Tito destacasse presbíteros (Tt 1.5) exemplifica
uma série de passagens que insinua a ideia de um processo de
ordenação. A base para a indicação era o reconhecimento de
homens qualificados em cada uma das cidades. Uma boa
definição de ordenação é a confirmação pública de uma
qualificação ou dotação interior, isto é, da formação e
experiência no ministério.
Embora a
pessoa ordenada não seja diferente dos outros membros da
congregação, a ordenação pública proporciona uma confirmação
visível de que DEUS chamou um indivíduo para usar suas
habilidades e dons singulares em benefício de toda a igreja.
Confirmação
de DEUS - Newton encontrou três indicações do chamado para o
ministério: desejo, competência e providência de DEUS. Ele
denominou a terceira indicação de “uma correspondente
abertura na providência, mediante uma série gradativa de
circunstâncias que apontam para os meios, o lugar e o
momento de entrar de fato no trabalho”. Esse fator cobre
tudo o que discutimos até aqui. A soberania de DEUS convoca
certos homens à liderança na igreja local. DEUS lhes concede
os dons para que desempenhem suas funções ministeriais,
tornando-os desejosos deste serviço e preparando
circunstâncias para prover-lhes o lugar no ministério.
Tudo isso
refere-se a portas abertas e bênçãos de DEUS. Paulo disse em
1 Coríntios 16.8,9: “Ficarei, porém, em Éfeso até ao
Pentecostes; porque uma porta grande e eficaz se me abriu”.
Ele, então, contrapõe os obstáculos à oportunidade:
“E há muitos
adversários”.
Esses
adversários são um elemento constante no ministério e, às
vezes, causam frustrações e limitam os resultados. Mas os
resultados não são o indicador final das bênçãos de DEUS.
Muitos têm labutado durante todo o ministério, alcançando
pouco ou nenhum fruto visível. Jeremias profetizou por mais
de 40 anos (Jr 1.2,3), obtendo pouca ou nenhuma reação do
povo. Adoniram labutou sete anos na Birmânia antes de ter
seu primeiro convertida porém ainda via a mão da providência
de DEUS em seu ministério. A carreira ministerial nunca é
fácil e os resultados nem sempre são positivos, mas uma
consciência de que DEUS confirma o trabalho deve estar
sempre presente.
Além de
perguntar se há confirmação de DEUS, o homem que deseja
saber se é chamado precisa fazer várias perguntas práticas:
Os outros
confirmam meus dons e minha capacidade de liderança?
Eles me
pedem que atue em uma função de líder?
Eles me
pedem que comunique as verdades de DEUS por meio do ensino
ou da pregação?
Essas são as
pessoas que me sugerem pensar no ministério?
As respostas
a essas perguntas só surgem em meio a um envolvimento ativo
no ministério de uma igreja local. Para receber confirmação
pública, é preciso que haja ministério público. Esse
ministério implica o uso dos dons e das habilidades que as
pessoas possam identificar, ajudar a desenvolver e
incentivar.
Sem essas
capacidades, faltará confirmação. Assim, as habilidades são
uma parte importante no processo de determinação do chamado.
HÁ um
Anseio?
Em 1 Timóteo
3.1, o apóstolo Paulo escreve: “Se alguém deseja o
episcopado, excelente obra deseja”. A palavra traduzida por
“deseja” (oregomai), que ocorre apenas três vezes no Novo
Testamento. Este termo significa “distender-se para tocar ou
pegar algo, buscar ou desejá-lo”. É o retrato de um atleta
acelerando os passos para cruzar a linha de chegada. Esse
vocábulo também aparece em 1 Timóteo 6.10, onde é traduzido
por “cobiça” relacionada ao dinheiro, a este se devota tanto
amor que passa a ser a própria raiz de “toda espécie de
males”. O terceiro uso está em Hebreus 11.16, em que é
traduzido por “desejar”, frase na qual o objeto do desejo é
a “pátria celestial”.
Assim, cada
contexto determina a legitimidade da distensão e da busca.
A segunda
palavra que fala da compulsão interna em 1 Timóteo 3.1 é (epithumeõ),
verbo que significa “colocar o coração, desejar, cobiçar,
ambicionar”. A forma substantivada desse verbo tem em geral
um sentido negativo, mas o sentido básico do verbo é bom ou
neutro, significando um desejo particularmente forte. Essa
aspiração pelo ministério é, portanto, um impulso interior
que se expressa em desejo exterior.
Sanders
observa que o objeto do desejo não é o ofício, mas o
trabalho. Deve haver um desejo pelo serviço, não pela
posição, fama ou fortuna. Assim, essa aspiração é boa,
contanto que se tenha boas motivações.
Spurgeon
oferece o seguinte conselho quanto ao desejo pelo
ministério: Note bem, o desejo de que falei deve ser
totalmente desinteressado. Se um homem perceber, depois do
mais severo exame de si próprio, qualquer outro motivo que a
glória de DEUS e o bem das almas em sua busca do episcopado,
melhor será que se afaste dele de uma vez, pois o Senhor
aborrece a entrada de compradores e vendedores em seu
templo. A introdução de qualquer coisa que cheire a
mercenário, mesmo no menor grau, será como um inseto no
ungüento, estragando-o todo.
Esse desejo
interior deve ser tão desinteressado a ponto de o líder
aspirante não visualizar-se perseguindo outra coisa, exceto
o ministério. “Não entre no ministério, se puder passar sem
ele”, foi o sábio conselho de um velho pregador a um jovem
quando indagado sobre sua opinião quanto a seguir o
ministério.
Bicket
disse: “Se você pode ser feliz fora do ministério, fique
fora. Mas se veio o solene chamado, não fuja”. Bridges o
considera “um desejo constrangedor... uma qualificação
ministerial primária”
John
MacArthur, Jr. Redescobrindo o Ministério Pastoral. Editora
CPAD. pag. 125-132; 137-138.
A Chamada
para o Ministério - SEU MÉTODO
DEUS chama homens para
exercerem as mais distintas tarefas em sua obra, e, como Ele
é soberano em seus desígnios, então não existe um método
definido para a chamada divina. Existe, sim, o método
divino, soberano e poderoso. A Bíblia registra a chamada de
vários servos de DEUS, e, por uma questão didática apenas,
queremos abordar este assunto sob dois aspectos:
a) Método
direto - DEUS tem chamado homens de um modo direto. Entre
esses, encontramos:
Noé. "Então disse DEUS a Noé: Resolvi
dar cabo de toda carne, porque a terra está cheia da
violência dos homens: eis que os farei perecer juntamente
com a terra" (Gn 6.13). O tempo era terrível, pois a
sociedade estava corrompida à vista de DEUS. A violência, a
hostilidade e pecaminosidade eram o ambiente natural daquela
época. Em meio a esse ambiente conturbado, DEUS chamou Noé e
deu-lhe a ordem de construir uma arca. A chamada de Noé era
para construir. Podemos imaginar as ironias, pressões,
contestações e até mesmo hostilidades que Noé sofreu quando
começou seu projeto de construir a arca. Certamente ele foi
tido como louco, paranóico. Porém Noé tinha plena certeza de
sua chamada e missão dadas diretamente por DEUS (Gn 6.8-12).
Abraão. "Ora disse o Senhor a Abrão: Sai da tua terra, da
tua parentela e da casa de teu pai, e vai para a terra que
te mostrarei" (Gn 12.1). A chamada de Abraão era para deixar
seu povo, sua cidade, seus parentes, amigos e até mesmo
alguns bens, e ir para uma terra que ele não conhecia. Essa
decisão exigiu fé e ousadia, e somente uma poderosa chamada
de DEUS poderia arrancar Abraão de sua terra para ir em
busca de uma nova terra. Os homens consideram isso uma
aventura, um golpe no ar. Naquele tempo, certamente muitos
amigos e parentes o aconselharam a abandonar essa ideia de
ir para a terra prometida. Mas Abraão tinha certeza de sua
chamada, e por isso, obedeceu (Gn 12.4).
Moisés. "Vem,
agora, e Eu te enviarei a Faraó, para que tires o meu povo,
os filhos de Israel, do Egito" (Êx 3.10). Moisés fracassou
em sua primeira tentativa de ajudar seu povo (Êx 2.11-13),
e, sem dúvida, esse revés marcou sua vida, e ele passou a se
julgar incapaz para qualquer tipo de empreitada dessa ordem.
A chamada de Moisés contém o antídoto para sua frustração
interior. DEUS o chamou, primeiramente para si: "Vem, agora"
e se identificou como o DEUS de seus pais, Abraão, Isaque e
Jacó (Êx 3.1-22). Moisés precisava conhecê-lo. Ele não tinha
nenhuma experiência com DEUS, a não ser os ensinamentos da
infância, recebidos de sua mãe. Quem é chamado por DEUS deve
conhecê-lo. Em segundo lugar, DEUS o enviou e o comissionou:
Essa extraordinária chamada é que deu condição a Moisés de
realizar tão notável empreendimento.
Samuel.
"Todo o Israel, desde Dã até Berseba, conheceu que Samuel
estava confirmado como profeta do Senhor" (1 Sm 3.20). Os
filhos de Eli, que seriam seus sucessores, tinham se tornado
execráveis diante de DEUS e do povo, em virtude dos abusos
que praticavam, violando a Lei, que deviam cumprir e
ensinar, e fazer o povo obedecer. Por esse motivo, a palavra
do Senhor se tornou rara em todo o território de Israel,
isto é, não havia profetas nem profecias. DEUS se revelou a
Samuel e lhe fez ciente de seu juízo sobre os filhos de Eli
(1 Sm 3.1-14). Essa experiência foi básica na qualificação
de Samuel para o ministério profético. O resultado é visto
quando Samuel, já velho, resigna seu cargo, e faz um balanço
da sinceridade, austeridade e santidade de sua vida
ministerial (1 Sm 12.1-4).
Isaías. "Vai, e dize a este
povo..." (Is 6.9). A chamada de Isaías deu-se em meio a uma
visão maravilhosa, onde se destaca a santidade do Senhor. Na
visão, Isaías se conscientiza de três coisas: - DEUS é
SANTO; ele (Isaías) é impuro e o povo está desviado dos
retos caminhos do Senhor (Is 6.1-8). Essa visão marca todo o
ministério profético de Isaías, o que é demonstrado ao longo
de seu livro. Ele compreende a grandeza da glória,
perfeição, justiça e santidade de DEUS, e, ao mesmo tempo,
conhece a necessidade de seu povo - a redenção (Is 59). A
chamada de Isaías é muito semelhante à chamada neotestamentária: O pregador precisa conhecer a justiça de
DEUS e a necessidade do pecador, e a redenção em CRISTO.
Os
apóstolos. "E JESUS disse: Vinde após mim, e Eu farei que
sejais pescadores de homens" (Mc 1.17. Leia ainda Mateus
4.18-22; João 1.35-42). O Senhor chamou pessoalmente a cada
um dos doze apóstolos. Houve o momento, inclusive, em que
eles faziam parte de um número bem maior de discípulos,
porém o Senhor JESUS fez questão de separá-los novamente e
fazer uma designação específica - apóstolos (Lc 6.12-16). -
Por que o Senhor JESUS fez tanta questão de chamá-los
pessoalmente e ficar tanto tempo com eles? - Não temos
dúvida de que a missão era por demais importante. Estes onze
judeus iriam mudar o curso da história da humanidade. A
maioria deles, e outros que seriam chamados posteriormente,
haveriam de escrever com o próprio sangue algumas páginas da
História. Por esse motivo, justifica-se o empenho do Mestre
divino em chamá-los e prepará-los.
Paulo. "Pelo que, ó rei Agripa, não fui desobediente
à visão celestial" (At 26.19).
O arrogante Saulo se considerava justo diante de DEUS, pela
justiça da Lei (Fp 3.6) e achava que, matando os cristãos,
estava prestando grande serviço a DEUS (At 8.1,3; 9.1,2).
Não seria qualquer chamada que iria mudar a vida e os
propósitos deste homem. Por isso, o Senhor JESUS
providenciou uma chamada inusitada. O impacto daquele
encontro com o Senhor foi tão marcante que o transformou
completamente (At 9.3-19). A conversão de Paulo tornou-se no
acontecimento mais importante desde o Pentecoste até nossos
dias. Está narrada três vezes (At 9.1-18; 22.1-11;
26.12-18). Logo após essa extraordinária conversão, Paulo já
começou a testemunhar de CRISTO. Alguns dias depois de sua
conversão, Paulo foi encaminhado para sua terra natal, a
cidade de Tarso. Dez anos mais tarde, Barnabé foi buscá-lo,
e é nessa época que Paulo inicia seu ministério apostólico
(At 9.30; 11.25,26).
b) Método indireto
- DEUS não somente
chamou de forma direta, mas também vemos na Bíblia que Ele
usou método indireto com grande objetividade.
José. Ainda
moço, José teve alguns sonhos que indicavam sua proeminência
ou liderança sobre seus irmãos, porém, não se tratava de uma
chamada definida (Gn 37.5-10).
Analisemos as fases da vida
de José: a) Odiado e vendido pelos seus irmãos, b) De filho,
transformado em escravo, c) Acusado injustamente, tornou-se
prisioneiro no calabouço do rei egípcio, d) De prisioneiro,
é elevado a primeiro-ministro do Egito. O Egito na época de
José era governado pelos hicsos e os Faraós eram
considerados divinos, com poderes absolutos. Governar essa
nação já era uma tarefa difícil, muito mais ainda em duas
fases distintas: uma de fartura e outra de extrema fome.
Quando examinamos as fases da vida de José, verificamos que
não passam de um árduo e difícil treinamento, com o objetivo
de moldar o caráter desse servo de DEUS. Entre outras
coisas, José aprendeu: - o que os homens são capazes de
fazer, quando são alimentados pelo ódio, interesses, cobiça
e inveja; - o que DEUS é capaz de realizar em favor e
através de seus servos. Nesse período de provação, José teve
oportunidade de demonstrar fidelidade em momentos e lugares
difíceis (Gn 39.1-6, 20-23); e de não ceder à tentação (Gn
39.7-13). Por causa dessa chamada divina, José foi um líder
sábio e justo, glorificando a DEUS em sua proeminente missão
no Egito. Aleluia!
Josué.
"Então disse o Senhor a Moisés:
toma para ti a Josué, filho de Num, homem em quem há o
ESPÍRITO, e põe a tua mão sobre ele" (Nm 27.18; Nm 27.15-23;
Dt 1.38; 3.21; 31.7,8). Josué é fruto de discipulado. Ele
esteve ao lado de Moisés desde o início da jornada no
deserto. A primeira missão que lhe coube foi selecionar
homens para guerrear contra Amaleque (Êx 17.9). Em seguida,
ele aparece como servidor de Moisés (Êx 24.13; 32.17; 33.11;
Nm 11.28). Esteve presente em todos os momentos críticos da
jornada pelo deserto. Com isso, no serviço e na obediência
prática, ele se transformou em um grande líder: "E Josué,
filho de Num, estava cheio de espírito de sabedoria,
porquanto Moisés tinha posto sobre ele as suas mãos; assim
os filhos de Israel lhe deram ouvidos e fizeram como o
Senhor ordenara a Moisés" (Dt 34.9).
Grandes homens de DEUS
aprenderam o discipulado com seus líderes espirituais.
Durante anos, tiveram a oportunidade de demonstrar
obediência, fidelidade e submissão. Quando foram chamados a
ocupar a liderança, estavam preparados, e DEUS lhes falou, e
confirmou a chamada para sua obra. O grande empecilho hoje é
que muitos não querem esperar, obedecer, e submeter-se. Por
isso são rejeitados.
Timóteo:
"Saúda-vos Timóteo, meu
cooperador..." (Rm 16.21). Timóteo é o exemplo típico do
ministro do Novo Testamento, fruto do discipulado contínuo.
Desde jovem tornou-se companheiro e cooperador do apóstolo
Paulo (At 16.1; 17.14; 18.5; 19.22; 20.4). Mirou-se no
exemplo, firmeza e fidelidade do grande apóstolo. A palavra
enxertada por sua piedosa mãe, na infância, teve terreno e
ambiente fértil para desenvolver-se. Paulo o chama de: "Meu
filho amado e fiel no Senhor" (1 Co 4.17); "ministro de
DEUS... no evangelho de CRISTO" (1 Ts 3.2) e, ainda, de
"verdadeiro filho na fé" (1 Tm 1.2). Estas expressões
demonstram o apreço que o apóstolo tinha por Timóteo, e
também o seu caráter. Com o passar dos anos, não foi difícil
a Timóteo compreender sua chamada ministerial.
SUA RAZÃO - Por
que é importante a chamada divina para o ministério? Qual a
razão da chamada? Ao descrevermos as chamadas de alguns
servos de DEUS, tivemos o propósito de, pelo menos
parcialmente, responder a essas perguntas. Resumindo,
podemos dizer que a chamada divina tem alguns propósitos
importantes: 1 - Esclarecer que o ministério, seja qual for,
nunca foi uma profissão na Antiga Aliança, muito menos na
atual dispensação. Na Antiga Aliança o sacerdócio era
privativo dos filhos de Arão, e os profetas eram chamados
pelo Senhor. O ministério neotestamentário é um dom e uma
vocação de DEUS. "E Ele mesmo concedeu uns para apóstolos,
outros para profetas, outros para evangelistas, e outros
para pastores e mestres" (Ef 4.11).
A partir
desta premissa básica, o homem chamado pelo Senhor deve
estar consciente de que:
a) Do Senhor vem a recompensa (1 Pe
5.2-4).
b) Pelo Senhor ele será julgado (1 Co 4.3-5).
2 - A
certeza da chamada de DEUS faz o servo do Senhor superar
obstáculos considerados, pelo homem comum, insuperáveis ou
além de qualquer possibilidade humana, senão vejamos:
a)
Como compreender a posição de Moisés diante das rebeliões e
tumultos que ele enfrentou no deserto? (Nm 12.1-16; 14.1-9;
16.1-19.) Como entender sua fervorosa oração intercessória
quando DEUS quis destruir o povo israelita e fazer dele um
novo e grande povo? (Nm 14.10-19.) Só um homem vocacionado
por DEUS poderia ter capacidade, calma e equilíbrio para
vencer nesses momentos críticos. Moisés não era um
super-homem, mas era um homem chamado pelo Senhor.
b) Como
entender a perseverança de Paulo, que foi dado por morto,
depois de ser apedrejado pelos judeus opositores do
evangelho da graça, em continuar na sua missão de pregar
essas boas-novas? (At 14.19-22.) Inúmeros outros exemplos
poderiam ser citados. Homens, que, no dizer do escritor da
carta aos Hebreus, "por meio da fé, subjugaram reinos,
praticaram a justiça, obtiveram promessas, fecharam bocas de
leões, extinguiram a violência do fogo, escaparam ao fio da
espada; da fraqueza tiraram força; fizeram-se poderosos em
guerra..." (Hb 11.33,34.)
3 - A chamada é acompanhada da
missão. Ninguém que é chamado pelo Senhor vive de um lado
para outro, de um trabalho para outro, sem nunca ter certeza
da vontade de DEUS. DEUS, quando chama, comissiona seu servo
para uma missão específica.
SUA OCASIÃO
- Se DEUS chama como
quer, isto é, de modo soberano, é lógico que Ele também
chama quando quer. Não há faixa etária privilegiada, como
vemos a seguir:
a) Desde o ventre, o Senhor chamou Jeremias
(Jr 1.5) e Paulo (Gl 1.15,16).
b) O Senhor
chamou Samuel, sendo este bem jovem (1 Sm 3.3,4,20); também
Davi (1 Sm 16.11-13) e, possivelmente, Timóteo (At 16.1-3).
Em qualquer época de nossa existência, o Senhor pode nos
chamar para o ministério ou para o cumprimento de uma missão
em particular. É evidente que, na maioria das vezes, o
Senhor desperta seus servos, em plena juventude para a obra
do ministério, o que lhes proporciona tempo para a
preparação em escolas teológicas, no discipulado, nas
atividades auxiliares da igreja. Quanto às circunstâncias
das chamadas registradas no texto sagrado, são as mais
variadas possíveis. O Senhor chamou Davi quando cuidava do
rebanho de seu pai (1 Sm 16.11); Eliseu quando andava
lavrando com doze juntas de bois (1 Rs 19.19-21); Paulo a
caminho de Damasco, com o objetivo de prender cristãos (At
26.12-16).
SUA NATUREZA
- Quanto à natureza intrínseca, a
chamada para o ministério neotestamentário apresenta as
seguintes características:
a) Divina. A responsabilidade da
chamada ministerial é do Senhor; "e Ele mesmo concedeu uns
para..." (Ef 4.11). Não se trata de uma incumbência dada por
convenção, concílio ou igreja. Embora que estes possam
ser
instrumentos de DEUS na chamada de alguém.
b) Pessoal.
A
chamada para a salvação é universal. É para todos. A chamada
para o ministério é pessoal; DEUS tem o ministério ou missão
certa para a pessoa certa. Ele é onisciente, conhecendo a
capacidade de cada um, por isso, na distribuição dos
talentos, estes são distribuídos segundo a capacidade de
cada um (Mt 25.14,15). As responsabilidades diferem, por
isso o Senhor chama o seu servo para o ministério e
designa-lhe o lugar ou a missão, respeitando a sua
capacidade, as suas características pessoais. A Paulo foi
dado o ministério entre os gentios (At 9.15); a Pedro o
ministério entre os judeus.
c) Soberana.
A soberania de DEUS é ainda pouco entendida por muitos, e,
para se começar a entendê-la, é necessário que levemos em
conta alguns aspectos acerca da personalidade do Senhor: -
Ele é a origem de todas as coisas. "Quem, pois, conheceu a
mente do Senhor? Ou quem foi o seu conselheiro? Ou quem
primeiro lhe deu a Ele para que lhe venha a ser restituído?
(Rm 11.34,35. Ler ainda Isaías 40.13; segunda Coríntios
2.16.) - Ele é soberano porque a sabedoria e o poder são
atributos de sua pessoa (Jo 9.4; Dn 2.20). - O servo do
Senhor, ao ser chamado, deve aceitar com humildade,
submissão, e como ato de soberania divina. Certamente não
conseguirá respostas para muitas indagações imediatas. Só
com o correr do tempo entenderá os desígnios do Senhor (Is
55.8,9; 1 Co 2.16).
d) Definitiva. A chamada para o
ministério é também uma chamada para o discipulado. Logo,
esta chamada envolve algumas condições indispensáveis, tais
como: - Que o ministro exerça seu ministério sem interesse
de recompensa material (Lc 9.57,58). - Que a prioridade
maior entre as suas atividades seja o próprio Senhor JESUS.
(Veja como Ele recusou o segundo lugar na vida de duas
pessoas que queriam segui-lo. Lc 9.59-62). - Que haja no
ministro abnegação e renúncia. Em primeiro lugar estará a
vontade do Senhor (Mt 16.24; Lc 14.26,33). A chamada para o
ministério é definitiva. Aquele que é chamado não pode impor
condições. Pelo contrário, deve agradecer a DEUS o
privilégio de ser chamado, como o fez Paulo (1 Tm 1.12,13).
Mendes, José
Deneval, Teologia Pastoral. Editora CPAD. pag. 11-19.
2.
Qualificações.
I Tm 3.7 Mas
ele também precisa ter um bom testemunho dos de fora, a fim
de não cair na difamação e no laço do diabo.
Já em sua
carta mais antiga o apóstolo exorta a congregação para que
tenha uma “conduta decente (honrada)” aos olhos dos de fora.
Não ser tropeço nem causar escândalo! Essa exortação vale
para a conduta diante de todos: judeus, gregos, cristãos.
Isso não tem nada a ver com uma falsa adaptação aos padrões
e costumes do mundo, porque a igreja deve ser irrepreensível
e pura em meio a esta geração pervertida e corrupta. Suas
boas obras devem poder ser vistas à luz do dia e se
diferenciar das inúteis obras das trevas. Porque “enquanto
os cristãos se preocupam sacerdotalmente pelo mundo, o mundo
lança o afiado olhar da hostilidade sobre a igreja, a fim de
encontrar pontos vulneráveis. Por isso não será recomendável
colocar na liderança da igreja homens que eram notórios na
cidade por seus pecados ou fraquezas passadas, ainda que se
tenham emendado sinceramente”.
Os de fora
na realidade estão fora da igreja, mas nem por isso fora do
alcance do juízo e da graça de DEUS. Os que estão fora da
igreja possuem uma percepção implacável e um juízo
insubornável para os pecados daqueles que se dizem cristãos.
Com essa atitude na verdade condenam a si mesmos, porque
confessam que sabem muito bem o que é certo e como deveriam
viver. Contudo, isso não desculpa a igreja. Ela mesma deve
manter um juízo vigilante acerca das próprias transgressões
e por isso ir com humildade e mansidão ao encontro dos “de
fora”.
Quando se
pondera como os meios de comunicação de massa vasculham a
vida passada e atual de líderes políticos, econômicos e
religiosos com a criatividade de um detetive, desnudando-a
em público (em geral por motivos ignóbeis de luta pelo
poder), torna-se ainda mais atual a exigência do bom
testemunho de fora. Pois quando a difamação circula em lugar
do bom testemunho, ela pode influir de modo tão terrível
sobre o envolvido que lhe rouba a fé no perdão de DEUS,
lançando-o no desespero. Como uma mosca na teia da aranha,
ele ficará então emaranhado nos laços do diabo, do acusador
originário.
A lista das
16 “virtudes” começa de forma aparentemente inofensiva com a
irrepreensibilidade como premissa fundamental para o serviço
de presidente. O catálogo termina com a condição quase
idêntica do bom testemunho dado pelos de fora da igreja,
anunciando surpreendentemente a verdadeira razão e a grave
conotação de toda a listagem: laço e juízo do diabo, esses
são a ameaça e o risco reais daquele que visa servir a
outros sendo seu presidente. Enquanto assim se abre a visão
para o pano de fundo da sedução demoníaca, o catálogo de
virtudes perde sua limitação helenista e o sabor
pequeno-burguês resultante da apreciação meramente
superficial.
Hans Bürki.
Comentário Esperança
Cartas aos I Timóteo. Editora Evangélica Esperança.
Esta
determinação lembra uma situação nos procedimentos de nosso
Senhor com seus seguidores, relatada em Lucas 10.17-20. Os
setenta haviam acabado de voltar de sua missão designada e
estavam exultantes com o fato de que “até os demônios se nos
sujeitam”. JESUS não reprovou imediatamente o orgulho
espiritual principiante, mas observou um tanto
enigmaticamente: “Eu via Satanás, como raio, cair do céu”. E
completou: “Eis que vos dou poder [...] [sobre] toda a força
do Inimigo. [...] Mas não vos alegreis porque se vos
sujeitem os espíritos”. Foi o orgulho que custou a Lúcifer o
seu lugar nas hostes celestes, e esta foi a condenação do
diabo. O ministro cristão tem de estar atento para que o
orgulho não o compila a participar desta condenação.
Resta ainda
uma especificação final para aquele que deseja servir na
posição de bispo ou líder: Convém, também, que tenha bom
testemunho dos que estão de fora, para que não caia em
afronta e no laço (“armadilha”, NTLH) do diabo (7). O
ministro cristão tem de inspirar o respeito e a confiança da
comunidade fora da igreja, caso deseje ganhar as pessoas
dessa comunidade para a igreja. E fácil dizer: “Não me
importo com o que as pessoas pensem de mim”; e contanto que
essa atitude seja devidamente planejada e corretamente
compreendida, justifica-se. Mas ninguém deve ser indiferente
à sua reputação na comunidade em que vive. Ele deve desejar
veementemente que as pessoas o considerem inteiramente acima
de repreensão. Ver a questão de outro modo, diz Paulo, é
expor-se à mesma armadilha que aguarda o indivíduo cujo
espírito está arruinado pelo orgulho espiritual.
J. Glenn
Gould. Comentário Bíblico Beacon. Editora CPAD. Vol. 9. pag.
472.
I Tm 3.7.
Como líder e representante do seu rebanho, o superintendente
deve ter bom testemunho dos de fora, i. é, entre os
não-cristãos, judeus e pagãos, na localidade. É sempre
importante para os cristãos, conforme Paulo frequentemente
impressionava sobre seus correspondentes (1 Co 10:32; Fp
2:15; Cl 4:5; 1 Ts 4:12; também 6:1; Tt 2:5) ter este alvo,
e isto se aplica especialmente aos clérigos, por cujo
caráter e conduta o mundo tende a julgar a igreja. O pastor
que fracassa com respeito a isto está propenso a cair no
opróbrio, visto que os de fora que têm antipatia pela igreja
aplicarão a interpretação mais desfavorável à sua mínima
palavra ou ação. Neste caso, é bem possível que ele caia no
laço do diabo. Esta última frase poderia sei traduzida
“aimadilha armada pelo caluniador”, e esta tradução às vezes
tem sido aceita. Deve ser objetado, no entanto, que isto não
somente dá a diabolos (no singular) um sentido muito
improvável, como também acrescenta pouco ou nada a cair no
opróbrio. Do outro lado, o quadro do diabo armando laços
para desacreditar o superintendente, e através dele a
igreja, está em harmonia com 2 Tm 2:26, e também com o
conceito geral das suas atividades exposto nas Pastorais.
John Norman
Davidson Kelly. Introdução e Comentário. I, II Timóteo e
Tito. Editora Vida Nova. pag. 81.
I Tm 6.11 Ó
homem de DEUS: antes de recorrer a paralelos helenistas é
preciso considerar que a locução é conhecida na tradução
grega do AT: para Moisés, para um profeta desconhecido, para
Davi, o rei ungido. O homem de DEUS é o pneumatikós, que
está pleno do ESPÍRITO de DEUS. Uma comparação com 2Tm 3.17
sugere ver no “homem de DEUS” o exemplo de todos que,
dotados do ESPÍRITO, igualmente são “pessoas de DEUS”.
Pessoa de DEUS (QI 31a) contrasta com pessoas do “deus
Mamom”, com pessoas do deus estômago. Compare-se também
“homem da iniqüidade”, “filho da perdição”.
Foge dessas
coisas: talvez se tenha em vista todos os vícios listados em
1Tm 6.4s ou em especial o amor ao dinheiro. Fugir, escapar,
buscar a salvação na fuga parece ser covarde e não-heroico.
Foi assim que agiram os discípulos, quando abandonaram a
JESUS: fugiram. O mau pastor foge diante dos lobos vorazes.
Entretanto, diferente é a questão na esfera moral. Aqui a
fuga pressupõe uma determinação máxima. JESUS escapa
daqueles que queriam transformá-lo em rei. Fugir contém o
sentido: tomar distância, evitar, abster-se, retirar-se,
recear. Idolatria, avidez, dissolução, são poderes a cuja
atração demoníaca somente se pode resistir através da
decidida fuga sem olhar para trás. Somente fugindo para DEUS
e submetendo a impotência pessoal e todos os poderes à
potente mão de DEUS é possível resistir ao diabo pela fé.
Fugir de uma casa em chamas não é covardia, mas ação
imediata e corajosa. Foge – corre atrás! Não é assim que
escreve alguém que pensa em acomodar-se. A sagrada premência
impele para a decisão.
Corre atrás!
Parágrafo
após parágrafo da carta refuta a insustentável alegação de
que nas pastorais é possível notar uma “conotação de acomodação”,
um “afrouxamento da energia da fé”. Muito pelo contrário: a
carta nos diz que é necessária a fuga decidida da voragem
destruidora e do fascínio de poderes demoniacamente
intensificados, bem como a corrida igualmente decidida atrás
do bem. Ficam excluídas a vida e a acomodação neutras entre
as duas alternativas. O discipulado não se transformou em um
aprazível passeio, mas em uma corrida que requer empenho
máximo (QI 15d).
Atrás da
justiça: na acepção mais ampla, o que é reto perante DEUS e
os humanos, porém não a virtude produzida pelo próprio ser
humano, mas o fruto educativo da graça naqueles que foram
redimidos para formar o povo da propriedade dele.
Posicionada no começo, a palavra justiça com certeza possui
o sentido absoluto, usual em Paulo, da justiça concedida e
efetuada por DEUS mediante a fé.
Atrás de
beatitude: A devoção não representa uma posse sólida,
adquirida de uma vez por todas. Somente quem se exercita
constantemente nela (1Tm 4.7), que corre atrás dela, é
inserido por meio dela no mistério de DEUS que abarca o
tempo e a eternidade (1Tm 3.16), na verdadeira autarquia
(1Tm 6.6), ou seja, na transbordante vida do amor (QI 15).
Fé, amor,
paciência: uma comparação com 1Ts 1.3 mostra que a
“paciência”, mencionada junto com fé e amor, traz dentro de
si a perspectiva e expectativa da esperança (QI 14).
Mansidão:
JESUS declara bem-aventurados os mansos e designa a si mesmo
de manso. Aquele que escapa de todas as escravizações
consegue perseguir, com autêntica liberdade, alvos
humanamente dignos. O manso é capaz de lutar corretamente. A
“lista de virtudes” não foi acolhida ou compilada
aleatoriamente, pois justiça e beatitude, fé, amor,
esperança (paciência) e a mansidão que vive da esperança no
poder e na intervenção de DEUS visa integralmente a Timóteo.
Quando correr atrás dessa realidade de vida determinada por
DEUS, ele poderá enfrentar os vícios dos hereges e atuar em
sentido construtivo para a igreja. Ao invés de especulações
inúteis, de uma devoção extravagante e mentirosa, devem
concretizar-se em Timóteo as palavras elementares do Senhor,
que levam à convalescença, e por intermédio dele, na igreja
que lhe foi confiada.
12 Combate a
boa luta da fé: somente com base na profecia oriunda do
ESPÍRITO e mediante uma transmissão de poder constantemente
ativada a luta pode ser uma luta boa, porque não se trata de
uma luta absurda, que leva à derrota temporal ou eterna. O
lutador luta a partir da fé e não em busca da fé. Seja na
disputa esportiva, seja na guerra: só o lutador que vive na
disciplina participa da vitória.
Toma posse
da vida eterna: agarrar como troféu da vocação, tomar nas
mãos para apropriar-se. Deve agarrá-lo lutando na fé como
alguém dotado do ESPÍRITO e chamado para a vida eterna.
Agarra a vida eterna! Um imperativo de intensidade máxima,
uma convocação para a ação varonil. Agarra agora a vida
verdadeira e plena, para a qual DEUS te chamou! Quando, se
não hoje? Não corras atrás de uma vida de ilusão.
Sê sóbrio:
agarra a vida verdadeira; DEUS ta doou; está aí. Torna-te o
que és – um homem de DEUS!
Para a qual
foste chamado: forma passiva, um linguajar semita, para
evitar o nome de DEUS, ou seja, para não escrevê-lo: para a
qual DEUS te chamou. Nem lutar nem correr atrás torna uma
pessoa digna da vida eterna.
Quando
fizeste a boa confissão perante muitas testemunhas: a
confissão não é um ato do passado, mas deve ser proferida de
novo agora e até a última hora. A luta da fé é boa, porque a
confissão é boa, inclusive quando o mundo a considera com
desprezo. Os cristãos tinham de prestar contas de sua fé
diante dos juízes seculares. Nessa situação não cabiam
especulações nem sutilezas teóricas, estavam em jogo vida e
morte. Quem confessava JESUS como seu Senhor colocava em
cheque os senhores deste mundo, que demandavam autoridade
divina. Por isso não se fala aqui de uma confissão
tradicional e corriqueira sem maiores conseqüências. O olhar
para JESUS, que se deparava com Pilatos, proíbe qualquer
leviandade.
Hans Bürki.
Comentário Esperança
Cartas aos I Timóteo. Editora Evangélica Esperança.
Fuja e Siga
(6.11)
Depois de
pintar em cores tão sombrias os males do desejo de lucro, o
apóstolo volta a lidar com o bem-estar espiritual de
Timóteo: Mas tu, ó homem de DEUS, foge destas coisas e segue
a justiça, a piedade, a fé, a caridade (“o amor”, ACF, AEC,
BJ, CH, NTLH, RA), a paciência, a mansidão. Paulo não
poderia ter feito apelo mais eloqüente que este no qual ele
distingue Timóteo como homem de DEUS. Esta era a descrição
habitual dos servos de DEUS no Antigo Testamento. Ao usar
esse título, o apóstolo fala da dignidade, da
responsabilidade sublime e solene do cargo que Timóteo
mantinha e que é mantido igualmente por todo líder cristão.
A determinação de Paulo é: Foge destas coisas. O significado
não é fugir somente da sedução das riquezas, mas de todas as
atitudes más que foram expressas desde o capítulo 4. Há uma
antítese interessante na ordem de fugir destas coisas e, de
outro lado, seguir as virtudes particularmente designadas. É
uma lista notável de virtudes que Paulo quer infundir. A
lista começa com justiça, a mais inclusiva das virtudes;
significa dar a DEUS e aos homens o que lhes é devido. As
três virtudes seguintes formam um grupo dirigido a DEUS.
Piedade é a consciência reverente que tudo na vida é vivido
na presença e sob os olhos de DEUS. Fé é a fidelidade que
nos mantêm firmes, mostrando lealdade a DEUS em todas as
situações. Amor (ágape) é a expressão de gratidão e louvor
de nossa alma pela maravilha da graça redentora. Por fim,
Paulo infunde paciência e mansidão, que podem ser traduzidas
por “firmeza” (CH; “constância”, BAB, RA; “perseverança”,
NVI); e “bondade” (RSY). Estas são as características da
vida cristã conforme é vivida em contato e companheirismo
com as pessoas. O contraste entre estas virtudes e os males
que Paulo denuncia não podia ser mais impressionante.
Milite a Boa
Milícia (6.12)
Este
versículo nos traz a imagem mental de um treinador
instilando coragem e espírito de luta em seu time pouco
antes do início de um jogo decisivo: Milita a boa milícia da
fé, toma posse da vida eterna, para a qual também foste
chamado, tendo já feito boa confissão diante de muitas
testemunhas (12). Afigura de linguagem que o apóstolo usa é
derivada mais das competições esportivas do século I do que
da vida militar. Devemos entender que o verbo milita é a
luta agonizante requerida caso a pessoa quisesse vencer uma
partida de luta romana. Paulo se servia de analogias
visuais, tanto da vida do soldado quanto da do atleta. Todo
cristão é chamado a batalhar a luta pessoal contra o mal em
todas as suas formas. E, como destaca Kelly, “é de propósito
que o imperativo está no presente, indicando que a luta é um
processo contínuo. Por outro lado”, continua Kelly, “o
imperativo aoristo ‘toma posse’ sugere que Timóteo pode
tomar posse da vida eterna (aqui concebida como o prêmio
para o evento esportivo) imediatamente e em um único ato”.
Assim, o atleta cristão desfruta do prêmio ao mesmo tempo em
que ainda se engaja na competição.
Paulo diz
que Timóteo foi chamado para esta campanha vitalícia. Na
verdade, ele possuía um chamado duplo: o chamado para seguir
a CRISTO, que foi selado na confissão pública de fé no
batismo; e o chamado para pregar o evangelho, a cuja tarefa
ele fora ordenado pelo próprio apóstolo e colegas que o
ajudavam. Muitos intérpretes acham difícil determinar a qual
destes chamados se refere a frase final do versículo. Esta
tradução interpreta que o chamado ocorreu “quando você deu o
seu belo testemunho de fé na presença de muitas testemunhas”
(12, NTLH). Contudo, seria mais adequado considerar que essa
frase final é outra alusão que o apóstolo faz à ordenação
que ele freqüentemente menciona (e.g., 4.14).
J. Glenn
Gould. Comentário Bíblico Beacon. Editora CPAD. Vol. 9. pag.
497-498.
À medida em
que sua carta vem chegando ao fim, Paulo dirige um apelo
direto ao próprio Timóteo. A nota fortemente pessoal nele é
inconfundível; é forçar demasiadamente a passagem
interpretá-la como uma exortação ao pastor típico, e a
sobrecarga na passagem fica sendo ainda maior se
considerarmos que “Timóteo” representa o discípulo cristão
em geral.
11. As
palavras iniciais, Tu, porém, são enfáticas; formam uma
nítida antítese com alguns no versículo anterior, e talvez
também com se alguém em 3. A conduta de Timóteo, e os
princípios sobre os quais ele a baseia, devem ser exatamente
os opostos daqueles dos bancarrotas morais que acabam de ser
descritos. O título homem de DEUS é aplicado a ele
deliberadamente. Tem a conotação de que está no serviço de
DEUS, que representa a DEUS e que fala em Seu nome, e é
admiravelmente apropriado a alguém que é um pastor (cf. 2 Tm
3:17). Uma tentativa tem sido feita, com a ajuda de
paralelos de Filo, da literatura hermética, e da Epístola de
Aristéias, de dar à expressão um significado semimístico,
como se o “homem de DEUS” significasse o cristão batizado em
geral. Tais subtilezas, no entanto, são desnecessárias e
artificiais, pois “homem de DEUS” é regularmente usado no
A.T. para designar os servos e agentes de DEUS; cf. Dt 33:1
e Js 14:6 (Moisés); 1 Sm 9:6 (Samuel); 1 Rs 17:18 (Elias); 2
Rs 4:7 (Eliseu); Ne 12:24 (Davi).
Timóteo, por
ser consagrado ao serviço de DEUS, deve fugir destas coisas,
i.é, primeiramente o amor ao dinheiro e os males dos quais
ele é a causa radical, mas também, sem dúvida, os caminhos
falsos e desastrosos que os sectários encorajam. Ao invés
disto, deve seguir (“ter como alvo”, um uso bem paulino; cf.
Rm 9:30; 12:13; 14:19; 1 Co 14:1; Fp 3:12, 14) a justiça, a
piedade, a fé, o amor, a constância, a mansidão. A lista de
qualidade é escolhida tendo em vista a necessidade de
Timóteo no seu cargo pastoral. Achamos a justiça e a piedade
formando um par, na forma de advérbios, em Tt 2:12. A
palavra grega para a primeira (dikaiosunè) não significa a
justiça no sentido caracteristicamente paulino nem, mais
estreitamente, a justiça rigorosa em contraste com a gula e
a concupiscência dos sectários. É uma palavra geral para a
conduta que é totalmente reta e imparcial com relação a
todos os membros da comunidade: cf. 2 Tm 2:22; 3:16. Com
piedade (mais uma vez sua palavra predileta eusebeia) Paulo
denota uma atitude religiosa devota e inteiramente correta:
ver sobre 2:2.
A tríade fé,
amor, constância volta a ocorrer em Tt 2:2; também é achada
em 1 Ts 1:3. As duas primeiras palavras representam, é
lógico, as graças cristãs supremas; tendo em conta a posição
especial de Timóteo, como defensor da fé contra o erro e
também como delegado apostólico, é muito apropriado que a
constância e a mansidão sejam acrescentadas. Aquela palavra
é freqüentemente usada por Paulo no sentido de um esforço
perseverante; esta (Gr. praüpathia) é um hapax do N.T., mas
o Apóstolo estava familiarizado com seu cognato praütès
(e.g. 2 Co 10:1;G1 5:22).
Às vezes é
argumentado (ver a Introdução, págs. 25,27) que o tratamento
aqui de fé e amor, que para Paulo abrangiam a tudo, como
sendo virtudes específicas que podem ser catalogadas
juntamente com outras, é um traço espalhafatosamente
não-paulino. Devemos, no entanto, observar que as duas, sem
qualquer indicação de precedência, figuram na lista
miscelânea do “fruto do ESPÍRITO” em G1 5:22. A objeção de
que “para Paulo, estas são as dádivas de DEUS, não as
realizações humanas”
(F.
D. Gealy) é igualmente superficial. Se for necessário sermos
literais, o próprio Paulo aconselhou os coríntios, com
linguagem idêntica, “Segui o amor” (1 Co 14:1). De modo mais
geral, a doutrina da primazia da graça não exclui todo o
conselho e a exortação.
12. As
palavras de desafio que se seguem, Combate o bom combate da
fé, trazem à mente o quadro de uma competição de luta-livre
ou dalgum outro evento de atletismo; conforme procura
ressaltar nossa tradução: “Desempenha tua parte na nobre
competição da fé”, a metáfora é tirada do esporte, e não da
guerra. Para o uso das analogias do esporte, da parte de
Paulo, ver sobre 4:7;cf. também 1 Co 9:24ss.; Fp 2: 16;
3:12-14; 2 Tm 4:7. Paulo o chama o combate da fé, ou porque
é a luta que a fé verdadeira empreende contra o erro, ou,
mais provavelmente, porque tem em mente “a guerra pessoal
contra o mal à qual todo cristão é conclamado” (J. H.
Bernard). O imperativo está deliberadamente no tempo
presente, o que indica que a luta será um processo contínuo.
Do outro
lado, o imperativo no aoristo Toma posse sugere que Timóteo
pode apoderar-se da vida eterna (aqui concebida como sendo o
prêmio para o evento atlético) imediatamente, num único ato.
Destarte, é alguma coisa que o cristão que leva a sério as
exigências da sua fé pode desfrutar em certa medida aqui e
agora. Não há contradição entre isto e o ensino de Paulo
noutros lugares. Se em Rm 6:22 e G1 6:8 fala da vida eterna
como sendo uma bênção que o crente fiel ceifa no fim, há
outras passagens (e.g. Rm 6:4; 2 Co 4:10-12; Cl 3:3-4) em
que concebe da nova vida em CRISTO como sendo uma realidade
presente.
Duas razões
obrigatórias porque Timóteo deve empreender-se nesta luta
vitalícia são (a) que DEUS e (b) que publicamente reconheceu
e aceitou aquela chamada. Quanto, à chamada de DEUS, cf. 1
Co 1:9; 2 Ts 2:14. A ocasião em que Timóteo a aceitou foi
quando fez a boa confissão, perante muitas testemunhas. Esta
expressão às vezes tem sido explicada como sendo uma
referência ou à sua ordenação ou à sua corajosa confissão de
CRISTO ao ser perseguido e arrastado diante dos magistrados
civis (cf. Hb. 13:23 para uma menção da sua prisão). A
primeira não é especialmente apropriada para o contexto, que
diz respeito à chamada de Timóteo para ser cristão (este é,
por certo, o significado de ser chamado para a vida eterna),
não para ser ministro de DEUS. De qualquer maneira, não
temos razão para supor que uma solene confissão de fé em
CRISTO fosse exigida na ocasião da ordenação de um ministro:
nenhum indício disto aparece nos relatos antigos do rito. A
segunda explicação parece ainda menos apropriada, pois um
comparecimento diante de um magistrado dificilmente pode ser
chamada uma convocação à vida eterna. Além disto, se Timóteo
tivesse sofrido desta maneira, e se mostrasse corajoso,
teríamos esperado alguma alusão mais direta ao assunto nas
cartas, especialmente tendo em vista que elas tendem a
ressaltar a sua timidez. Talvez o único pormenor a favor
desta exegese seja o paralelismo com o v. 13, que
possivelmente (mas ver abaixo) relembre o julgamento de
CRISTO diante do governador romano. Embora isto sugira, no
entanto, que as duas confissões sejam paralelas, é
desnecessário procurar um paralelismo rigoroso nas situações
também.
Muitos mais
plausível do que qualquer destas interpretações é aquela que
identifica a boa confissão de Timóteo com a profissão de fé
que fez no seu batismo. Esta, acima de todas, era a ocasião
em que se podia dizer que o cristão aceitou a chamada à vida
eterna, e na igreja primitiva este sacramento era
administrado publicamente diante da congregação reunida, i.
é, perante muitas testemunhas. Desde os tempos mais antigos,
seu clímax era uma solene afirmação de fé por parte do
candidato, e Paulo quase certamente está citando semelhante
afirmação, ou uma seleção de uma delas, quando escreve (Rm
10:9): “Se com a tua boca confessares (o verbo que emprega,
Gr. homologein, é o cognato do subs. homologia traduzida
confissão aqui) a JESUS como Senhor, e em teu coração creres
que DEUS o ressuscitou dentro os mortos, serás salvo.”
Nenhum argumento pode ser trazido de 2 Tm 3:15 contra esta
exegese, porque, embora este trecho revele que Timóteo tinha
sido instruído nas Escrituras desde a infância, não dá a
entender de modo algum que tivesse sido batizado na
infância, o que, em quaisquer circunstâncias, é extremamente
improvável. O fato de que Paulo coloca o artigo definido
antes de a boa confissão confirma que está falando de uma
fórmula que tem um caráter reconhecido e oficial.
John Norman
Davidson Kelly. Introdução e Comentário. I, II Timóteo e
Tito. Editora Vida Nova. pag. 131-134.
3.
Comprometidos com a Palavra.
I Tm 3.2 O
presidente, pois, deve ser irrepreensível. Essas palavras
não instituem o presidente nem seu ministério, mas o
pressupõem, e isso sem qualquer ênfase, como em Fp 1.1. Em
primeiro lugar se falou do “sacerdócio de todos os fiéis”
(cap. 2) e agora de seus servos, em plena concordância com
1Co 3.5. Podemos chamar a lista subseqüente de “catálogo de
virtudes”, em contraposição ao chamado “catálogo de vícios”.
Chama atenção que não se fazem exigências especiais, exceto,
talvez, de “apto para ensinar”. Pelo contrário, enumeram-se
atitudes práticas e cotidianas que precisam ser consideradas
“elementares” para todos os cristãos. Por que, no entanto,
escrever acerca delas mesmo assim? Essa lista ou outras
similares nas past só podem ser descartadas
depreciativamente como “moral burguesa” ou “ética cristã
mediana” se ignorarmos como tudo está fundamentado e como as
coisas elementares são e continuam sendo necessárias para a
fé.
Quando as
coisas elementares não são constantemente renovadas e
redirecionadas em direção ao que é fundamental (a base) e
final (o alvo, a consumação, em grego, o eschaton),
rapidamente surgem enredamentos e descaminhos igualmente
elementares, arrastando consigo o indivíduo e a sociedade. É
preciso ver as orientações das past diante do pano de fundo
de uma indomável correnteza de “anomia” na sociedade e
igreja.
Irrepreensível não significa simplesmente gozar de boa fama,
mas ter um testemunho justificadamente bom. A crítica e as
acusações não devem encontrar pontos vulneráveis para seu
ataque. Aparentemente a palavra designa o comportamento
abrangente, fundamental para tudo o que segue. JESUS frisa a
importância do bom testemunho, como também ocorre em geral
no NT. Nessa questão é decisivo que o bom testemunho seja
reconhecido e fornecido pelos que não fazem parte da igreja.
“Vossa conduta seja decorosa aos olhos dos estranhos.” Essa
exortação da carta mais antiga de Paulo coincide
integralmente com a exigência de ser irrepreensível, o que
não pode ser questionado nem mesmo por observadores críticos
e hostis. Um modo de vida desses só é viável a partir do
“mistério da fé, preservado em uma consciência pura”. Essa é
a origem e a renovação de toda a autêntica
irrepreensibilidade. Representa o oposto tanto do
comportamento anti-social como da exagerada adaptação pacata
a todos e a tudo.
Marido de
uma só mulher. O presidente deve ser exemplarmente casado.
Não se espera o celibato dos servidores da igreja, mas que
tenham plena capacidade matrimonial e sejam modelos no
casamento. A melhor “escola matrimonial” acontece por
“exemplos matrimoniais”. Presidentes e diáconos devem ser
casados uma única vez; isso aponta em 3 direções:
1) Acerca da
profetiza Ana lemos que era virgem até se casar. Quando o
marido morreu após 7 anos de casamento, ela passou a viver
sozinha até idade avançada (84 anos), servindo a DEUS. De
acordo com a palavra profética permaneceu fiel ao “noivo de
sua mocidade”.
2) Conforme
as palavras do Senhor a monogamia é o alvo original,
estabelecido por DEUS, do relacionamento entre homem e
mulher. Se os próprios gentios chamam atenção para isso e os
cristãos aspiram ao amor e à fidelidade no matrimônio,
quanto mais isso deveria valer, então, para aqueles que se
“apresentam em todas as coisas” (logo também no casamento)
como “exemplo de boas obras”.
3) A
interpretação aqui fornecida possui relevância justamente
com vistas à prática do divórcio, que naquela época se
alastrava com força, e do correlato recasamento de pessoas
divorciadas, seja entre gregos, seja entre judeus.
A expressão
única pode ser mantida em forma tão genérica pelo fato de
que deve caracterizar de forma abrangente a atitude básica
fundamental da castidade em todas as situações. O casto não
reprimiu sua sexualidade, mas a tornou íntegra, porque
castidade é alegrar-se com a sexualidade respeitando os
limites do respeito.
Sóbrio (nephalios)
vale tanto para mulheres como para homens idosos. O verbo
correspondente já é utilizado por Paulo em sua carta mais
antiga: “Não durmamos como os demais, mas vigiemos e sejamos
sóbrios.” Ser sóbrio faz parte da oração e da vigilância e
diz respeito a uma contenção de orientação escatológica
diante de todo tipo de fanatismo, embriaguez, dissoluções no
pensar, sentir e agir.
Quem
reconhece a verdade em DEUS torna-se sóbrio diante do
delírio do pecado, para viver uma vida reta.
Sensato (sophron):
assim como o adjetivo “sóbrio”, também ocorre somente nas
past, mas o termo é usado como verbo na carta aos Romanos:
cada qual deve pensar com moderação, ser sensato, segundo a
medida da fé que DEUS repartiu a cada um. Quem é temperante
possui uma medida correta de auto avaliação, um sentido para
o que é real. É compreensivo. Depois de ser curado, o homem
antes possesso está tranquilamente assentado, está vestido e
em perfeito juízo. O temperante é espiritualmente saudável.
“O fim de todas as coisas está próximo, sede, portanto,
criteriosos e sóbrios a bem das vossas orações!” Ambas as
palavras – sóbrio e temperante – possuem um viés
escatológico, e o fato de aparecerem juntas serve para
enfatizar isto. Quem está embriagado e alimenta sonhos
devotos a respeito de si mesmo e do mundo não consegue orar
de fato, porque orar é justamente o contrário de fugir da
chamada “realidade” para um mundo onírico. Vale o contrário:
quem ora acorda para a verdadeira situação, e quem está
alerta ora de olhos abertos. É disso que resultam as boas
obras.
Digno (kosmios):
sensato e digno (como em 1Tm 2.9 para as mulheres!) pode ter
aqui o sentido de cortês, solícito, o que no entanto não
deve ser entendido como cortesia artificial, que visa as
aparências, porque isso representaria uma contradição com
sóbrio e sensato. Realmente cortês é aquele que ao avaliar a
si mesmo e a todas as coisas de forma sensata e de acordo
com a perspectiva de DEUS, acordou para as necessidades
daqueles aos quais serve.
Hospitaleiro: em outras ocasiões Paulo também exorta as
igrejas para que cuidem das necessidades dos santos e
pratiquem a hospitalidade. Nos escritos do NT lemos a
respeito de cristãos que são viajantes e também
comerciantes; outros são perseguidos e precisam fugir para
outras cidades. Os apóstolos e seus colaboradores viajavam
de localidade em localidade, dependendo para isso da
acolhida solícita nas casas dos crentes. Para as reuniões da
igreja e para os que estavam em trânsito as casas das
famílias dos fiéis representavam o alojamento propício. Tudo
isso torna necessária a exortação de que não se esqueçam da
hospitalidade. Mais tarde é preciso proteger a hospitalidade
contra os abusos de andarilhos itinerantes e “irmãos
estranhos”.
Hoje quem
viaja por países em que os cristãos são perseguidos ou
representam uma minoria sabe o que significa e custa a
hospitalidade. Mas também onde os cristãos são maioria na
sociedade, mas as formas eclesiásticas não são (mais)
marcantes e formadoras de comunhão, a cordial liberalidade
das famílias que creem em CRISTO em relação a visitantes,
conhecidos e desconhecidos, constitui o nervo vital para uma
igreja que irradia para dentro do mundo. A abertura
hospitaleira não é uma palavra em favor, mas contra o
aburguesamento, porque o burguês se isola e se fecha em seu
castelo, ainda que seja apenas uma pequena moradia alugada
no mesmo edifício com outros 10 ou 100 inquilinos. O burguês
não gosta de se colocar a caminho, nem gosta de ser
incomodado por inconstantes. A vida de gueto de muitas
comunidades eclesiais tem por correlação a vida na reclusão
caseira e na privacidade de seus membros. Os servidores da
igreja, porém, devem ser exemplos no matrimônio e na família
pelo fato de serem abertos e livres para o hóspede.
Apto para
ensinar (didaktikos): em todo o NT o termo ocorre somente
aqui e em 1Tm 3.2. O seu sentido é descrito exaustivamente
em Tt 1.9: o presidente deve “apegar-se à palavra confiável
e conforme a doutrina, para que seja capaz de, pelo reto
ensino, exortar bem como convencer os que o contradizem”.
Deve estar aberto para questões doutrinárias, capaz de
formar sua própria opinião e instruir a outros. Precisa
discernir entre o que é importante e o que leva a
descaminhos, entre doutrina verdadeira e falsa, saudável e
doentia e ser capaz de ensinar e transmitir corretamente o
que é apropriado em cada caso.
Do
presidente espera-se capacidade de ensinar, do diácono não.
Não se pode concluir disso que ensinar seja atribuição
exclusiva do presidente, nem é possível obter aqui uma base
para o posterior “magistério” católico-romano. Porque
conforme 2Tm 2.2 Timóteo deve transmitir o evangelho a
“pessoas fiéis”, não especificamente apenas presidentes, que
serão capazes de novamente ensinar a outras. O ensino
ministrado por mestres específicos somente tem sentido sob a
premissa de que todos são capazes de se instruir e exortar
mutuamente. No entanto, só se pode esperar isso deles quando
e porque eles próprios são “ensinados por DEUS”. Ademais,
1Tm 5.17 deixa explícito que a presidência não era exercida
por uma pessoa sozinha, e que nem todos que presidiam ou
eram presbíteros também ensinavam.
Os
presidentes tinham de ser exemplos no ensinar, não para
aliviar outros desta tarefa, mas capacitando-os para isso.
Na escola o professor de matemática deve instruir os alunos
para que saibam solucionar pessoalmente tarefas de
matemática. Não deve resolver a tarefa por eles, e nem todos
os alunos devem tornar-se matemáticos ou professores de
matemática.
Hans Bürki.
Comentário Esperança
Cartas aos I Timóteo. Editora Evangélica Esperança.
I Tm 3.2.
Tendo ressaltado que o cargo vale a pena, Paulo logicamente
pode insistir que É necessário, portanto, que o bispo seja
irrepreensível, etc. A tradução tradicional de bispo para o
Gr. episkopos deve ser rejeitada como enganadora. O
episcopado posterior, baseado no conceito de um só bispo
presidindo em cada área e tendo completa autoridade sobre
ela em todos os departamentos, desenvolveu-se dos
“superintendentes” do século I, mas há diferenças tão
importantes entre os dois cargos que parece desejável
empregar termos distintos para eles. No N.T. fora das
Pastorais, episkopos é achado somente em Fp 1:1; At. 20:28;
e 1 Pe 2:25 (com referência a nosso Senhor). No mundo
contemporâneo grego, o termo era empregado para denotar uma
grande variedade de funções, e.g., inspetores,
administradores cívicos e religiosos, oficiais financeiros.
Antigamente, muitas pessoas pensavam que a igreja apostólica
devia ter tomado o título emprestado deste último uso, visto
que o episkopos cristão tinha as finanças da congregação
(assistência aos pobres, etc.) sob seus cuidados. Do outro
lado, se pudermos confiar nas Pastorais, e se tivermos razão
em identificar os “líderes” e “pastores” das demais Paulinas
como sendo episkopoi, fica claro que suas responsabilidade
abrangiam um campo muito mais largo do que o financeiro
somente. Estavam encarregados, por exemplo, das relações
externas da igreja, e como representantes dela, hospedavam
cristãos visitantes.
Na própria
congregação exerciam um ministério magisterial e pastoral, e
tinham autoridade para disciplinar membros. De modo geral,
presidiam sobre seus negócios como um pai cuida da sua
família e do seu lar. É, portanto, interessante que acham
seu paralelo mais próximo no “superintendente” (em Hebraico
mebaqqer) da comunidade de Cunrã.
Segundo o
Manual da Disciplina (esp. 6:10ss. e 19ss.) e o Documento de
Damasco (esp. 13:7-16; 14:8-12), estes tinham o dever de
ordenar, examinar, instruir, receber esmolas ou acusações,
tratar com os pecados do povo, e pastoreá-lo de modo geral.
Parece, portanto, mais provável que o termo, bem como o
sistema administrativo que representava, tenha entrado na
igreja a partir do judaísmo heterodoxo.
A despeito
do seu uso no singular tanto aqui quanto em Tt 1:7, é
extremamente provável que “o superintendente” deve ser
entendido genericamente, e que uma pluralidade de tais
oficiais é pressuposta. Esta ideia é apoiada não somente
pelos paralelos em Fp 1:1 e At 20:28, como também pela
posição intercambiável, ou pelo menos parcialmente
coincidente, dos superintendentes com os presbíteros (cf.
5:17; Tt 1:5-7). De qualquer maneira, não há sugestão do
episcopado “monárquico” posterior nestas cartas. O singular
pode ter sido sugerido pelo singular alguém no v. 1 supra.
Quanto à predileção de Paulo pelo singular genérico, cf. sua
discussão das viúvas em 5:4-10, onde fala de “a viúva,”
etc., a despeito de ter o plural em 5:3.
A lista de
qualidades que se segue às vezes tem surpreendido os
leitores pela sua generalidade; até mesmo tem sido dito, de
modo algo injusto, que não contém nada de especificamente
cristão, e muito menos adaptado a um ministro cristão. Dois
comentários podem ser feitos.
Primeiramente, paradigmas análogos de virtudes e vícios,
preparados para vocações diferentes (e.g., governantes,
generais, médicos) eram populares no mundo contemporâneo
helenístico e judaico-helenístico, e estes, também, eram
colocados em termos surpreendentemente gerais.
A influência
de tais paradigmas pode ser discernida noutros lugares do
N.T., inclusive nas cartas de Paulo (e.g. 3:18 - 4:1; Ef
5:22 — 6:9). O , fato de que está modelando seu conselho
sobre eles, aqui, e noutros lugares nas Pastorais, explica
suficientemente seu estilo aparentemente chão e sem
colorido. Mas, em segundo lugar, este aspecto tem sido
grandemente exagerado. Cada uma das qualidades exigidas era
apropriada num superintendente, e algumas delas tinham
relevância direta às suas funções. Se o leitor moderno às
vezes é tentado a pensar que Paulo colocou suas exigências
em nível surpreendentemente baixo, deve lembrar-se que os
padrões de conduta não eram altos na Ásia Menor no século I,
que as pessoas para as quais as cartas foram escritas tinham
saído recentemente de um ambiente pagão e provavelmente
ainda tinham estreitos contatos com ele, e que o Apóstolo
era um realista.
O catálogo
começa com um requisito que a tudo abrange; o
superintendente deve ser irrepreensível. Ou seja: não deve
apresentar nenhum defeito óbvio de caráter ou de conduta, na
sua vida passada ou presente, que os maliciosos, seja
dentro, seja fora da igreja, possam explorar para
desacreditá-lo. Em especial, sua vida sexual deve ser
exemplar, e os mais altos padrões devem ser esperados dele:
deve ser casada uma só vez. O novo casamento seja depois do
divórcio no caso de um pagão convertido, ou depois do
falecimento da sua primeira esposa, é censurado como sendo
impróprio num ministro de CRISTO. £ igualmente proibido aos
diáconos (3:12) e aos presbíteros (Tt 1:6), e conta como uma
desqualificação nas aspirantes à ordem das viúvas (5:9).
Este é o
significando claro de esposo de uma só mulher. Alternativas
propostas como interpretações são (a) que as palavras são
dirigidas contra manter concubinas ou contra a poligamia,
i.é, ter mais de uma só esposa de uma vez - sugestões estas
que são extremamente improváveis, visto que nenhuma destas
práticas pode ter sido uma opção real para qualquer cristão
comum, é muito menos para um ministro; (b) que meramente
estipulam que o superintendente seja um homem casado — isto
está em harmonia com o alto valor que a carta atribui ao
casamento (4:3), mas é muito improvável em si mesmo, e de
qualquer maneira torna sem sentido a palavra uma só enfática
em Grego; (c) que o objeto é meramente preceituar a
fidelidade dentro do casamento, tratando-se de “não cobiçar
outras mulheres senão sua esposa” — mas isto é extrair do
Grego mais do que o texto pode suportar. Quanto a esta
questão, bem como em tantos outros assuntos, a atitude da
antiguidade era marcantemente diferente daquilo que
prevalece na maioria dos círculos hoje, e há evidências
abundantes, tanto da literatura quanto das inscrições
funerárias, pagãs e judaicas, que permanecer solteiro depois
da morte da cônjuge ou do divórcio era considerado
meritório, ao passo que casar-se de novo era considerado um
sinal de autoindulgência.
Paulo
certamente compartilhava deste ponto de vista, e embora
permitisse a uma viúva que se casasse de novo, estimava-a
mais bem-aventurada se se abstivesse de um segundo casamento
(1 Co 7:40). De modo geral, embora se opusesse ao ultra
ascetismo que desconsiderava o casamento e que aplaudia
façanhas de abnegação (cf. e.g., sua crítica das “uniões
espirituais” em 1 Co 7:36-38), tinha grande respeito pela
abstinência sexual completa, considerando-a um dom de DEUS,
e também sustentava que o controle-próprio periódico dentro
do casamento era de valor espiritual (1 Co 7:1-7). No
contexto de táis pressuposições era natural esperar que os
ministros da igreja fossem exemplos a outras pessoas e que
se satisfizessem com um único casamento. Nos primeiros
séculos cristãos, devemos notar, o segundo casamento não era
totalmente proibido, mas era considerado com nítida
desaprovação. O superintendente deveria, além disto, ser
temperante, palavra esta (Gr. néphatíos; no N.T. somente
aqui e em 3:11; Tt 2:2) que originalmente denota a
abstinência do álcool, mas que aqui, visto que a bebedice é
expressamente estigmatizada no versículo seguinte,
provavelmente tem o significado mais amplo e metafórico.
Este sentido está em harmonia com o uso de Paulo do verbo
relacionado néphõ em 1 Ts 5:6 e 8;cf. 1 Pe4:7.
Os dois
adjetivos seguintes, sóbrio (Gr. sõphrón; talvez tenha a
mesma nuança que o subs correlato em 2:9) e modesto,
ressaltam traços essenciais no caráter e no comportamento do
superintendente respectivamente, ao passo que o terceiro,
hospitaleiro, sublinha que na sua capacidade oficial, tem o
dever de manter sua casa franqueada tanto para os delegados
que viajavam de igreja em igreja quanto para os membros
comuns da congregação que estavam necessitados. Cf. as
instruções de Paulo aos seus correspondentes (Rm 12:13):
“compartilhai as necessidades dos santos; praticai a
hospitalidade.” Este serviço mútuo, ao mesmo tempo caridoso
e diplomático, desempenhava um papel importante na vida
diária da igreja primitiva, conforme fica abundantemente
atestado (5:10; Hb 13:2 1 Pe 4:9; 3 Jo 5ss.; 1 Gem. 1:2;
Hermes, Mand. 8:10), e cabia primariamente ao
superintendente (Tt 1:8).
Outro
aspecto importante nas funções de um superintendente é
indicado no pedido de que seja apto para ensinar. Os
superintendentes provavelmente devam ser identificados com
aquele grupo dentro do corpo dos presbíteros “que se
afadigam na palavra e no ensino” (5:17, onde ver a nota).
Estes deveres estão mais plenamente especificados em Tt 1:9,
sendo que consistem em: (a) lealdade à tradição apostólica,
(b) disposição para instruir nela a congregação, e (cj
vigilância em confundir os que a pervertem.
John Norman
Davidson Kelly. Introdução e Comentário. I, II Timóteo e
Tito. Editora Vida Nova. pag. 75-78.
Qualificações do Bispo (3.2)
Convém,
pois, que o bispo seja irrepreensível, marido de uma mulher,
vigilante, sóbrio, honesto, hospitaleiro, apto para ensinar.
No total, há 15 qualificações estipuladas pelo apóstolo,
sete das quais ocorrem no versículo 2. E importante que a
primeiríssima destas seja a irrepreensibilidade. O
significado da palavra é “acima de repreensão”, “de
reputação irrepreensível” (cf. CH), “de caráter impecável”,
“que ninguém possa culpar de nada” (NTLH). Por qualquer
método que avaliemos, esta é a virtude mais inclusiva que
aparece na lista. Significa que o líder na igreja de CRISTO
não pode ter defeito óbvio de caráter e deve ser pessoa de
reputação imaculada. Dificilmente se esperaria que não
tivesse defeito, mas que fosse sem culpa. E apropriado que o
ministro seja julgado por um padrão mais rígido que os
membros leigos da igreja. Os leigos podem ser perdoados por
defeitos e falhas que seriam totalmente fatais a um
ministro. Há certas coisas que um DEUS misericordioso perdoa
em um homem, mas que a igreja não perdoa no ministério
deste. A irrepreensibilidade do candidato é requisito no
qual devemos ser insistentes hoje em dia, como o foi Paulo
no século I.
O líder da
igreja deve ser exemplar especialmente em assuntos relativos
a sexo. Este é o destaque da segunda estipulação do
apóstolo: Marido de uma mulher (2). Trata-se de precaução
contra a poligamia, que gerava um problema sério para a
igreja cujos membros eram ganhos para CRISTO vindos de um
paganismo que tolerava abertamente casamentos plurais. Em
todo quesito que a igreja com seus altos padrões éticos
relativos a casamento confrontar o paganismo de nossos dias,
em regiões incivilizadas ou não, a insistência cristã na
pureza deve ser enunciada de forma clara e seguida com todo
o rigor.
Mas temos de
perguntar: A intenção de Paulo era desaprovar o segundo
casamento? Alguns dos manuscritos antigos requerem a
tradução “casado apenas uma vez” (conforme nota de rodapé na
NEB). “Sobre este assunto, como em muitos outros”, comenta
Kelly, “a atitude que vigorava na antiguidade difere
notadamente da que prevalece em grande parte dos círculos de
hoje. Existem evidências abundantes provenientes da
literatura e inscrições funerárias, tanto gentias quanto
judaicas, que permanecer solteiro depois da morte do cônjuge
ou depois do divórcio era considerado meritório, ao passo
que casar-se outra vez era visto como sinal de satisfação
excessiva dos próprios desejos”.1 E óbvio que em alguns
segmentos da igreja primitiva esta era a opinião prevalente,
chegando ao extremo último da ordem de um ministério
celibatário.
Mas esta não
é a interpretação do ensino de Paulo que prevalece hoje. E
bem conhecida sua própria preferência da vida solteira em
comparação ao estado casado; e há passagens nos seus
escritos em que ele recomenda este estado aos outros (e.g.,
1 Co 7.39,40). Talvez o melhor resumo da intenção do
apóstolo para os nossos dias seja a declaração de E. F.
Scott: “O bispo tem de dar exemplo de moralidade rígida”.
As próximas
três especificações — vigilante, sóbrio, honesto (2) — têm
relação próxima entre si e descrevem a vida cristã ordeira.
Moffatt traduz estas qualidades pelas palavras: “temperado
[NVI; cf. RA], mestre de si, calmo”. A temperança neste
contexto transmite a ideia de autocontrole (cf. CH) ou
autodisciplina.
O próximo
quesito qualificador é apresentado pelo apóstolo na palavra
descritiva hospitaleiro (2). Esta mesma característica é
mais detalhada em Tito 1.8: “Dado à hospitalidade, amigo do
bem”. Nesses primeiros dias da igreja, esta era uma virtude
muito
importante.
Havia poucos albergues no mundo do século I, e os apóstolos
e evangelistas cristãos que eram enviados de lugar em lugar
ficavam dependentes da hospitalidade de cristãos que
tivessem um “quarto de profeta”, mantido com a finalidade de
atender essas necessidades. Em nossos dias de hotéis,
expressamos nossa hospitalidade cristã de modo diferente.
Mas quando a igreja era jovem, essa hospitalidade era
extremamente primordial. O dever e privilégio de ministrá-la
recaíam naturalmente sobre o bispo ou pastor. O espírito
essencial do ato é tão importante hoje como era outrora.
Igualmente
essencial e até mais importante é a sétima qualidade que
Paulo menciona: Apto para ensinar (2). Pelo visto, nem todos
os pastores eram empregados no ministério de ensino. E o que
mostra 5.17: “Os presbíteros que governam bem sejam
estimados por dignos de duplicada honra, principalmente os
que trabalham na palavra e na doutrina”. Mas a aptidão para
ensinar era rendimento certo para o ministro cristão. Era
importante então como é hoje. Sempre haverá indivíduos que
possuem maior capacidade nesta ou naquela área que outros,
mas certa habilidade para ensinar é de extrema necessidade
ao ministério completo e frutífero.
J. Glenn
Gould. Comentário Bíblico Beacon. Editora CPAD. Vol. 9. pag.
469-470.
ELABORADO:
Pb Alessandro Silva.